O mundo contemporâneo, sobretudo após a
globalização, impôs novas realidades a estudantes e trabalhadores. Uma delas é
a migração. Com a demanda de profissionais em muitos países da Europa, o número
de imigrantes em solo europeu tornou-se assunto de Estado em países como
Inglaterra e França, além de tema de pesquisas nas maiores universidades do
mundo.
Por
isso, a professora doutora Ana Beatriz Gonçalves, do Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários
da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), começou este ano a trabalhar
com o tema da migração, em parceria com as professoras Graciela Ravetti, da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Else Vieira, da Queen Mary
University of London .O trabalho busca investigar a condição das mulheres
latino-americanas que emigram para países europeus, especialmente para a
Inglaterra. Para tal, as três pesquisadoras pretendem abordar as condições de
vida e trabalho das mulheres latino-americanas na Europa.
A
pesquisa se propõe a avaliar produções em literatura e vídeos documentais,
escritos e produzidos por autores latino-americanos, que falem sobre o assunto.
Segundo Ana Beatriz, sua função no projeto é a de investigar as obras
literárias. “São mulheres que viveram a situação de serem imigrantes, de viver
em solo estrangeiro, escreveram sobre isso e publicaram seus livros.” Ela
afirma que, além da própria condição de imigrante, as condições de vida e
trabalho impostas às imigrantes são, muitas vezes, decepcionantes. “Elas vão à
Europa com a esperança de ganhar dinheiro e voltar ao Brasil, mas costumam
arcar com uma carga de trabalho abusiva, viver uma série de problemas. Isto
acaba se tornando um tema importante na obra dessas escritoras.”
Para
a professora Graciela Ravetti, que coordena o projeto, as dificuldades para as
imigrantes começam cedo, desde a obtenção dos vistos de trabalho. Além disso,
muitas vezes a condição de vida que é oferecida às imigrantes brasileiras
impede que alcancem o sonho de ascensão social. “Quando elas conseguem o visto,
acabam tendo de arcar com trabalhos invisíveis, como fazer faxinas de edifícios
à noite. Também costumam acumular serviços, trabalhando três turnos por dia.”
O imigrante e sua
relação com a nova terra
Um
aspecto importante da pesquisa da professora Ana Beatriz é a “relação
sujeito/território”, ou seja, os estudos sobre qual é a relação que as pessoas
mantêm com o lugar onde vivem. Neste tipo de estudo, pergunta-se, ao avaliar as
produções literárias, de que forma ou o quanto as autoras se identificam com o
lugar de onde escrevem, se elas sentem-no como seu ou procuram transforma-lo.
Para Ana Beatriz, um fator relevante ao
avaliar a relação sujeito/território nos tempos de migrações é o fenômeno, que
atinge alguns imigrantes, da falta de identificação territorial. “Às vezes, um
imigrante vai morar num país e não se identifica com o local. Mas, quando volta
ao lugar de origem, também já não entende aquele lugar como seu.” Segundo ela,
a academia costuma chamar a essas pessoas de “indivíduos desterritorializados”.
A professora, no entanto, não gosta do termo. “Desterritorialização não é o que
melhor define a atual situação dessas pessoas.”
Para
abordar a situação de falta de território que permeia a obra de muitos
imigrantes, Ana Beatriz prefere um conceito elaborado pelo professor Rogério
Haesbaert, da Universidade Federal Fluminense (UFF). “Ele não fala em sujeitos
sem território. Ele fala em indivíduos com múltiplos territórios. Brasileiros,
por exemplo, que vivem nos Estados Unidos e vão todo ano à Europa, são
multiterritorializados.” Ana Beatriz ainda aponta alguns dos aspectos negativos
desta nova realidade: “As pessoas ficam sem um lugar, acabam formando guetos,
que são comuns na Europa e nos Estados Unidos”.
Apoio aos imigrantes
Ao
estudar a questão da representação da mulher imigrante na Europa em vídeos
documentais e obras literárias, as professoras Ana Beatriz Gonçalves, Graciela
Ravetti e Else Vieira pretendem levar o assunto à discussão junto às
comunidades de brasileiros na Europa, realizando reuniões periódicas em
Londres, Lisboa ou em outras das principais cidades que recebem imigrantes
latino-americanos.
Como
um primeiro passo, este objetivo já rendeu frutos para o trabalho das três
professoras. Segundo Ana Beatriz, elas já conseguiram realizar uma reunião com
a presença do vice-prefeito de Londres. “Foi quando eu visitei a Inglaterra
para uma reunião com representantes comunitários latino-americanos. Ele estava
lá para discutir a possibilidade de realizar uma semana ou mês da América
Latina na Inglaterra, com muitas atividades culturais.”
Contudo,
as docentes não querem apenas suscitar uma discussão. Elas buscam resultados
práticos que auxiliem os atuais e os futuros imigrantes brasileiros. “Estamos
em processo de publicação de uma cartilha de orientação aos imigrantes, em
linguagem simples e de distribuição gratuita, expondo muitas situações pelas
quais eles podem passar”, explica Graciela Ravetti. De acordo com ela, estas
iniciativas já encontraram apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) e da Secretaria de Mulheres do Governo Federal.
O
trabalho ainda está no começo e deve ganhar mais apoio e novos objetivos nos
próximos anos. Graciela, inclusive, reitera a importância dessa pesquisa para a
realidade das mulheres imigrantes latino-americanas. “O objetivo é oferecer
informações que possam ajudar, informar às imigrantes sobre seus direitos,
reduzir o sofrimento e melhorar a qualidade de vida dessas mulheres.”
Hélio Rocha
– estudante de Comunicação Social
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