sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Dificuldades para os migrantes redobraram

 


Com a pandemia de Covid-19 e a crise econômica em vários países, Portugal continuou recebendo muitos migrantes em 2021. Segundo o chefe do escritório da Organização Internacional para Migrações, OIM, em Lisboa, a nacionalidade brasileira é a maior presença em território português há uma década. 

Vasco Malta contou à ONU News que são pelo menos 185 mil brasileiros vivendo em Portugal, mas o número real pode ser mais alto, já que o balanço oficial da entrada de migrantes em 2021 ainda não foi divulgado. 

Retorno  

O chefe da OIM no país  explica que muitas pessoas acabam em uma situação de vulnerabilidade, principalmente os que estão irregulares. Segundo Malta, a alternativa para muitos acaba sendo voltar para casa.  

“As pessoas migrantes em Portugal, muitas vezes desprovidas de qualquer ligação à comunidade, tiveram de fato ainda mais dificuldades, redobradas, quando a Covid aconteceu. E aí falamos exatamente do nosso programa de apoio de retorno voluntário e reintegração, onde pessoas na sua grande maioria de nacionalidade brasileira, e só para terem noção, as pessoas de nacionalidade brasileira correspondem de 95% a 97%  do apoio que nós damos a esse projeto, através do qual nós apoiamos uma família, uma pessoa, que não se integrou no nosso país e queira voltar ao seu país de origem.”  

Neste ano, a OIM ajudou 113 migrantes a voltarem para casa. Muitos acreditam na recuperação econômica e preferem continuar em Portugal até poderem, de fato, iniciar seus projetos de vida.  

Chegada de afegãos  

Mais de cinco milhões de afegãos estão deslocados internamente, incluindo essas famílias em Herat
OIM/Mohammed Muse
Mais de cinco milhões de afegãos estão deslocados internamente, incluindo essas famílias em Herat

Vasco Malta contou que muitos britânicos decidiram fixar residência em território português desde que o Reino Unido deixou a União Europeia.  

Atualmente, 46 mil britânicos moram em Portugal, sendo a segunda nacionalidade mais representativa no país. Malta fala também da presença de civis da Síria e do Afeganistão.  

“No que respeita aos cidadãos afegãos e cidadãos sírios, temos aqui vários níveis. Estamos a falar de pessoas refugiadas, sendo que alguns dos movimentos, principalmente dos reinstalados e recolocados tiveram o apoio da OIM, para serem reinstalados ou recolocados aqui no nosso Portugal. Depois tivemos também um conjunto de voos patrocinados diretamente pelo Estado português que permitiram, nesses últimos dois meses, trazer um número significativo de cidadãos afegãos ao nosso país, através de voos charter.” 

Vasco Malta explica que a entrada de afegãos em Portugal foi uma ação do próprio governo, mas o chefe do escritório da OIM acredita que cerca de 250 pessoas do Afeganistão estejam vivendo no país.  

O representante acredita que 2022 poderá atrair ainda mais migrantes a Portugal e lembra que a OIM estará sempre pronta para ajudar a todos.  

Onunews

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As perspectivas brasileiras sob a ótica da crise migratória nos Estados Unidos

 

Dados revelaram o aumento vultuoso de brasileiros apreendidos por ingressarem ilegalmente nos Estados Unidos durante o período do último ano fiscal norte-americano (compreendido entre outubro de 2020 e setembro deste ano).

No ponto crítico da pandemia da Covid-19 foram mais de 56 mil brasileiros detidos na fronteira com o México. Um aumento em torno de 700% se comparado ao mesmo período anterior.

Verdadeiramente, se está diante de um cenário constrangedor no que diz respeito a direitos humanos e políticas internacionais. Um salto estatístico que representa o maior índice desse tipo de evento migratório em duas décadas!

Não obstante, por trás desses números e percentuais há informações ainda mais chocantes divulgadas pelo órgão americano de fiscalização de alfândega e proteção de fronteiras, pois escancaram a personificação dos atores brasileiros desse enredo: quase 44 mil pessoas compunham famílias inteiras e impressionantes 188 eram crianças e adolescentes (desacompanhados) tentando a travessia ilegal.

Assim, desse quadro pintado com as tintas da vergonha resultou a ascensão do Brasil ao posto de sexto país com o maior número de imigrantes detidos na fronteira dos Estados Unidos com o México, superando Cuba e Venezuela, por exemplo. Venezuela que, por sinal, lidera a lista de países onde seus nacionais pedem asilo ao México, conforme a Comissão Mexicana de Assistência a Refugiados (Comar). Ainda no ponto, segundo a ONU, estima-se que seis milhões de venezuelanos abandonaram seu país natal em busca de dignidade em outras nações.

Consequentemente, sublinha-se que o governo mexicano cancelou temporariamente o acordo de isenção de vistos com o Brasil e passou a exigir — desde o último dia 11 — que os brasileiros apresentem autorização para viajarem até lá. Ou seja, se antes a realidade era o turismo rumo à paradisíaca Cancún, agora o status brasileiro mudou internacionalmente de figura.

Tais contextualizações abordadas trazem outras preocupações no tocante à realidade brasileira, cuja expectativa de melhora para 2022 começa a se esvair entre os dedos da mão calejada pela Covid-19, pela instabilidade política, econômica e constitucional (entre os poderes), e, por óbvio, ante tamanhas consequências de todo esse emaranhado tenebroso e displicente que acompanhamos perplexos.

