Em maio de 2015, centenas de imigrantes
haitianos, senegaleses, dominicanos e outros aportaram à Missão Paz, em São
Paulo, para buscar apoio e orientação. Em
meio a essas chegadas, sucederam-se alguns fatos que precisam ser
recuperados.
Primeiro, o poder público encontrava-se
desprovido de uma articulação para receber os imigrantes que iam desembarcando
no terminal da Barra Funda e nos aeroportos, provenientes do Acre via Equador
ou diretamente do Haiti, da África. Nesta ocasião, diariamente, dezenas de
jornalistas acorriam a Missão Paz em busca de informações e imagens para os
meios de comunicação que representavam.
A Casa do Migrante, que funciona junto à Missão
Paz, estava no limite de sua capacidade de acolhimento. E como o apoio que
deveria ser dado por quem de direito foi muito aquém da expectativa, a Missão
sentiu-se no dever humanitário e civil de proporcionar um mínimo de guarida e
dignidade aos irmãos imigrantes que escolheram o Brasil como um lugar onde
pudessem recomeçar suas vidas.
Mesmo nos esforçando para a máxima doação,
muitos imigrantes - eram mais de 100 pessoas - foram abrigados provisoriamente,
precariamente nos salões, corredores e salas menores da Igreja... Foi nesta
ocasião que o fotógrafo Ronny Santos, do Jornal Agora São Paulo, sem pedir
licença, saiu fotografando tudo o que via pela frente, inclusive um haitiano nu
tomando banho junto a um mictório que, naquele contexto, por acordo entre os
migrantes, só servia para lavar roupas. O jornal Folha de São Paulo publicou a
foto no dia 20 de maio de 2015. A atitude do fotógrafo expressa desrespeito aos
direitos universais da pessoa humana.
Ronny Santos não pediu autorização ao haitiano para fotografá-lo. O
haitiano desabafou que estava tomando banho e o fotógrafo entrou disparando a
câmera. Falou ainda da humilhação que sofreu.
No dia seguinte, por vergonha, foi embora para outra cidade.
Em 20 de outubro de 2015, no Tuca - Teatro da
PUC-SP, foram premiados os vencedores do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de
Anistia e Direitos Humanos. Dentre as 8
categorias premiadas esteve a foto do “haitiano
tomando banho em mictório”. Mesmo com o alerta da Missão Paz – publicou-se nota
de repúdio em sites e Boletins de Notícias – sobre a fotografia feita com um
caráter invasivo e desrespeitoso, a foto foi inscrita, e, premiada.
Tal premiação abre um perigoso precedente para
o reconhecimento social de trabalhos que, inadvertidamente, não consideram a
ética sobre os meios utilizados para chegar aos fins almejados. O que mais
importa: uma foto em si ou os direitos da pessoa fotografada? Não duvidamos da
relevância cultural, social, política, histórica do Prêmio
Vladimir Herzog que tem sua trajetória marcada por lutas de defesa e
promoção dos direitos humanos. Mas, houve um cochilo de sua comissão nesse
caso.
Não podemos fazer vistas grossas diante de atitudes
que ferem a dignidade de uma pessoa e de todas as comunidades de migrantes que
têm aportado ao Brasil. Manifestamos nosso repúdio e lamentamos a contradição
expressa na premiação da foto, que veio reavivar a ferida aberta em maio de
2015.
Defendemos de forma irrestrita e
incondicional os Direitos Humanos; a busca caminhos, ações efetivas para a
superação de preconceitos, xenofobias, desrespeitos, e, que se promova o Bem
Viver, a dignidade de todos/as em nossa Casa Comum.
Missão
Paz, Serviço Pastoral dos Migrantes-SPM, Pastoral do Migrante da Arquidiocese
de São Paulo
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