Em um mundo no qual o antissemitismo ainda é bastante forte,
uma das grandes dificuldades de Israel é encontrar aliados para lidar com
assuntos sensíveis, como as negociações com os palestinos e o programa nuclear
do Irã. Nos últimos dias, determinados setores da sociedade israelense agiram
de forma a prejudicar bastante a imagem de Israel pelo mundo. Fizeram isso
recorrendo à violência, retórica e prática, para lidar com o grave problema
criado pela recente onda de imigração de negros africanos para o país.
O
ministro do Interior de Israel, Eli Yishai, deu declarações assustadoras. Em entrevista ao
jornal Maariv, afirmou que a forma de resolver o problema da
imigração é criar “mais prisões e campos de detenção para imigrantes e preparar
mais bases militares onde eles possam ficar presos”. Segundo Yishai, o sul de
Tel Aviv (onde muitos imigrantes se concentram) virou “a lata de lixo do país”
e Israel já tem problemas suficientes de saúde e bem-estar social para
“importar mais problemas da África”. Ao jornal, Yishai ainda sugeriu a seus
críticos que “peguem os infiltrados e coloquem-nos em seus bairros para vê-los
todos os dias e para que suas crianças brinquem com eles nas mesmas escolas”.
O comportamento de Yishai não é solitário,o primeiro-ministro de Israel, Benjamin
Netanyahu, prometeu criar o “maior campo de detenção do mundo”, deportar todos
os que estiverem nele e acrescentar os “infiltrados” à lista de ameaças ao
estado judeu.
Chama a atenção o fato de as declarações de Yishai e
Netanyahu se darem dias depois um violento episódio ocorrido em Tel Aviv. Parte
das cerca de mil pessoas que protestavam contra a imigração , atacaram
estrangeiros, depredaram veículos e uma loja cujo dono era um imigrante do
Sudão. No evento, o parlamentar Danny Danon classificou os imigrantes como uma
“praga”. A parlamentar Miri Regev chamou a imigração de “câncer” na sociedade
israelense. Mais tarde, ela se desculpou. Netanyahu condenou a violência, mas
em seguida disse que compartilhava dos sentimentos dos manifestantes e que logo
começaria a deportá-los.
A recente onda de imigração pegou Israel de surpresa. Desde
o início da Primavera Árabe, a Península do Sinai, que separa o país do Egito,
virou uma terra de ninguém. Por ela, traficantes de pessoas levam, ilegalmente,
milhares de imigrantes para Israel, o país mais estável e com a economia mais
saudável da região. Segundo o governo de Israel, 60 mil pessoas, a maioria da
Eritréia e do Sudão do Sul, chegaram ao país nos últimos anos. Em Israel, eles
são proibidos de trabalhar. Alguns se tornaram criminosos ocasionais. A
crescente presença dos negros gerou a hostilidade atual.
Felizmente, nem todos os políticos israelenses agem desta
forma. Reuven Rivlin, o presidente do Parlamento de Israel, se disse “chocado”
e afirmou que a onda de ataques aos imigrantes lembra “o discurso de ódio
direcionado ao povo judeu”. Muitos liberais e esquerdistas também foram às ruas
protestar contra as manifestações de racismo aos imigrantes. Suas vozes,
entretanto, ainda falam mais baixo, até porque o primeiro-ministro de Israel e
alguns de seus ministros estão empenhados na expulsão sumária dos imigrantes.
Como Israel, muitos outros países enfrentam questões éticas,
morais e práticas ao lidar com grandes fluxos inesperados de imigrantes. A
solução, nesses casos, nunca é simples. Mas o fato de alguns cidadãos e
políticos israelenses, em vez de pedirem uma regulamentação da imigração,
adotarem uma retórica racista e uma prática que beira o fascismo é
especialmente chocante. Israel é um país criado por imigrantes, que chegaram
àquela região fugindo da atroz perseguição antissemita e do fechamento de
fronteiras para os judeus em muitos países. Nas últimas décadas, Israel
conseguiu absorver grandes fluxos de imigrantes. Desde 1989, cerca de 1 milhão
de russos (brancos, mas nem todos judeus) chegaram ao país e hoje possuem até
grande representação parlamentar. Mais recentemente, cerca de 120 mil etíopes
(judeus) também se adaptaram. Agora, quando imigrantes negros e não judeus
chegam a Israel, a resposta de parte da sociedade é um comportamento semelhante
ao daqueles que provocaram a tragédia do povo judeu antes e durante a Segunda
Guerra Mundial. É algo que pode entrar como uma mancha para a história de
Israel.
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