Que venha o ano novo repleto de disposição e fé, alicerçado por Fernando Pessoa, que disse que "tenho em mim todos os sonhos do mundo"; pois, afinal de contas, como diria o samba de Arlindo Cruz, "se o passado foi ontem, amanhã o futuro virá; se eu for falar de tristeza, meu tempo não dá, não dá".

conjur.com.br

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quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Cartilha sobre moradia orienta pessoas refugiadas e migrantes no Brasil

 Cartilha sobre Acesso à Terra e à Moradia para Pessoas Refugiadas e Migrantes no Brasil está disponível em português e em espanhol. Objetivo é ajudar no acolhimento dessa população no país

cartilha sobre moradia para refugiados e migrantes
Foto: Adobe Stock | Licenciado

Por: Juliana Lima

A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), em parceria com as Defensorias Públicas da União (DPU) e do Estado do Pará (DPE-PA), acaba de lançar uma cartilha sobre moradia voltada a pessoas refugiadas e migrantes no Brasil.

Cartilha sobre Acesso à Terra e à Moradia para Pessoas Refugiadas e Migrantes no Brasil aborda diversos assuntos, como: o direito à moradia previsto na Constituição Federal do Brasil e em instrumentos normativos internacionais; as diferenças entre imóveis rurais e urbanos; os conceitos de propriedade e posse; os direitos e deveres de inquilinos e locatários e as normas que regem essa relação contratual no Brasil.

Segundo a ACNUR, a cartilha sobre moradia para pessoas refugiadas e migrantes foi elaborada para responder a uma demanda dessa população no Brasil. Para a Agência, o acolhimento dessas pessoas no Brasil é dificultado pela situação de vulnerabilidade em que elas já se encontram ao chegar no país, e também pelo desconhecimento da legislação local.

Dessa forma, de acordo com a ACNUR, essas pessoas acabam por “ocupar espaços de forma irregular ou são ludibriados em transações de aluguel e compra de imóveis”. Para ajudá-las, a cartilha enfatiza também o direito à não discriminação garantido a pessoas refugiadas e migrantes, assim como os procedimentos relacionados à regularização fundiária no Brasil.

A cartilha sobre moradia par30a pessoas refugiadas e migrantes no Brasil está disponível em português e em espanhol, que tem foco na população refugiada e migrante, inclusive indígena, da Venezuela no país. Segundo a ACNUR, a cartilha ganhará novas traduções em breve para também ser útil a pessoas de outras nacionalidades que vivem no país.

observatorio3setor.org.br

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Indígenas Warao têm acesso garantido à educação nas instituições municipais

 

Desde 2015, o Brasil já recebeu mais de 46 mil venezuelanos como refugiados, conforme dados da Agência da Organização das Nações Unidadas (ONU) para Refugiados. É a maior população com este perfil na América Latina. Muitos deles, indígenas da etnia Warao, escolheram Belém para recomeçar a vida.

Uma das principais preocupações desses grupos é com a educação dos filhos. "Tenho quatro filhos. Nós, venezuelanos, não estávamos conseguindo matricular as crianças na escola. Foi então que falei com várias instituições, porque sem escola muitas crianças iam procurar ajuda na rua".

Até que, em setembro de 2021, foi dada a notícia de que as crianças de 4 a 11 anos iriam para a Escola Municipal Pedro Demo. "Foi emocionante. Fiquei muito feliz”, continua a indígena Warao Gardenia Cooper Quiroz, natural de Pedernales, no Delta Amacuro, na Venezuela.

A Prefeitura de Belém, por meio da Secretaria Municipal de Educação (Semec), instituiu em 2021 a Coordenação da Educação Escolar dos Indígenas, Imigrantes e Refugiados (Ceiir), com o compromisso de promover e garantir uma educação integral com dignidade humana e territorial aos refugiados, compreendidos como sujeitos de direito, inicialmente atendendo os Warao.

Nos dias 22, 23, 27, 28 e 29 de dezembro, a Semec realizou a matrícula para o ano letivo de 2022 de crianças e adolescentes indígenas, imigrantes e refugiados, que serão atendidos nas escolas municipais Professora Maria Heloísa de Castro, Amigos Solidários, Professor Pedro Demo, Monsenhor Azevedo e Helder Fialho, além das Unidades de Educação Infantil (UEIs) Pratinha, no Tapanã, e Itaiteua, no distrito de Outeiro. A acão busca ajudar a construir uma realidade, cada vez melhor, para cada um e é inédita na rede municipal de ensino de Belém.

Gardenia Qiroz garantiu a matrícula dos filhos Rosannys Martha, de 7 anos, e Alcioni Ronaldo, de 9, na Escola Municipal Pedro Demo, e de Arlyz  Yakeli, de 13, e Gardelys Yakelin, de 14, na Escola Municipal Helder Fialho.

Educação Escolar para indígenas, imigrantes e refugiados em 2022

Após estruturar o atendimento na rede municipal de ensino de Belém, o coordenador da Ceiir, professor Kokoixumti Tembé, também conhecido com o nome "Wender Tembé", comemora as conquistas de 2021 e planeja o ano letivo de 2022.  

“Fizemos uma busca ativa para mapear as crianças Warao e garantir a todos o direito à educação. Fizemos formações continuadas com os docentes para desmistificar conceitos equivocados em relação a este público e oferecer uma base sólida para o trabalho em sala de aula".

