sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Mais de seis mil imigrantes se inscreveram para fazer o Enem

Entre os mais de 9 milhões de inscritos no Enem este ano, 6.155 são gringos. Conversamos com alguns desses candidatos que vivem na Bahia para saber quais são as principais dificuldades na preparação para a prova e suas expectativas
Thais Borges 

Os livros com questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) enganam, mas o sotaque entrega logo: o técnico em edificações César Antônio, 34 anos, veio de longe. Há dez anos no Brasil, o chileno de Santiago vai fazer a prova nos dias 8 e 9 de novembro para conseguir uma vaga em Arquitetura na Universidade Federal da Bahia (Ufba).

Como ele, outros 6.154 estrangeiros se inscreveram para o Enem em 2014. Se colocados entre os quase nove milhões de inscritos, pode até não parecer muito, mas o número de gringos já é 21% maior do que no ano passado, quando 5.061 candidatos de fora do Brasil fizeram a prova.
 

Diferentemente dos estrangeiros que vêm para cá fazer intercâmbio, os gringos que fazem o Enem e outros vestibulares são alunos regulares como qualquer outro brasileiro – desde que revalidem o certificado de conclusão do ensino médio, o que pode ser feito em qualquer escola da rede estadual, gratuitamente.
 

“Na verdade, é a segunda vez que me inscrevo. Não consegui fazer a prova ano passado porque não me toquei que era no horário de Brasília. Como tinha horário de Verão, me atrasei”, lembra César.
 

Este ano, ele começou a frequentar um cursinho e estuda todo dia. “Percebi que o Enem é uma prova cansativa. Mas não tenho dificuldades com a língua. Consigo ler e escrever bem”, diz o rapaz. Diferente daqui, a educação pública no Chile é paga.



NO PROBLEMS
Assim como César, a estudante inglesa Heather Freeman, 17, manda bem no Português, após 11 anos de Brasil. Natural de Liverpool, Heather nem pensa em cursar uma universidade britânica. “Ainda não decidi se quero estudar nos Estados Unidos ou no Brasil. Decidi fazer o Enem”, diz ela, que é aluna do 3º ano da Escola Panamericana da Bahia.
 

Nela, Heather tem aulas que contemplam tanto o currículo dos EUA quanto as matérias obrigatórias para os brasileiros. Por aqui, ela pensa em fazer Publicidade na Universidade de São Paulo (USP) ou Jornalismo na Ufba.  “O fato de ser estrangeira não interfere em nada. Estou confiante”.
 

Conseguir uma vaga em uma universidade brasileira também foi o motivo para o venezuelano Samuel Hernandez, 18, se inscrever no Enem. “Com a situação política e econômica da Venezuela, prefiro fazer no Brasil”, explica ele, que vai tentar Engenharia de Materiais. Além de cursar o 3º ano na Panamericana, ele se prepara para o exame com aplicativos e revisões com os amigos.
 

Já a mexicana Eva Salustino, 17, vai tentar o Enem pela segunda vez, apesar de  só concluir o ensino médio em 2015. Também aluna da Panamericana, está no 2º ano e fez sua estreia no Enem em 2013. Hoje, os treineiros – estudantes que, como Eva, fazem o exame antes de chegar ao 3º ano – já são 1,5 milhão (17% do total).
 

“Achei a parte de Inglês e Português bem tranquilas. Só  Ciências (Naturais) que ainda não sabia algumas coisas, porque ainda não conhecia todos os assuntos”. Eva também não sabe se quer mesmo ficar por aqui ou se vai para uma universidade americana, mas quer estar preparada para qualquer escolha. “Meus pais são brasileiros, moro aqui há 13 anos e toda minha vida acadêmica foi no Brasil. Só aconteceu de eu ter nascido no México”, brinca.
 

Melhor aqui
Atualmente, existem três estrangeiros matriculados na rede estadual baiana – todos no Colégio Estadual Raphael Serravale. Só lá, nos últimos cinco anos, cerca de 50 gringos revalidaram seus certificados. “Eles precisam estudar as disciplinas daqui, como História e Geografia do Brasil, Língua Portuguesa e Redação. Alguns têm dificuldade”, diz o diretor da escola, Ramilton Cordeiro.
 

Entre os estrangeiros, estão as irmãs italianas Giada, 18, e Lorena La Masa, 16, que chegaram ao país no final do ano passado. Giada, que está no terceiro ano, quer fazer faculdade de Turismo. “Na Itália, não vejo muita perspectiva de crescimento para os jovens”, conta ela, que é filha de um italiano com uma brasileira.
 

“Mas acho que não vou conseguir esse ano. Tem gente estudando há três anos e ainda tenho alguma dificuldade com a interpretação”, confessa. Por isso, a irmã Lorena decidiu tentar a prova antes, ainda no 2º ano. “Quero saber como é mesmo, para me adaptar. Mas acho que já consegui superar as barreiras da língua”, garante Lorena.
 

E como a Itália é logo ali, tem mais italiano na disputa. Matheus Souza, 22, quer uma vaga no curso de Análise de Sistemas. Mas, há seis anos morando no Brasil e filho de mãe brasileira, ele consegue se virar bem com o idioma. “Brasileiro tem uma ideia utópica da Europa. A condição lá, para um jovem, é de desemprego e o custo de vida é maior”, alerta ele, que não tem dúvidas de que quer ficar por aqui.

Thais Borges  (thais.borges@redebahia.com.br)
Correio da Bahia

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