Passaram-se
oito meses entre a compra da passagem de avião e o desembarque do garçom
mineiro André, de 37 anos, no aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Mas
bastaram apenas vinte minutos para que ele fosse barrado pelo serviço de
imigração francês e deportado no primeiro VOO
de volta ao Rio de Janeiro, na última
segunda-feira (13). André foi possivelmente a primeira vítima brasileira de uma
megaoperação europeia de “caça aos imigrantes ilegais”, como está sendo chamada
pela imprensa, e que teve início na mesma segunda-feira.
Assim como muitos brasileiros, André pretendia
passar os três meses a que todos têm direito como turista e depois seguir
trabalhando. Foi surpreendido com um rigor acima do normal na fiscalização do
aeroporto. “Fui muito mal orientado sobre o que levar, qual documentação. Achei
que seria simples apenas falar que ia passar uma ou duas semanas. Mas não
tiveram nenhum tipo de jogo de cintura, me botaram no primeiro VOO
depois de vinte minutos de conversa. Foram
bem claros: disseram que a França agora vai ser pior que os Estados Unidos”.
A operação, encabeçada pelo governo italiano e
batizada de "Mos Maiorum", está sendo realizada em 32 países e
mobilizando 18 mil policiais em todo o continente. O objetivo é não apenas
identificar ilegais, mas coletar informações sobre as suas rotas de chegada e,
dessa forma, combater os coiotes, como são chamados os atravessadores. Uma
operação parecida, em 2012, levou à prisão ou deportação de 5,3 mil pessoas em
toda a Europa.
Alerta nas redes sociais
O mineiro deportado pretendia trabalhar como garçom
na região sul de Paris, atraído pelo depoimento de outros compatriotas que leu
na internet. A maior parte dos brasileiros ilegais vive na periferia da
capital, trabalhando em restaurantes, com limpeza ou na construção civil. Há
também uma forte integração com os portugueses, que formam a maior comunidade
de estrangeiros na França, ao lado de argelinos e marroquinos. Os brasileiros
costumam trabalhar no comércio português e até mesmo utilizar carteiras de
identidade falsas do país ibérico. Embora a comunidade brasileira não esteja
entre as maiores – estima-se os legais em cerca de 25 mil –, os brasileiros
foram os estrangeiros mais barrados
ao chegar na França em 2013, principalmente por falta de
documentação mínima.
Desde que a operação "Mos Maiorum" foi
lançada, no início da semana, há muita preocupação entre os brasileiros, que
estão se articulando nas redes sociais e nos fóruns da internet para comunicar
uns aos outros, em tempo real, onde está localizada a fiscalização. Segundo
estes alertas, os fiscais estão operando principalmente nas estações de trens
suburbanos. João, de 30 anos, relata que um amigo paraense, que vivia em Paris
havia dois anos trabalhando como pedreiro, foi pego na Gare du Nord, a maior
central de trens da França. Só teve tempo de mandar uma última mensagem ao amigo
após ser preso pela Polícia Nacional.
De acordo com depoimentos na internet, há REGISTRO
de pelo menos cinco brasileiros ilegais pegos
até o momento. Alguns afirmam estar evitando sair de casa, até que a operação
"Mos Maiorum" termine. O principal conselho disseminado entre
brasileiros nas redes sociais é que os ilegais andem sempre com o bilhete de
metrô, já que a maioria das abordagens começa pela fiscalização da passagem do
trem e acaba verificando a identidade e o visto das pessoas. “Me abordaram na
saída da estação, pediram documento, revistaram minha bolsa e fizeram
perguntas. Fiquei muito nervosa, mas deu tudo certo”, conta uma participante de
um desses grupos na internet. Outro, aconselha: “Para as pessoas que estão com
medo do controle, é só não usar seu passaporte e falar bem francês”.
Operação é criticada
Caroline Intrand, da ONG belga "Coordination
et Initiatives pour Réfugiés et Étrangers", diz que tanto a escala quanto
a falta de transparência da operação impressionam: “Tememos que isso faça
crescer ainda mais a confusão entre as ideias de imigrante e criminoso, e que
agrave a visão sobre a imigração. Uma operação coordenada pela Europa é algo
catastrófico. Isso assusta porque nos damos conta de que agora é um pensamento
europeu, todos estão de acordo para dizer ‘é preciso fazer a caça aos
ilegais’”.
Um dos objetivos da operação é interrogar os
imigrantes para identificar os caminhos explorados pelos "coiotes". A
pesquisadora Martine Vernier, co-autora do livro "Être Étranger en Terre
d’Accueil", diz que os brasileiros e latino-americanos não se enquadram na
categoria dos que são explorados por "coiotes", principal foco da
operação: “No caso dos brasileiros, não é preciso visto, então, eles vêm,
passam os três meses permitidos e ficam. O ‘coiote’, no caso, é a AIR FRANCE
. Ou seja, é legal. Mas a fobia por aqui é em
relação à África Subsariana e aos países árabes. No caso da Síria, por exemplo,
a Europa está sendo muito fechada.”
As ONGS que denunciam abusos contra imigrantes
ilegais ainda aguardam um balanço da operação. A principal reclamação até agora
é da falta de transparência das autoridades, que não estão fornecendo maiores
informações sobre os trabalhos, que devem se estender até o próximo dia 26 de
outubro.
RFIPORTUGUES
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