Além disso, "Wender Tembé" conta que o Ceiir buscou manter um constante e necessário diálogo com os pais. "Em 2022 queremos mapear os indígenas de etnia brasileira, outros migrantes, garantir professor de língua espanhola, língua materna para facilitar a comunicação e a recuperação da memória histórica, reafirmando suas identidades culturais. Além de continuar as formações continuadas dos docentes”, disse Kokoixumti. 

No próximo ano, a Prefeitura de Belém irá entregar mais uma unidade educativa: a Escola Municipal Amigos Solidários, no Tapanã, que vai receber estudantes que residem em um dos espaços de acolhimento da Fundação Papa XXII (Funpapa), oferecendo educação integral e acesso a atividades extracurriculares que garantam uma formação completa.

A indígena Warao Mariluz Del Valle Mariano Nuñez, artesã e mãe de Jhonniel Jesus, de 7 anos, está satisfeita com o atendimento que o filho recebe na Escola Pedro Demo. 

“Eu estava com um pouquinho de medo, principalmente pelo idioma. Porém, quando cheguei lá percebi que as pessoas falavam um pouco de espanhol e entendiam o espanhol, então eu comecei a me sentir melhor. O atendimento foi excelente. Primeiro para o meu filho, depois para as outras crianças de lá da escola. Fiquei contente, já que as crianças estavam na escola e outras entrarão em 2022”, afirmou Mariluz. Mãe e filho são naturais de Antônio Diaz, no Delta Amacuro, na Venezuela. 

Texto:

Tábita Oliveira

agenciabelem.com.br

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quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Governo Biden é o que menos recebe imigrantes na história dos EUA

 


O presidente Joe Biden não cumpriu sua promessa de políticas justas e humanas para os migrantes, segundo o ex-chefe dos Recursos de Imigração dos Estados Unidos, Paul Schmidt.

Em entrevista publicada no The Hill, Schmidt garantiu que o presidente democrata conseguiu estabelecer um processo ordenado na fronteira e expandir os programas de refugiados em possíveis países de origem, mas não o fez.

Em vez disso, ele preferiu usar versões modificadas de “programas de dissuasão comprovados”, ele esclareceu, aplicados durante a era Donald Trump (2017-2021) e por burocratas insensíveis aos direitos, necessidades e motivações múltiplas dos requerentes de asilo.

Os problemas que Schmidt descreve não se limitam à fronteira e ao tratamento dos requerentes de asilo, mas refletem-se em outras medidas de imigração do governo federal.

O programa de refugiados de Biden aumentou o limite de admissão de migrantes em 2021 de 15.000 para 62.500, mas só conseguiu admitir 11.411 pessoas no final do ano fiscal, o menor número na história do país.

Uma das promessas de campanha do presidente foi lançar uma ordem executiva no início de seu mandato suspendendo as deportações por pelo menos 100 dias.

No entanto, um juiz federal bloqueou a moratória, considerando que o governo não ofereceu uma justificativa concreta e razoável para estabelecer uma pausa como essa.

Por outro lado, quando Biden assumiu o cargo, o tribunal de imigração atrasou mais de 1,29 milhão de processos, mas no final de novembro de 2021 esse número chegou a 1,56 milhão de processos, e a espera média por audiência é de 905 dias.

De acordo com dados oficiais, mais de 40% dos pedidos de asilo apresentados desde outubro de 2000 ainda estão pendentes.

Ao chegar ao poder, o presidente eliminou uma política da era Trump conhecida como Stay in Mexico, que obriga os migrantes a esperar no norte do país vizinho por uma audiência para definir seu status de imigração.

Mas um tribunal federal também bloqueou a decisão, chamando-a de movimento político ilegal. Desde então, disse Schmidt, Biden fez alterações no programa para torná-lo mais seguro e garantir a proteção dos direitos dos estrangeiros envolvidos, embora os esforços ainda sejam insuficientes.

O atual ocupante do Salão Oval também continua a aplicar a política trumpista conhecida como Título 42, apesar da oposição de muitos democratas e defensores dos direitos dos imigrantes.

Este programa permite a expulsão acelerada de indocumentados, a pretexto da crise de saúde provocada pela Covid-19, e é responsável por 54 por cento das que ocorreram nos Estados Unidos durante 2021.

Os migrantes expulsos de acordo com essa política não enfrentam consequências legais, o que os incentiva a tentar retornar aos Estados Unidos da fronteira sul.

Em vez de tomar medidas imediatas para acabar com a crise, Biden pretende persuadir o México e os países da América Central a enfrentar as causas profundas que levam as pessoas a abandonar suas casas, explicou Schmidt, observando que tal atitude não resultará na mudança.

Causa Operaria.org

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Papa Francisco: a migração de hoje é um escândalo social da humanidade

 Na Audiência Geral desta quarta-feira, o Papa convidou a rezar "por todos os migrantes, todos os perseguidos e todos aqueles que são vítimas de circunstâncias adversas, sejam circunstâncias políticas, históricas, ou pessoais".

A família de Nazaré teve que fugir para o Egito, "experimentando em primeira pessoa a precariedade, o medo e a dor de ter que deixar a sua terra". Francisco sublinhou que "ainda hoje muitos dos nossos irmãos e irmãs são obrigados a viver a mesma injustiça e sofrimento. A causa é quase sempre a prepotência e a violência dos poderosos. Isto aconteceu também com Jesus".

