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Há pouco mais de um ano, tomamos a decisão dentro do Planeta de TODOS de abrir o nosso primeiro projeto de moradia temporária para refugiados e imigrantes no Brasil, na cidade de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Diante do enorme fluxo de refugiados afegãos que chegaram ao país — e continuam chegando — acolher a estas pessoas vulneráveis, vítimas de perseguições político-religiosas, na chamada “Califórnia brasileira”, parecia, até certo ponto, uma loucura. Sempre foi a principal pergunta quando apresentamos e falávamos sobre o programa: mas por que Ribeirão Preto?
Afinal, como lidar com o gigantesco distanciamento cultural entre as partes? Quem poderia imaginar que refugiados do Afeganistão chegariam ao interior de São Paulo para esse enorme desafio para ambas as partes? Pois podemos dizer com todas as palavras: funcionou. Dos sete afegãos que vieram diretamente do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo (onde existiu um verdadeiro campo de refugiados no terminal 2), apenas um tomou o caminho dos Estados Unidos por vias próprias, como tantos outros fizeram ao usar o Brasil como território de trânsito.
Um segundo foi, sim, também para os Estados Unidos, mas porque passou numa bolsa de estudos na Universidade do Texas, após apoio da nossa organização na obtenção da entrevista e posterior visto de quatro anos na terra do Tio Sam. Os cinco demais, vejam só, já puxam o “r” direitinho, se viram muito bem no português e estão todos empregados via regime CLT. Mais do que isso, adquiriram a própria emancipação social e hoje alugam os próprios apartamentos — depois de entenderem todas as obrigações e responsabilidades.
O ciclo de um ano estabelecido em nosso planejamento estratégico com os afegãos nos trouxe a principal conclusão: interiorizar o conflitos migratórios é sempre uma saída interessante e eficaz. Longe de querer nos comparar, por exemplo, à Operação Acolhida da Acnur com os venezuelanos. Mas a premissa básica foi seguida: desafogar grandes centros em prol da construção de redes de apoio local no país é uma solução acertada e que deveria ter o seu modelo melhor e mais amplamente implementado.
Em Ribeirão Preto, por exemplo, os cidadãos do Afeganistão nunca sentiram a polarização política brasileira: sempre foram motivos de curiosidade, carinho e aceitação por parte da população local, independentemente de qualquer rusga direita x esquerda. As empresas abriram as portas e nos buscavam a todo o momento oferecendo vagas em diversos setores. Valorizam sempre a resiliência e força de vontade de quem recomeça a vida.
Vejam, por exemplo, o caso da MaisTODOS, empresa de soluções financeiras inteligentes com sede em Ribeirão Preto. Um roadmap foi construído baseado na busca de talentos, e após um intenso processo de aprendizado da língua portuguesa proporcionado dentro da própria residência do projeto, hoje temos três de nossos ex-residentes trabalhando numa empresa bastante conceituada no setor, espalhados pelo setor financeiro, de produtos e tecnologia do grupo. Eles conhecem hoje a legislação brasileira, os impostos que devem pagar e as vantagens de viver no regime CLT, no qual têm 13º salário, férias pagas, etc.
Não foi fácil, mas hoje eles entendem muito bem as vantagens do esforço inicial implementado e da melhor qualidade de vida que Ribeirão Preto proporciona: em 10, 15 minutos, eles chegam a qualquer lugar da cidade, dada as distâncias reduzidas. O custo de vida também é outro fator: eles conseguem economizar e ajudar os entes familiares que ainda estão no Afeganistão. Em São Paulo, dificilmente conseguiriam.
Enfim, não descobrimos a roda. Apenas aproveitamos uma conjuntura mais amena — longe da correria e caos paulistanos — para construir um plano de acolhimento humano e integração cultural e laboral que qualquer outro organismo pode replicar. Concentrar esforços em uma única cidade — como está acontecendo com a comunidade afegã, por exemplo — nunca será a saída diante da imensidão do Brasil.
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