Uma nova estratégia de "atração de cérebros" poderá trazer
cerca de 6 milhões de profissionais estrangeiros para o Brasil nos próximos
anos, segundo a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) do governo.
Com o auxílio de grupos de especialistas e consultorias de mercado, a
secretaria quer desenvolver uma política de atração de profissionais - o
número, no entanto, não inclui imigrantes de baixa qualificação e, sim,
profissionais altamente qualificados que possam atender a demanda atual da
economia brasileira.
"Ainda não é uma proposta fechada do governo, mas é a nossa meta atual",
disse o ministro-chefe interino da SAE Marcelo Neri à BBC Brasil. "Imigrantes qualificados são o foco do
esforço. Não é uma política geral de imigração, é uma estratégia de atração de
cérebros."
Neri afirmou que a estimativa de 6 milhões foi feita depois de
levantamentos de uma comissão de especialistas e de pesquisas com as empresas e
o público em geral.
Segundo Neri, o Brasil é um dos países com a menor proporção de
imigrantes na população, o que reflete "um fechamento do País ao fluxo de
pessoas". Os estrangeiros representam hoje 0,2% da população. Com a adição
de seis milhões nos próximos anos, este percentual subiria para cerca de 3%.
Para Neri, esse "fechamento" deve ser revertido para responder
à demanda crescente por profissionais altamente qualificados, especialmente na
áreas de engenharia e saúde.
Mas sindicatos nacionais temem que trazer mão de obra de fora prejudique
a força de trabalho doméstica - que, de acordo com eles, é suficiente em termos
numéricos, mas precisa de valorização e melhor qualificação.
Neri afirma que a nova estratégia "leva em conta a necessidade
atual de mão de obra qualificada, mas mantém o cuidado com o trabalhador
brasileiro".
"Não é uma abertura de porteira. Trazer profissionais altamente
qualificados cria associações mais fortes, cria mais massa crítica, se aprende
muito com outros profissionais."
'Apagão
de mão de obra'
A expressão "apagão de mão de obra" é usada com frequência por analistas de mercado nos últimos anos para se referir a uma suposta escassez de profissionais altamente qualificados no Brasil.
A expressão "apagão de mão de obra" é usada com frequência por analistas de mercado nos últimos anos para se referir a uma suposta escassez de profissionais altamente qualificados no Brasil.
De acordo com a Pesquisa de Escassez de Talentos 2012 da consultoria
internacional Manpower Group, o Brasil é o segundo país do mundo em dificuldade
para preencher vagas, atrás apenas do Japão. A falta de candidatos disponíveis
e a falta de especialização são apontadas por empresários como as duas
principais razões do problema.
Mas, em 2011, um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) negou a existência de um "apagão" no topo da pirâmide
de profissionais brasileiros.
"O verdadeiro apagão de mão de obra está na base, na mão de obra
pouco qualificada, que é onde os salários estão subindo mais", diz o
ministro Marcelo Neri, que é também o presidente do Ipea.
O ministro, no entanto, afirma que nos últimos anos algumas áreas de
especialidade começaram a dar sinais de que a oferta de profissionais
domésticos não seria suficiente para atender ao mercado em crescimento do País.
"(Entre os profissionais qualificados) você não tem um apagão
completo, mas você tem áreas mais sombreadas do que outras. O fato é que o
mercado de trabalho em 2012 e 2013 se aproxima do que se pode chamar de um
apagão. A luz ficou mais fraca."
Um levantamento da Brasil Investimentos e Negócios (Brain) - consultoria
que realiza pesquisas sobre a inserção do Brasil no mercado internacional e
colabora com a SAE - afirma que medicina, engenharia civil, engenharia química
e arquitetura são éreas em que o País precisa de mais profissionais do que os
disponíveis.
"Independentemente da política realizada para a educação, não vamos
ter resultados imediados. O resultado de políticas públicas acontece em duas ou
três gerações", diz André Luiz Sacconato, analista da Brain.
"Existe um buraco entre os resultados de políticas e o que o Brasil
necessita hoje. Os imigrantes viriam para suprir essa lacuna."
Outro benefício, de acordo com a Brain, são os empregos criados a partir
da importação de profissionais. Cada profissional estrangeiro empregado no
Brasil poderia gerar entre 1,3 e 4,6 empregos para brasileiros.
"Temos claramente obras paradas porque não tem engenheiro civil.
Quando se coloca um engenheiro civil lá, se gera emprego para mestres de obras
e outros. Isso é bom para a economia", afirma Sacconato. "É algo complicado,
vai mexer com sindicatos e associações de classe. Mas não queremos tirar o
emprego de ninguém, são empregos complementares."