Através dos Reis Magos, o rei Herodes toma conhecimento do nascimento do “rei dos Judeus”, e a notícia o perturba. "Ele se sente inseguro, ameaçado no seu poder" e manda "matar todas as crianças de Belém de até dois anos. Foi o tempo em que, segundo o cálculo dos Magos, Jesus teria nascido". Entretanto, um anjo ordena a José: «Levanta-te, toma o menino e a sua mãe, e foge para o Egito; permanece lá até que eu te avise, pois Herodes vai à procura do menino para o matar». "Pensemos nas muitas pessoas que hoje sentem dentro de si esta inspiração: Fujamos! Fujamos porque aqui há perigo", frisou o Papa.

Herodes é o símbolo de muitos tiranos de ontem e de hoje

"A fuga da Sagrada Família para o Egito salva Jesus, mas infelizmente não impede que Herodes leve a cabo o seu massacre. Assim, encontramo-nos diante de duas personalidades opostas: por um lado, Herodes com a sua ferocidade e, por outro, José com o seu esmero e a sua coragem. Herodes quer defender o seu poder, a própria pele, com crueldade impiedosa, como atestam também as execuções de uma das suas esposas, alguns dos seus filhos e centenas de adversários. Era um homem cruel. Para resolver os problemas tinha apenas uma receita, matar", disse ainda o Papa, acrescentando:

Ele é o símbolo de muitos tiranos de ontem e de hoje, e para esses tiranos as pessoas não contam, conta o poder. Se eles precisam de espaço de poder, matam as pessoas. Isso acontece hoje. Não precisamos recorrer à história antiga. Isso acontece hoje. É o homem que se torna “lobo” para os outros homens. A história está cheia de personalidades que, vivendo à mercê dos seus temores, procuram vencê-los, exercendo o poder de forma despótica e praticando gestos de violência desumanos. Mas não devemos pensar que só viveremos na perspectiva de Herodes se nos tornarmos tiranos; na realidade, é uma atitude em que todos podemos cair, sempre que procuramos afugentar os nossos medos com a prepotência, ainda que seja apenas verbal ou feita de pequenos abusos cometidos para mortificar quem está ao nosso lado. Também nós temos dentro do coração a possibilidade de sermos pequenos Herodes.

Coragem é sinônimo de fortaleza

A seguir, o Papa sublinhou que "José é o oposto de Herodes: em primeiro lugar, é «um homem justo». Herodes é um ditador. Além disso, demonstra-se corajoso na execução da ordem do Anjo. Podemos imaginar as peripécias que teve de enfrentar durante a longa e perigosa viagem, e as dificuldades exigidas para a permanência num país estrangeiro. A sua coragem sobressai também na hora do regresso quando, tranquilizado pelo Anjo, supera os seus compreensíveis receios, estabelecendo-se com Maria e Jesus em Nazaré".

Herodes e José são dois personagens opostos, que refletem as duas faces da humanidade de sempre. É um lugar-comum errado considerar a coragem como virtude exclusiva do herói. Na realidade, a vida quotidiana de cada pessoa requer coragem. Não é possível viver sem coragem para enfrentar as dificuldades de cada dia. Em todos os tempos e culturas encontramos homens e mulheres corajosos que, para ser coerentes com a sua crença, superaram toda a espécie de dificuldades, suportando injustiças, condenações e até a morte. Coragem é sinônimo de fortaleza que, com a justiça, a prudência e a temperança, faz parte do grupo de virtudes humanas chamadas “cardeais”.

Ver em Jesus os migrantes de hoje

"A lição que José nos deixa hoje é a seguinte: a vida nos apresenta sempre adversidades, diante das quais podemos sentir-nos também ameaçados, amedrontados, mas não é mostrando o pior de nós, como faz Herodes, que podemos superar certos momentos, mas agindo como José, que reage ao medo com a coragem da confiança na Providência de Deus", disse ainda o Papa.

Rezemos hoje por todos os migrantes, todos os perseguidos e todos aqueles que são vítimas de circunstâncias adversas, sejam circunstâncias políticas, históricas ou pessoais. Pensemos nas muitas pessoas vítimas das guerras, que querem fugir de sua pátria, mas não podem. Pensemos nos migrantes que começam a estrada para serem livres e muitos terminam na rua ou no mar. Pensemos em Jesus nos braços de José e Maria fugindo e vejamos nele cada um dos migrantes de hoje. A migração de hoje é uma realidade diante da qual não podemos fechar os olhos. É um escândalo social da humanidade.

Vatican News

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terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Brasileiros deportados pelo governo dos EUA chegam ao Brasil nesta sexta-feira

 

Imigrantes ilegais são enviados para o controle de fronteirasFoto: Brandon Bell/Getty Images

Os brasileiros deportados pelo governo dos Estados Unidos retornaram ao país nesta sexta-feira (21). Este é o primeiro movimento de deportação em massa de imigrantes brasileiros após Joe Biden assumir a presidência. 

A deportação dos brasileiros foi confirmada pelo analista de internacional da CNN Lourival Sant’Anna com fontes diplomáticas. A expectativa era de que 106 brasileiros fossem deportados ao Brasil, conforme informações do Itamaraty. A assessoria do BH Airport, no entanto, afirmou que o desembarque foi de 30 passageiros.

A diferença nos números se deve, segundo o Ministério das Relações Exteriores, a dois motivos principais: decisões judiciais que impediram a deportação e a realização de testes inadequados para entrada no Brasil. O país exige teste negativo do tipo RT-PCR e parte dos deportados teria feito apenas teste de antígeno para a Covid-19.

