Longa luso-brasileiro “Estive
em Lisboa e Lembrei de Você” conta a história de Sérgio, um mineiro que emigra
para Portugal em busca de uma nova perspectiva de vida
Muitos se emocionam com a dura realidade da imigração que assola
os países europeus e cidadãos, principalmente, do Oriente Médio e da África.
Poucos, porém, se atém ao fato de que este contexto da busca por uma vida
melhor seguido da frustração está muito presente na sociedade brasileira desde
muito antes da crise migratória europeia ou da guerra civil na Síria. Este é um
dos esclarecimentos que o longa luso-brasileiro Estive em Lisboa e Lembre de Você,
dirigido pelo português carioca José Barahona, trará para os espectadores da
39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Em uma
primeira tentativa de adaptar um dos romances do escritor Luiz Ruffato,
Barahona traz a história de Sérgio, homem de meia idade que mora com a mãe na
pequena cidade mineira de Cataguases, trabalha em uma fábrica e se diverte
jogando futebol aos fins de semana ou rasgando conversas no botequim com os
amigos. A vida pacata e parnasiana do pequeno município do interior logo ganha
toques sentimentais quando Sérgio se apaixona por uma mulher. Em função da
gravidez da moça, os dois se casam e tentam construir uma vida juntos.
A
desilusão logo vem à tona quando a mulher começa a demonstrar problemas de
alcoolismo e saúde mental. Sérgio, interpretado por então enfrenta o divórcio e
enxerga, aos poucos, sua vida desabar diante de seus próprios olhos: seu filho
será criado pelos pais abastados de sua ex-mulher, e o desemprego bate em sua
porta. É quando, em uma das fracionadas conversas de bar com os amigos, Sérgio
pensa que abandonar o País e tentar uma vida em uma nação próspera, como
Portugal, é a saída mais inteligível.
O mineiro então soma suas economias e embarca para a capital
lusitana, Lisboa, onde vê de perto que as promessas de um país em ascensão eram
apenas promessas. Suas dificuldades começam logo nos primeiros dias, quando
percebe que a burocracia de imigração em Portugal é dura e que apenas
estrangeiros com um emprego podem requisitar documentos portugueses. No
decorrer deste início da trajetória de Sérgio, o filme evidencia a xenofobia
velada que está presente em boa parte dos países colonizadores. Desde a entrada
em Lisboa, onde relata que é recebido com cara feia dos agentes de imigração,
até a chegada na pensão, na qual vivem outros estrangeiros, Sérgio experimenta
diversos tipos de estigmas enraizados.
O
longa, ambientado em 2005, mostra bem como a economia de Portugal vivia os
primórdios de uma política econômica que acabaria desencadeando em uma crise
monstruosa. Neste ano, o país ainda vivia uma ilusão de crescimento que havia
começado no início do século. Contudo, diversos fatores, como gastos com a
Eurocopa do ano anterior, citada em Estive
em Lisboa e Lembrei de Você, e um posicionamento econômico baseado
na austeridade, contribuíram para a recessão e a formação de uma grande massa
de desempregados.
Submerso
por este contexto de crise, Sérgio logo percebe seus patrícios abandonando a
Europa para voltar ao Brasil onde, concluiu o protagonista, a vida não era tão
ruim assim. Com a perspicácia de José Barahona, o longa mostra em doses
paulatinas as semelhanças entre Brasil e Portugal, tanto em relação às
qualidades, quanto às mazelas de uma sociedade capitalista.
Estive em Lisboa e Lembre de Você remonta um pensamento cada vez
mais atual, a crise imigratória, por meio da perspectiva de um brasileiro, algo
até então pouco discutido. O Brasil, que atualmente vive a responsabilidade de
ser o País que mais recebe refugiados na América Latina, deve se colocar no
lugar dos estrangeiros, uma vez que cidadãos brasileiros também vivem na pele
as aflições e contratempos do imigrante.
Brasileiros
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