terça-feira, 20 de maio de 2014

Somos todos estrangeiros

A imigração mudou a demografia, a cultura e a economia de nosso país. Ela redefiniu o Brasil que antes vivia sob o domínio indígena, ou paleoíndio. De modo geral, os que aportaram aqui até a independência podem ser chamados de colonizadores, pois viviam na colônia portuguesa. 

Após a independência do Brasil, ocorrida em 7 de setembro de 1822, ocorreu a vinda de imigrantes, ou seja, estrangeiros que se estabelecem em outros países. 

A Constituição de 1824, conhecida como Constituição da mandioca, a mesma que foi outorgada por D. Pedro I, “abrasileirou” muitos estrangeiros, transformados em brasileiros adotivos. 

Até o período colonial (1500/1822) a relação de pessoas de diferentes etnias, deu-se em épocas distintas e por motivos específicos. O nativo chegou ao Brasil por volta de 14 a 12 mil anos antes de Cristo. Eram povos nômades de origem asiática e colonizaram o continente americano.

O branco europeu de origem portuguesa exerceu o papel de dominador, e tomou para si a 
propriedade da terra. O comando português desapareceu por volta dos anos 30 do século XIX, com as revoltas regenciais e o fim do partido restaurador português.

O negro africano subsaariano em lutas internas em suas regiões, transformado em escravo foi vendido aos europeus e chegou aqui a contragosto como cativo. A escravidão foi sua sina. Trabalho compulsório foi o que lhe restou, sendo a morte a esperança de libertação. Estima-se em 6 milhões a quantidade de negros vindos para o Brasil.

O contato destas três etnias levou a criação da base da sociedade brasileira, e a mistura trouxe o cafuzo, o mameluco e o mulato.

Uma grande leva de portugueses chegou em 1808. O episódio foi chamado de a vinda da 
família real para o Brasil, estimado em 15 mil pessoas. Evento contraditório, pois segundo uma versão houve uma fuga em massa da elite portuguesa, que deixou os pobres sozinhos a mercês do invasor Napoleão. Outros falam em estratégia de D. Maria I (a louca) em preservar a coroa, coisa do xadrez político da época.

A mistura de humanitarismo e visão econômica dos ingleses, mandatários mundiais do século XIX, trouxe em 1870 a vinda de imigrantes para o Brasil imperial. Várias leis brasileiras começaram a proibir paulatinamente o 
trabalho escravo, haja vista que, internacionalmente a escravidão não era mais aceita. Vale aqui citar a Lei Euzébio de Queiróz, que acabou com o tráfico de escravo para o nosso país.

O café foi o segundo causador desta mudança, pois a necessidade de 
mão de obra nas fazendas levou os cafeicultores de São Paulo à contratação de mão de obra europeia.

A facilidade dessa mão de obra aconteceu devido ao aumento do desemprego nos 
países europeus, que estavam fazendo suas revoluções industriais e com muita expulsão de camponeses do campo.

A conjuntura da expansão da lavoura cafeeira, e o fim do tráfico internacional de escravos trouxeram principalmente italianos, suíços, alemães, espanhóis, ucranianos, e poloneses.

As regiões de 
São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul foram os destinos escolhidos por eles.

As novas 
formas de vida trouxeram sérias transformações na estrutura social e cultural do Brasil. Do ponto de vista da cultura, novos hábitos alimentares floresceram e advindos de lugares onde a indústria estava em pleno vapor, implantaram em São Paulo as primeiras oficinas, embriões das indústrias atuais.

A vida nas fazendas não foi 
bem sucedida, pois o combinado na Europa, não foi resgatado no decorrer do contrato aqui no Brasil. O empresário da época tinha como hábito trabalhar com o escravo e quis fazer o mesmo com o migrante europeu. O sistema de parceria falhou e muitos foram para os centros urbanos, modificando o cenário das cidades.

O governo vendo o sistema de parceria falhar ajudou na construção de colônias, o que propiciou o surgimento de várias cidades no sul do país.

A política brasileira sofreu um baque com a ideologia anarquista e depois comunista trazida pelos trabalhadores europeus, em especial o espanhol e o italiano, que discutiam 
direitos trabalhistas e protagonizando a primeira greve geral em fevereiro de 1917. Muitos foram expulsos do Brasil.

Uma guerra entre japoneses e russos entre 1904 e 1905, criou no Japão um expressivo número de desempregado. A migração aconteceu para os EUA e em 1908 o navio Kassatu Maru trouxe 165 famílias que se fixaram no sul e sudeste brasileiro. De lá para cá mais e 600 mil nipônicos chegaram ao Brasil até 2011.

Há entre 
meados do século XIX até as primeiras décadas do século XX, uma política liberal de migração com dois intuitos. Preencher espaços vazios do nosso território e uma ação de embranquecimento da população. Cerca de 4 milhões de estrangeiros entram no Brasil neste período, a maioria italiana.

Durante o governo de Getúlio Vargas, ganhou espaço a migração atentando ao aspecto da eugenia. Neste momento, ela enquanto análise de raças ganhou status de ciência. Para os dirigentes da época o migrante ideal era o branco.

A eugenia foi criada pelo inglês Francis Galtan no final do século XIX e desenvolvida especialmente nas grandes 
universidades norte-americanas na primeira metade do século XX. Em sua essência ela se propunha a melhorar a “qualidade das raças” físicas e mentais das futuras gerações.

O governo varguista seguiu a risca o processo eugênico e até indicava que o migrante ideal para o
processo de purificação da etnia/raça brasileira era o português. Este fazia mais “fusibilidade” com outras raças, o que não ocorria com alemães e italianos, considerados mais arredios ao cruzamento inter-raciais.

Em 1934, Vargas implantou a lei de cotas da imigração e durante todo o seu governo até a 
segunda guerra mundial, a migração para o Brasil diminuiu sensivelmente. Mas de forma interna houve uma migração com deslocamento de nordestinos para São Paulo e parte do Paraná, como também de muitos deles para o interior da Amazônia e norte de Mato Grosso, na batalha da borracha.

Mato Grosso sofreu migrações neste período citado causado pela “Marcha para o Oeste”, com a perspectiva de povoar espaços vazios, lembrando que a guerra trazia a possibilidade de invasão do nosso território por nações estrangeiras.

Da criação de Brasília na década de 60 até 1973, o Brasil sofreu um grande desenvolvimento e ficou bastante atrativo para estrangeiros. Percebam que a economia é o veículo condutor dos processos migratórios entre países, mas as políticas governamentais filtram e determinam o tipo de migrante desejado. 


A década de 80 e 90 do século XX houve um fluxo de migrantes que saíram e outros que entraram. Saíram muitos europeus e entraram africanos (angolanos egípcios e moçambicanos).

Agora em 2010/2014, mais de 30 mil haitianos estão chegando ao Brasil. Em 2014 é só euforia e cada vez mais chegam em grandes grupos. Em Cuiabá chega em média de 100 a 130 por mês, vão engrossar as fileiras do desemprego, bem como empregos considerados pesados e que não necessitam de mão de obra qualificada. Buscam eles um pedaço do sonho americano, e ao chegar já tentam entender a nossa língua e qualificação em Universidades, Senai e outros institutos qualificativos.

Como esta população se acomodará num futuro próximo? Tenho observado que quando você não tem uma estrutura de conforto e tranquilidade, o ser humano se torna mais ágil e consegue mudar sua vida social.

Diferente daquele que vive aqui e de certa forma se acomodou e se maldiz da vida na esperança de que algo caia do céu.

PEDRO FÉLIX é historiador em Cuiabá.



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