Em nota, o Itamaraty informou segue acompanhando os desdobramentos da deportação. “O governo brasileiro foi notificado do voo e acompanha os desdobramentos, com vistas a assegurar que aos cidadãos brasileiros deportados seja estendido tratamento digno.”

“O processo de deportação ocorre integralmente sob as leis e a jurisdição soberana dos Estados Unidos. A definição da forma da deportação – por meio de voos comerciais ou fretados – se vincula a questões logísticas concernentes à operação”, diz a nota.

A medida adotada pelo presidente Joe Biden é semelhante à que foi realizada durante a gestão do ex-presidente Donald Trump, que tinha uma política voltada à anti-imigração.

Biden, durante os primeiros 100 dias de seu governo, pausou deportações e reverteu uma série de medidas da administração Trump, que eram questionadas por aqueles que são pró-imigração.

Durante a campanha eleitoral, Biden prometeu tratar os imigrantes que tentam entrar nos EUA sem documento de maneira humanitária. No entanto, como tradicionalmente ocorre nos EUA, a questão da imigração é um dos principais problemas que o democrata tem de enfrentar desde que passou a ocupar a presidência do país.

CNNBRASIL

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segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Plano Estadual para Refugiados tem primeira etapa de trabalho concluída

 


Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) finalizou na segunda quinzena de dezembro a primeira etapa de elaboração do I Plano Estadual de Políticas para Refugiados, Migrantes, Apátridas e Retornados de Minas Gerais. O Plano Estadual tem como objetivo estabelecer diretrizes e ações prioritárias para a pauta de migração no estado.

As atividades de desenvolvimento do Plano tiveram início em abril, sob a coordenação do Grupo de Trabalho de Planejamento do Comitê Estadual de Atenção ao Migrante, Refugiado e Apátrida, Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Erradicação do Trabalho Escravo de Minas Gerais (Comitrate/MG), órgão colegiado vinculado à Sedese.

Por meio de chamada pública, foram realizadas, em novembro, 21 conferências livres, que contaram com 516 participantes, dos quais 278 eram refugiados, migrantes ou apátridas, a maioria proveniente de países das Américas do Sul e Central (Venezuela, Haiti e Peru), bem como representantes da Síria, Líbano e Indonésia. Além destes, também participaram brasileiros retornados, ou seja, brasileiros que já viveram fora do Brasil e que retornaram (voluntariamente ou não).

Ao todo, 29 nacionalidades estiveram representadas nas conferências, sendo que a maior parte dos encontros foi realizada de forma virtual, conforme as recomendações sanitárias de prevenção à covid-19.

Como resultado dessa primeira rodada de conferências livres, a Comissão Organizadora do Plano Estadual (Cope) recebeu 426 propostas, divididas entre nove eixos temáticos. A próxima etapa contempla a análise das propostas, seguida pela elaboração do texto preliminar do Plano Estadual com suporte de consultoria especializada contratada pela Agência da ONU para Refugiados, com apoio da Organização Internacional para as Migrações e revisão final pelos demais membros da Cope. Estes trabalhos devem ser concluídos até 21 de janeiro de 2022. Está prevista uma segunda consulta popular, para aprovação do Plano, que deve ser implementado no primeiro semestre do próximo ano.

Eixos e Comissão Organizadora

O tema da migração e do refúgio, em Minas Gerais, está sob a responsabilidade da Subsecretaria de Direitos Humanos da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese/Subdh), por meio de sua Diretoria de Políticas de Proteção e Reparação dos Direitos Humanos (DPRDH).

As iniciativas da pauta são conduzidas pelo Comitrate, colegiado criado pelo Decreto Estadual nº 46.849/2015 e que conta com três Câmaras Técnicas (Migração, Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas) e com grupos de trabalho específicos, conforme demanda.

As 426 propostas recebidas pela Comissão Organizadora serão agrupadas de acordo com o eixo a que se referem, cabendo à Cope aprová-las ou adequá-las, a fim de preparar a redação preliminar do Plano Estadual.

Conheça os eixos:

Eixo I – Assistência Social e combate às vulnerabilidades socioeconômicas;

Eixo II – Segurança alimentar e nutricional;

Eixo III – Acesso à moradia digna;

Eixo IV - Acesso à educação;

Eixo V – Acesso à cultura, esporte e lazer, na perspectiva da interculturalidade;

Eixo VI – Acesso à saúde pública integral;

Eixo VII - Inserção socioeconômica, trabalho, empreendedorismo e geração de renda;

Eixo VIII - Proteção aos direitos humanos e combate ao preconceito e à discriminação;

Eixo IX – Governança migratória, gestão participativa e protagonismo social da população de refugiados, migrantes, apátridas e retornados.

É no contexto do Comitrate que se promove a discussão interinstitucional entre órgãos públicos, sociedade civil e organizações internacionais relacionadas à temática. Desta forma, integram a Comissão da Organizadora do Plano Estadual (Cope) as seguintes instituições:

- Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur);

- Coletivo de Mulheres Cio da terra;

- Instituto das Irmãs Oblatas do Santíssimo Redentor (IIOSR);

- Organização Internacional para Migrações (OIM);

- PUC Minas\- Refúgio 343;

- Secretaria de Estado da Educação (SEE);

- Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (SJMR);

- As Subsecretarias ligadas à Sedese: Assistência Social (Subas), Direitos Humanos (Subdh), Trabalho e Emprego (Subte).