Discordâncias
Atualmente, segundo o Ministério do Trabalho e consultorias, a maior parte dos estrangeiros que obtém o visto de trabalho brasileiro são profissionais qualificados para as indústrias de extração de petróleo e construção civil - especialmente obras de infraestrutura.
Atualmente, segundo o Ministério do Trabalho e consultorias, a maior parte dos estrangeiros que obtém o visto de trabalho brasileiro são profissionais qualificados para as indústrias de extração de petróleo e construção civil - especialmente obras de infraestrutura.
Mas o presidente da Federação Nacional dos Engenheiros, Murilo Pinheiro,
questiona que haja falta de engenheiros locais para atender à demanda.
"A demanda por profissionais nessas áreas realmente aumentou, mas
não está faltando. Se for preciso trazer um engenheiro de uma matéria que não
existe aqui, (a importação) é de fato interessante, mas não entendo a
necessidade de trazer amplamente engenheiros civis", disse Pinheiro à BBC Brasil.
O presidente da Federação Nacional dos Arquitetos, Jeferson Salazar,
afirma que apesar da demanda, o setor público não absorve a quantidade de
profissionais que chegam ao mercado a cada ano - cerca de 7 mil.
"Nos últimos 25 anos, o número de escolas no Brasil cresceu 6
vezes. A quantidade de jovens arquitetos com subemprego ou desempregados no
País é imensa e o governo não tem nenhum plano para utilizar esse exército de
mão de obra", disse à BBC Brasil.
"Sou a favor da vinda de alguns profissionais qualificados que
possam contribuir com o desenvolvimento da arquitetura no Brasil. Esses
profissionais serão bem-vindos se trouxerem contribuições."
A medicina, segundo Marcelo Neri, é a área que mais se enquadra na ideia
de um apagão de mão de obra, a julgar pelos indicadores de mercado.
Entretanto, o presidente da Federação Nacional dos Médicos, Geraldo
Ferreira, afirma que o número atual de profissionais no Brasil - cerca de 1,9
médico para cada mil pessoas - é capaz de atender o mercado nacional, na
condição de que sejam criadas melhores estratégias de distribuição de
profissionais e planos de carreira no setor público.
"A presidente está fazendo o planejamento estratégico de elevar o
número para 2,4 médicos para mil habitantes. Realmente, para atingir isso hoje,
faltam médicos. Mas se o planejamento é para atingir essa meta em 2020, nossa
avaliação é diferente da do governo, que trabalha com a ideia de que teríamos
que importar médicos", disse Ferreira à BBC Brasil.
"Com o lançamento de 17 mil médicos por ano no mercado, acreditamos
que teríamos isso, sim. O que precisamos é melhorar a atratividade do setor
público no Brasil para mantê-los lá. Injetar profissionais não vai
necessariamente resolver os problemas", disse à BBC Brasil.
Campanhas para atrair médicos estrangeiros para o setor público já
existem em diversos Estados brasileiros.
Visto
rápido e mais seleção
A estratégia mais bem cotada pela SAE para atrair profissionais para o Brasil é a adoção do sistema de pontos, utilizado por países como Austrália, Canadá e Grã-Bretanha.
A estratégia mais bem cotada pela SAE para atrair profissionais para o Brasil é a adoção do sistema de pontos, utilizado por países como Austrália, Canadá e Grã-Bretanha.
O sistema confere quantidades diferentes de pontos às respostas do
potencial imigrante em um questionário.
André Luiz Sacconato, analista da Brain, diz que o sistema pode ser uma
opção beneficie empresas e proteja o trabalhador brasileiro de uma
"invasão" de profissionais.
"Ele limita a entrada ao que se precisa, já que você pode dar
poucos pontos para determinadas profissões, idades ou experiências que não são
desejadas pelo país", defende.
O ministro Marcelo Neri diz que a SAE não cogita criar uma lista de
profissionais em demanda, que também é utilizado por estes países juntamente
com o sistema de pontos.
Atualmente, os vistos de trabalho para o Brasil são vinculados à
contratação por uma empresa no país. Em 2012, mais de 73 mil vistos foram
emitidos.
Agilizar o processo de obtenção do visto é um dos pilares da estratégia
da SAE. De acordo com a Brain, o processo brasileiro requer 19 documentos
diferentes - são 8 no Canadá, 12 na Grã-Bretanha e 13 na Austrália.
A espera para a emissão do visto
brasileiro também é uma das maiores - são 45 dias em média, contra 15 dias na
Grã-Bretanha e 21 dias na Austrália.
Terra
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