sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Missão Paz : Um Prêmio que Agride! (Uma foto que agride e um prêmio que a valida)


Em maio de 2015, centenas de imigrantes haitianos, senegaleses, dominicanos e outros aportaram à Missão Paz, em São Paulo, para buscar apoio e orientação. Em  meio a essas chegadas, sucederam-se alguns fatos que precisam ser recuperados. 
Primeiro, o poder público encontrava-se desprovido de uma articulação para receber os imigrantes que iam desembarcando no terminal da Barra Funda e nos aeroportos, provenientes do Acre via Equador ou diretamente do Haiti, da África. Nesta ocasião, diariamente, dezenas de jornalistas acorriam a Missão Paz em busca de informações e imagens para os meios de comunicação que representavam. 
A Casa do Migrante, que funciona junto à Missão Paz, estava no limite de sua capacidade de acolhimento. E como o apoio que deveria ser dado por quem de direito foi muito aquém da expectativa, a Missão sentiu-se no dever humanitário e civil de proporcionar um mínimo de guarida e dignidade aos irmãos imigrantes que escolheram o Brasil como um lugar onde pudessem recomeçar suas vidas.
Mesmo nos esforçando para a máxima doação, muitos imigrantes - eram mais de 100 pessoas - foram abrigados provisoriamente, precariamente nos salões, corredores e salas menores da Igreja... Foi nesta ocasião que o fotógrafo Ronny Santos, do Jornal Agora São Paulo, sem pedir licença, saiu fotografando tudo o que via pela frente, inclusive um haitiano nu tomando banho junto a um mictório que, naquele contexto, por acordo entre os migrantes, só servia para lavar roupas. O jornal Folha de São Paulo publicou a foto no dia 20 de maio de 2015. A atitude do fotógrafo expressa desrespeito aos direitos universais da pessoa humana.  Ronny Santos não pediu autorização ao haitiano para fotografá-lo. O haitiano desabafou que estava tomando banho e o fotógrafo entrou disparando a câmera. Falou ainda da humilhação que sofreu.  No dia seguinte, por vergonha, foi embora para outra cidade.
Em 20 de outubro de 2015, no Tuca - Teatro da PUC-SP, foram premiados os vencedores do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos.  Dentre as 8 categorias premiadas esteve a foto do “haitiano tomando banho em mictório”. Mesmo com o alerta da Missão Paz – publicou-se nota de repúdio em sites e Boletins de Notícias – sobre a fotografia feita com um caráter invasivo e desrespeitoso, a foto foi inscrita, e, premiada. 
Tal premiação abre um perigoso precedente para o reconhecimento social de trabalhos que, inadvertidamente, não consideram a ética sobre os meios utilizados para chegar aos fins almejados. O que mais importa: uma foto em si ou os direitos da pessoa fotografada? Não duvidamos da relevância cultural, social, política, histórica  do  Prêmio Vladimir Herzog que  tem sua  trajetória marcada por lutas de defesa e promoção dos direitos humanos. Mas, houve um cochilo de sua comissão nesse caso.
Não podemos fazer vistas grossas diante de atitudes que ferem a dignidade de uma pessoa e de todas as comunidades de migrantes que têm aportado ao Brasil. Manifestamos nosso repúdio e lamentamos a contradição expressa na premiação da foto, que veio reavivar a ferida aberta em maio de 2015.
Defendemos de forma irrestrita e incondicional os Direitos Humanos; a busca caminhos, ações efetivas para a superação de preconceitos, xenofobias, desrespeitos, e, que se promova o Bem Viver, a dignidade de todos/as em nossa Casa Comum.


Missão Paz, Serviço Pastoral dos Migrantes-SPM, Pastoral do Migrante da Arquidiocese de São Paulo

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