 

  • Todas as informações referentes ao Plano e à etapa de consulta pública e realização das conferências inscritas podem ser conferidas no site da Sedese. Sedese: 

agenciaminas.mg.gov.br


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Pessoas sem pátria e terra: a crise mundial de migrantes e refugiados em 2021

 

Fronteira de Belarus com a PolôniaFoto: Reuters

Das multidões sob uma ponte na fronteira dos Estados Unidos com o México e venezuelanos caminhando pela América Latina aos campos de migrantes na Belarus e os esforços para realocar milhares de afegãos após o fim de uma guerra de 20 anos, 2021 foi um ano marcado por crises migratórias.

De acordo com o “World Migration Report 2022” da Organização Internacional para as Migrações (OIM), em 2020 havia cerca de 281 milhões de migrantes internacionais.

No entanto, nos últimos dois anos, ocorreram eventos significativos de migração e deslocamento devido a conflitos ou séria instabilidade econômica e política de diversos países. A Organização das Nações Unidas (ONU) também destaca o deslocamento causado por desastres climáticos.

Em 2020, 89,4 milhões de pessoas viviam deslocadas, estimou o OIM.

A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), por sua vez, informou em meados de 2021 que em decorrência de conflitos, violência, violações dos direitos humanos, perseguições e desastres naturais, o número de deslocamentos forçados em todo o mundo ultrapassou 84 milhões de pessoas.

De acordo com a ACNUR, mais de 68% dos refugiados e pessoas deslocadas em todo o mundo vêm de apenas cinco países:

Síria: 6,8 milhões
Venezuela: 4,1 milhões
Afeganistão: 2,6 milhões
Sudão do Sul: 2,3 milhões
Mianmar: 1,1 milhão

Embora em 2020 a situação para refugiados e pessoas deslocadas fosse mais difícil, com um grande número de países fechando as fronteiras devido à pandemia de Covid-19, o acesso ao asilo humanitário salvou e continua salvando a vida de muitos.

No entanto, as políticas de saúde pública – como o “Título 42″ nos EUA – continuam a limitar o acesso ao asilo, de acordo com o relatório da ACNUR.

No que diz respeito à migração no Caribe, nos últimos anos aumentou a presença de pessoas da República Dominicana, Haiti e Cuba.

De acordo com o portal de dados da OIM, algumas dessas pessoas “transitam da Colômbia para o Panamá através da selva de Darien a caminho dos Estados Unidos e Canadá”.

“Mais de 100 mil migrantes até agora, em 2021, cruzaram irregularmente a perigosa selva de Darien Gap para o Panamá, vindos da Colômbia, depois de caminhar por vários países da América do Sul, disse a OIM em comunicado.

CNNBRASIL

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sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Governo Federal fecha 2021 com mais de 287 mil refugiados venezuelanos regularizados pela Operação Acolhida

 Governo Federal regularizou mais de 287 mil migrantes e refugiados venezuelanos através da Operação Acolhida. Foram mais de 64 mil pessoas abrigadas em 700 municípios espalhados por todo o Brasil. De acordo com a Casa Civil, mais de 1 milhão de atendimentos foram realizados na fronteira do Brasil com a Venezuela.

O Brasil tem desenvolvido um receptivo para essas pessoas que já vêm de uma saga de muito sofrimento. Pessoas que muitas vezes caminham por dias sem fim, trazendo suas famílias a pé, com muita necessidade. Com a Operação Acolhida, nós já conseguimos fazer com que mais de 60 mil [pessoas] fossem abrigadas no Brasil, inclusive já com oportunidade de trabalho”, afirmou o ministro da Cidadania, João Roma.

A Operação Acolhida foi criada em 2018 para garantir o atendimento humanitário a venezuelanos em Roraima, principal porta de entrada do país vizinho para o Brasil.

A ação oferece assistência emergencial aos refugiados e migrantes. O atendimento ao fluxo desta parcela de venezuelanos na fronteira começa nas estruturas montadas para assegurar a recepção, identificação, fiscalização sanitária, imunização, regularização migratória e triagem de todos que vêm do país vizinho.

“O Governo brasileiro tem dado, com muita eficácia, uma prova de que é possível a gente superar essas dificuldades, inclusive receber nossos irmãos venezuelanos com estrutura adequada e com encaminhamento de vida para muitos deles”, disse o ministro, que destacou que, mesmo com a crise sanitária causada pela Covid-19, o trabalho não parou.

“Mesmo durante esse período de pandemia, nós acolhemos essas pessoas, demos toda a infraestrutura necessária, alimentação, medicamentos e a parte de registro civil, através do Ministério da Justiça”, enfatizou o ministro João Roma.

De acordo com dados atualizados da Casa Civil, cerca de 335 mil Cadastros de Pessoas Físicas (CPFs) já foram emitidos durante a Operação.

Estrutura

Para acomodar o grande número de venezuelanos, a Operação conta com 12 abrigos em Boa Vista (RR), sendo quatro deles destinados a indígenas. Em Pacaraima (RR), um décimo terceiro abrigo também é destinado a indígenas.

No mês de outubro deste ano, o Presidente Jair Bolsonaro fez uma visita ao centro da Operação Acolhida, em Boa Vista. Na ocasião, ele reconheceu a importância do trabalho prestado e desejou sorte aos venezuelanos. “Aos venezuelanos que estão aqui, boa sorte a vocês! Parabéns ao nosso Exército Brasileiro, entre outras organizações aqui presentes, que trabalham para acolhê-los”.

