E o dia finalmente chegou. Começa
nesta sexta-feira (30) em São Paulo a primeira
Conferência Nacional de Migrações e Refúgio (Comigrar), que até domingo (01/06)
vai debater o tema em um nível e amplitude jamais vistos no país (veja aqui a programação).
São esperadas para o evento em torno de 800 pessoas, entre especialistas,
autoridades, militantes e os próprios migrantes que aqui vivem.
A Comigrar foi antecedida por 210
etapas preparatórias que ocorreram entre novembro de 2013 e março deste ano no
Brasil e no exterior, que reuniram em torno de 2.500
propostas dos mais diversos tipos – acesso aos serviços básicos de saúde e educação estão entre
as demandas mais citadas.
Tanto o volume de propostas como a
quantidade de conferências pegaram de surpresa a organização da Comigrar.
“É um leque muito rico de olhares, que sinaliza uma pluralidade de pontos de vista e uma
contribuição muito qualificada para o realinhamento de pensamento sobre
migrações no país”, lembrou João Guilherme Granja, diretor do Departamento de
Estrangeiros da Secretaria Nacional de Justiça, em entrevista ao blog ainda
antes do balanço final das prévias.
Durante o evento, essas
reivindicações serão sistematizadas e compiladas em um documento único, a ser
entregue nas mãos do governo brasileiro, com o objetivo de
subsidiar políticas públicas para o setor.
O primeiro passo
Mas, o que pode se esperar da Comigrar de fato? Embora ela seja o
resultado de toda uma série de discussões articuladas em especial nos últimos
meses, a conferência é vista por especialistas, militantes e autoridades não
como um objetivo em si, mas como um ponto de partida para um novo paradigma em
migrações.
“O que se espera de fato da Comigrar
é que ela seja capaz de identificar todos os gargalos que existem na vida do
migrante que o impedem de ter sua situação regularizada, sua acolhida melhor
feita e sua integração de fato à sociedade brasileira. E que a partir dessa
identificação o Estado brasileiro assuma essa priorização desses pontos de
gargalo e busque remediar cada um deles”, opina Camila Asano, coordenadora de
política externa da ONG Conectas Direitos Humanos.
Esses gargalos, que incluem os acessos aos serviços públicos
reivindicados nas conferências, passam basicamente por dois grandes temas
que devem ter maior destaque no evento: a revisão da atual legislação
migratória e o direito dos imigrantes ao voto.
A mudança na legislação também é
destacada pelo professor Sidney Silva, coordenador do Grupo de
Estudos Migratórios na Amazônia (Gema), que espera da Comigrar um marco
regulatório que seja de fato inovador e diferente das medidas voltadas para a
securitização e controle de migrantes que têm ganho apoio no exterior. “Nessa
perspectiva, o Brasil poderá ser um exemplo no trato das questões migratórias,
não mais como um problema de polícia ou de assistência social, mas como um
fenômeno social que enriquece as sociedades envolvidas, tanto do ponto de vista
econômico, quanto nas suas implicações socioculturais”.
Já Marília Bonas, diretora do Museu da Imigração do Estado de São
Paulo, crê que a Comigrar deveria seguir o legado da Conferência Municipal promovida
na capital paulista no fim de 2013, considerado o pontapé inicial para a
Comigrar. “O texto da Conferência Municipal é uma das coisas mais maduras
e propositivas de construção colaborativa que já vi. Se a Comigrar conseguir
levar na conferência nacional o que foi firmado na municipal, vai ser um evento
de maior sucesso”.
Para Paulo Illes, coordenador de
políticas para imigrantes da Prefeitura de São Paulo, a Comigrar oferece um
espaço para intensificar o debate sobre a conjuntura da política migratória
brasileira. “Durante o evento será possível discutir a nova legislação migratória,
assim como a questão dos direitos políticos e da garantia ao direito ao voto
dos imigrantes no país. Além disso, espero que a partir dela seja possível
construir uma maior integração e interatividade entre organizações e movimentos sociais que trabalham
o tema da migração no Brasil”.
Além de endossar o direito ao voto do
imigrante e a mudança da lei migratória, 0 Centro de Direitos Humanos e
Cidadania do Imigrante (CDHIC) também inclui uma outra pauta entre as que
deveriam ser contempladas na Comigrar: a ratificação pelo Congresso Nacional da
Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de todos os Trabalhadores
Migrantes e dos Membros de suas Famílias. A nota completa do
CDHIC sobre a conferência pode ser acessada no
site da instituição.
Migrantes cobram resultados
Entre os migrantes a expectativa pode
ser considerada ainda maior sobre a Comigrar, tendo em vista o ineditismo da
mobilização e da conferência. “As propostas precisam ser efetivas. Espero
que realmente os migrantes saiam [da Comigrar] com alguma ação em prol daqueles
que chegam”, diz o chinês Cheung Ka Wai, um dos 20 imigrantes recém-eleitos
para os conselhos participativos municipais das
subprefeituras de São Paulo.
O jornalista e militante chileno Miguel Ahumada, que vive há quase
quatro décadas no Brasil, também aguarda a Comigrar com ansiedade, embora se
preocupe com o excesso de expectativa depositada sobre o evento por certos
imigrantes. “A conferência é consultiva, não deliberativa. E quem vai
decidir a política migratória é o Congresso”. Mas a ressalva não o impede de
destacar o fato de o evento permitir a participação do migrante, apesar dos
obstáculos existentes. “De certa forma, o governo está mobilizando o migrante.
E estou ansioso para que realmente aconteçam resultados claros e específicos”.
MIGRA MUNDO
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