Nos últimos quatro anos, o número de estrangeiros
que receberam carteiras de trabalho para procurar emprego no Brasil mais que
quintuplicou. O crescimento, no entanto, deve-se muito mais à chegada de
refugiados do que de profissionais especializados segundo análise de dados do
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Entre 2009 e 2013, quase 60% dos estrangeiros
habilitados para entrar no mercado de trabalho nacional vieram de países da
América do Sul e do Haiti. Fatores macro e micro estruturais ajudam a entender
os fluxos migratórios. No âmbito geral, os reflexos da crise internacional de
2008 no cenário externo e, internamente, a consistente criação de empregos nos
últimos anos atraíram o interesse de trabalhadores estrangeiros.
No cenário micro, ao se estabelecerem no País,
estrangeiros pioneiros abrem caminho para conhecidos e familiares, criando
cadeias migratórias, com ou sem a atuação de atravessadores, explica o
professor da Universidade de Brasília e Coordenador Científico do Observatório
das Imigrações Internacionais, Leonardo Cavalcanti. Para ele, o movimento é
natural.
A robustez do mercado de trabalho brasileiro nos
últimos anos ajuda a explicar o salto de 427% na emissão de carteiras de
trabalho para estrangeiros, de 8.115, em 2009, para 42.770, em 2013.
O subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria
de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR), Ricardo Paes de
Barros, no entanto, afirma que "o número de trabalhadores de outros países
no Brasil ainda é completamente irrelevante no mercado de trabalho
brasileiro". Em 2009, os estrangeiros representavam 0,40% das carteiras de
trabalho no País - porcentual que passou para 1,51% neste ano.
Mas se de um lado o fluxo migratório em busca de
trabalho no Brasil teve crescimento exponencial, de outro a mão de obra
especializada convidada por empresas estabelecidas no País vem registrando
queda nos últimos anos.
Excluindo o efeito da desburocratização, que
distorce os números e intensifica ainda mais o recuo, as autorizações no
primeiro semestre de 2014 diminuíram 8,4% sobre o mesmo período do ano passado.
Em todo o ano de 2012 a queda foi de 2,7% e em 2013, de 7,2%. Isso mostra que
além de haver uma tendência de queda na chegada dos profissionais estrangeiros
especializados ao Brasil, ela vem se acelerando.
Segundo o MTE, em mais de 90% dos casos as
autorizações para esse tipo de profissional são temporárias. Na comparação com
os seis primeiros meses de 2013, caiu o número de autorizações a estrangeiros
de todos os dez países que mais enviaram profissionais para o Brasil entre
janeiro e junho de 2014: Estados Unidos (-26,3%), Filipinas (-0,7%), Reino
Unido (-26,9%) são os principais.
Mercado fechado
Os especialistas consideram importante a entrada
desses profissionais para o desenvolvimento da economia brasileira, mas avaliam
que o mercado de trabalho nacional ainda é muito fechado
Por isso mesmo, em maio de 2013, no esforço de
desburocratizar processos e facilitar a entrada da mão de obra, o Conselho
Nacional de Imigração (CNIg) - órgão que reúne governo, centrais sindicais e
confederações de empregadores - transferiu diretamente aos consulados a
responsabilidade sobre autorizações para assistência técnica por até 90 dias,
sem vínculo empregatício.
Sem essa alteração, a queda na entrada de trabalhadores
especializados no Brasil seria de 28% na comparação do primeiro semestre deste
ano na comparação com 2013.
Segundo o presidente do CNIg, Paulo Sérgio de
Almeida, essa mudança foi somente um primeiro passo e o governo continua
empenhando em facilitar a entrada dos trabalhadores especializados. Porém
admite que, mesmo com os avanços, as leis são obsoletas.
Políticas públicas
Na avaliação do subsecretário de Ações Estratégicas
da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR),
Ricardo Paes de Barros e Almeida, "a sociedade ainda não colocou este
assunto na lista de prioridades". Ele lembra, por exemplo, que a imigração
não está entre os pontos discutidos na eleição.
Segundo Barros, ainda assim, bons projetos foram
amplamente discutidos e um deles, exemplifica, depende de ações do Ministério
da Justiça para avançar. "Ideias existem e nada impede o Congresso ou o
Executivo de caminhar com a questão migratória", argumenta.
O professor Leonardo Cavalcanti defende a criação
de políticas públicas para gerenciar os fluxos migratórios e transformar a
imigração em um ativo de desenvolvimento para o País.
O economista e sócio-fundador da consultoria em
mobilidade global Emdoc, João Marques da Fonseca Neto, cita dados do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para mostrar como outros países são mais
receptivos a estrangeiros que o Brasil.
"Por aqui, os imigrantes representam 0,3% da
população. A média global é de 3,1%, dez vezes maior que a nossa", afirma.
Ele destaca ainda que na América do Norte e na Oceania esse porcentual é da
ordem de 15%, 50 vezes maior que a média brasileira.
Apesar das críticas
à falta de políticas para estimular e administrar a entrada de trabalhadores
especializados no País, Almeida, do CNIg, diz que um dos fatores que pesaram na
queda da chegada desses profissionais nos últimos anos foi a redução dos
investimentos. "De 2013 para 2014, o ciclo de grandes projetos deu uma
reduzida e acabou afetando a vinda de estrangeiros para o País."
Jornal Terceira Via
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