A força-tarefa humanitária é executada e coordenada pelo Governo Federal com o apoio de entes federativos, agências da ONU, organismos internacionais, organizações da sociedade civil e entidades privadas, totalizando mais de 100 participantes.

Interiorização

A Estratégia de Interiorização, que desloca refugiados e migrantes venezuelanos de Roraima para outros estados brasileiros, é a principal estratégia do Governo brasileiro para promover a inclusão socioeconômica dos refugiados e migrantes venezuelanos. Desde o início da ação, em abril de 2018, já foram interiorizadas mais de 64 mil pessoas para mais de 700 municípios brasileiros em diversas Unidades da Federação.

“Então, dessa forma, com o Brasil através do seu povo, com tanta solidariedade, tem conseguido lidar com essa questão e tem reconhecimento internacional. Vários organismos têm elogiado as práticas do Governo Brasileiro e também do povo brasileiro, que tem conseguido fazer a ambientação dessas pessoas”, declarou o ministro da Cidadania.

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Chile dos livros e das ruas

 

Uma série de traduções trouxe em 2021 novidades da literatura chilena para o Brasil. Diamela Eltit, Nona Fernández e Alejandro Zambra tiveram obras lançadas no mercado brasileiro. Esse movimento oferece mais trabalhos de escritores e escritoras fundamentais da atualidade e coincide com a energia política que sacudiu as ruas do Chile nos últimos anos. Os chilenos preparam atualmente o processo para elaborar uma nova Constituição do país, o que pode mudar os rumos

O dado político mais recente foi a vitória de Gabriel Boric na eleição para presidente do Chile. A escolha de um jovem de apenas 35 anos é a prova de que existe, de fato, uma nova política — e não artifícios para enganar turistas desavisados. O resultado eleitoral ainda mostrou a potência da cultura contestadora de um país que serviu de laboratório para atrocidades do século 20, mas que sobreviveu ao não deixar se cair na apatia e ao valorizar como poucos lugares a memória coletiva.

Os chilenos foram até recentemente o símbolo de uma estabilidade política conservadora na América Latina. Vendeu-se a fantasia de uma ilha no meio de um mar em chamas na região. Uma espécie de utopia do Fim da História. Ao longo de 30 anos, parecia uma sociedade imune a radicalismos. Mas, como o personagem do romance “Casa de Campo” (1978), de José Donoso, era a imagem da criança arrumadinha que escondia, na verdade, a energia incontrolável debaixo das roupas enfeitadas.

Os visitantes estrangeiros poderiam se impressionar com as aparências de uma economia liberal e moderna. Ao mesmo tempo, porém, não havia como esconder que algo de muito perturbador estava por trás daquela maquiagem social feita de vinhos, salmões e estações de esqui na neve perto da capital Santiago. Estudantes pediam ajuda em dinheiro na rua, como pedintes, para bancar o crédito da faculdade, e manifestações fechavam diariamente as avenidas de algum ponto da cidade.

O espaço público do Chile estava doente, tal qual se via na prosa de Diamela Eltit, a grande narradora do desastre de seu país a partir dos anos 1980. O livro “Lumpérica” (1980) é desconcertante e inclassificável. Uma ditadura puro sangue, tocada por Augusto Pinochet, havia jogado mais da metade da população para baixo da linha de pobreza. Era pior do que o Brasil, mas os chilenos e os estrangeiros cuidavam de vender o “show case” para toda a região e para o mundo.

Até mesmo um produto de exportação, como a escritora Isabel Allende, exibiu o abismo histórico em que o país havia se metido. Sua biografia virou uma interessante minissérie Isabel, no Amazon Prime. E até seu best-seller mundial, “A Casa dos Espíritos” (1982), expõe a energia subterrânea do país, sufocado pela bestialidade de uma ditadura. Um governo que combinou um liberalismo radical com as técnicas mais brutais de violência física contra seus cidadãos e cidadãs.

É essa cultura antiviolência que produziu Gabriel Boric. Um estudante nascido no extremo sul da Patagônia chilena, povoada por imigrantes iugoslavos. Boric é sobrenome croata. Ele foi parar na capital nas ondas do movimento estudantil que a partir de 1990 nunca deixou a chama da contestação se apagar. Em 2019, a moçada deu a estocada final com revoltas diárias e a cobrança por uma nova Constituição. Conseguiram uma vitória que colocou o governo de joelhos.

As leis deixadas por Pinochet caducaram. O sistema privado de aposentadorias, por exemplo, se revelou um fracasso na prática. O crédito estudantil fora a solução pensada para abolir o ensino público e adotar a educação privada para todos, nos moldes do mais vulgar neoliberalismo — outro fracasso retumbante. Com esse pano de fundo, os chilenos encenavam uma peça farsesca de estabilidade política e econômica. Era, na verdade, uma ruína como a dos demais vizinhos latino-americanos.

O escritor Roberto Bolaño foi embora do Chile, tornando-se um exilado em estado permanente. Não se preocupou em voltar para aquela terra que o expulsara. Seus livros são testemunho do delírio coletivo que resolve todos as questões com a violência. Um horror que desemboca em reações brutais contra a população mais vulnerável (pobres, mulheres, indígenas). O desaparecimento de corpos deve ser a contribuição da política chilena para o mundo — algo compartilhado com os argentinos.

Énio Viera

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quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Migrantes da América Central: cada vez mais ameaçados por acidentes de trânsito

Toya Sarria Jordan photo Reuters 

A  morte de pelo menos 55 centro-americanos em um acidente de caminhão no México perto da fronteira com a Guatemala este mês destaca o perigo da jornada a que os migrantes se submetem, mesmo em situações normalmente menos arriscadas.

Em 10 de dezembro, o caminhão tombou quando o motorista aparentemente fez uma curva acentuada em velocidade excessiva, fazendo com que o trailer se chocasse contra uma passarela e uma obra. O caminhão transportava pelo menos 160 pessoas, em sua maioria guatemaltecas, um número absurdo se considerarmos que um ônibus normal tem capacidade para cerca de 40 pessoas, um ônibus articulado para cerca de 60 e um ônibus de dois andares para 80.

O acidente representa um dos mais mortais envolvendo migrantes em décadas, mas não foi o único do ano. Em março, um SUV da Ford que transportava 25 migrantes mexicanos colidiu com um trator na Califórnia, perto da fronteira mexicana, matando 13 pessoas. O carro tinha capacidade legal para transportar sete ou oito pessoas.

Oportunidades econômicas para coiotes

Os riscos nas rotas migratórias da América Latina para os Estados Unidos são diversos, mas as condições precárias de transporte figuram cada vez mais alto na lista. Isso se deve ao aumento da repressão na fronteira e à queda da circulação migratória de latino-americanos nos Estados Unidos, que se refere ao movimento legal de trabalhadores temporários que cruzam a fronteira de forma sazonal para trabalhar e retornam aos seus países, conforme explica Joel Millman, da Organização Internacional para Migrações.

As migrações circulares começaram a diminuir após a recessão de 2008-09, quando o volume da imigração mexicana nos Estados Unidos caiu significativamente, o que coincide com o aumento da fiscalização fronteiriça implementado pelo governo de George W. Bush, como explica o American Immigration Council.

Como resultado, cruzar a fronteira dos Estados Unidos tornou-se mais difícil, dando mais oportunidades econômicas aos chamados “coiotes”, ou contrabandistas que ajudam os migrantes a entrar no país de forma irregular. Assim, os coiotes passaram a assumir riscos mais altos para aumentar os lucros, o que inclui dirigir veículos inseguros e cada vez mais abarrotados de gente, aumentando a chance de acidentes fatais. “A relação que os migrantes têm com as pessoas que os transportam tende a ser muito mais difícil hoje porque estão lidando com uma classe de contrabandistas mais criminosa do que existia há uma geração. Claramente, isso se reflete no número de mortes”, explica Millman.

O preço cobrado pelos coiotes varia amplamente, mas os valores normalmente oscilam entre US$ 6 mil e US$ 10 mil, de acordo com um estudo de 2019 do Homeland Security Operational Analysis Center.

Aumento da migração – e da violência

Os Estados Unidos viram um aumento na migração irregular entre outubro de 2020 e o mesmo mês de 2021, ultrapassando 1,7 milhões — um número nunca visto desde que o governo iniciou ou rastreou o fenômeno. Os mexicanos e centro-americanos representam 78% desses migrantes.

Entre 2014 e 2019, mais de 3,8 mil migrantes morreram em rotas migratórias em todo o continente, quase 3,5 mil deles na fronteira entre o México e os Estados Unidos, de acordo com as Nações Unidas.

No caso dos centro-americanos, sua jornada torna-se mais perigosa porque têm de atravessar áreas dominadas pelo narcotráfico não só em seus países de origem, mas em todo o México, onde a fragmentação dos cartéis intensificou a disputa territorial e, consequentemente, a violência.

Entre setembro de 2008 e fevereiro de 2009, 9.857 migrantes centro-americanos foram vítimas de cartéis no México, com pelo menos 198 sequestros relatados, de acordo com a Comissão Nacional de Direitos Humanos do México. Cerca de 30% dos migrantes afirmam ter sofrido violência durante o trajeto, de acordo com um estudo realizado entre 2009 e 2015.

Os migrantes são alvos fáceis para os cartéis porque não têm respaldo legal ou institucional. “Eles não denunciam [os crimes] porque são ameaçados e não sabem a quem recorrer. A maioria dos sequestradores tem vínculos com as autoridades, o que torna virtualmente impossível tomar medidas contra eles. É o negócio perfeito”, disse Guadalupe Correa-Cabrera, especialista em tráfico de drogas e imigração da Universidade George Mason em Fairfax, à NBC News em outubro.

Migração sanitária e climática

O processo se tornou mais dramático em face das crises humanitárias e econômicas impostas aos países centro-americanos pela emergência climática e pela pandemia de Covid-19. Do ponto de vista econômico, a América Latina foi a região foi mais afetada pela crise sanitária, o que levou muitos latino-americanos a deixar seus países em busca de oportunidades em outras regiões.

Os anos pandêmicos também coincidiram com a pior temporada de furacões registrada na história. Dois furacões de categoria 4, sendo 5 a pior, devastaram a América Central em novembro de 2020, afetando países que já sofriam com secas intensas devido aos padrões climáticos erráticos no chamado Corredor Seco desde 2014.

Reverter os efeitos econômicos negativos da pandemia levará anos, senão décadas. Governos e líderes mundiais não têm feito o suficiente para mitigar o avanço do aquecimento global. Nesse cenário, podemos esperar que as ondas de migração da América Central continuem a aumentar nos próximos anos — e com elas o número de cidadãos dispostos a arriscar suas vidas e as de seus filhos em rotas migratórias predatórias.

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