Assim como a língua é um símbolo importante de identidade e do sentimento comunitário, ela também pode ser utilizada como uma barreira em épocas de políticas imigratórias restritivas.
Embora não exista um teste de língua na Suíça para obter o direito de residência ou naturalização, a maioria dos solicitantes depara-se com alguma forma de exame para provar o domínio de idiomas nacionais para obtenção do passaporte suíço.
Tim McNamara, professor de linguística aplicada na Universidade de Melbourne e um especialista no setor, explica à swissinfo.ch como funcionam os testes de conhecimento de idiomas.
McNamara, cuja área de estudo está focalizada no contexto social e político desse tipo de testes integrados a processos de imigração e obtenção de nacionalidade, considera que as pessoas podem ter uma participação bem-sucedida na sociedade mesmo se elas não são fluentes nos idiomas nacionais.
O australiano esteve na Suíça para dar um workshop sobre o tema no Instituto de Multilinguismo em Friburgo.
swissinfo.ch: O senhor poderia dar um exemplo de como os testes de língua estão sendo utilizados atualmente nos procedimentos de imigração e obtenção de nacionalidade?
Tim McNamara: Um certo número de países na Europa nos últimos anos, parcialmente como reflexo das tensões que existem neles associadas às comunidades de imigrantes, começaram gradualmente a utilizar testes de língua nas diferentes etapas do processo de imigração.
Obviamente já existia em alguns países uma tradição de longa data de exigir o conhecimento de um idioma nacional para a naturalização. Porém essa prática aumentou, de modo que cada vez mais países estão seguindo o exemplo.
Testes de língua agora estão sendo utilizados também nas etapas iniciais. Recentemente, na Holanda e no Reino Unido, estrangeiros que queiram se casar com cidadãos desses países precisam passar uma prova de idiomas antes mesmo de sair dos seus países para obter um visto.
swissinfo.ch: Existe algum problema com a validade desses testes?
T.M.: Como parte do desenvolvimento profissional dos testes de idiomas, nós precisamos estar seguros de que as conclusões a que estaremos chegando sobre indivíduos tenham alguma base. É muito fácil, como sabemos, de chegar a uma conclusão sobre uma pessoa baseando-se em uma quantidade limitada de evidências e depois constatar que nos enganamos.
Assim a validação dos testes envolve um processo de obter mais informações sobre uma amostra de candidatos, por exemplo, para ver se as conclusões tiradas dos testes são confirmadas por outras formas de investigação e de evidência.
Penso que, com a imigração e a naturalização, existam outros fatores. Um dos aspectos de validade é saber quais valores sociais e culturais estão envolvidos na prática da avaliação.
Às vezes temos uma discussão intensa em um país sobre a presença de comunidades de imigrantes. E como parte dessa discussão pode-se recorrer a testes de linguagem, por razões que algumas vezes não são totalmente claras.
swissinfo.ch: Nesse contexto político, o senhor chegaria à conclusão que não é possível avaliar alguém de forma justa e objetiva e que essa avaliação será sempre influenciada por visões pessoais?
T.M.: Não, é possivel testar uma pessoa de forma justa e objetiva, mas tem de se questionar a relevância disso. Qual é o verdadeiro objetivo de aplicar testes? Isso foi estudado nos Estados Unidos, Luxemburgo e na Holanda. Parece-me que, quando os testes são do interesse dos imigrantes, está muito claro que o que está acontecendo é um debate na sociedade sobre símbolos de pertencer ou não e a língua é um símbolo que expressa bem isso.
Precisamos ser capazes de compreender o significado de testes de duas maneiras: uma como um instrumento prático para tomada de decisões sobre pessoas, e esses instrumentos práticos podem ser de boa ou baixa qualidade. Obviamente, eles precisam ser de tão boa qualidade quanto possível.
Por outro lado, o próprio uso do instrumento precisa ser considerado e pensado em todas suas necessidades. Nesse ponto não há resposta correta, pois estamos entrando no reino dos valores, de políticas e discussões políticas. Mas acho que é importante reconhecer que isso é o que está envolvido nos testes de idiomas. Não é apenas um instrumento técnico para a tomada de decisões sobre uma pessoa de uma forma científica, mas uma expressão de valores sociais, culturais e políticos e estes serão necessariamente contestados.
swissinfo.ch: Se vemos a sociedade como um clube onde pessoas de fora gostariam de entrar, seguramente é justo dizer, como o fez recentemente a ministra suíça da Justiça, que o conhecimento de um idioma nacional não seria exigência justa como prova de integração?
T.M.: Penso que existe uma diferença entre entrar em um clube e a participação no seu mais elevado nível através da nacionalidade. Estudos em países de imigração mostraram que a cidadania efetiva e bem-sucedida não depende necessariamente do domínio dos idiomas.
Em sociedades mais tradicionais, domina uma visão mais tradicionalista e isso é seguramente o caso em muitos países europeus. Eles estão enfrentando a questão da identidade própria como sociedades de imigração. O argumento relativo à competência no domínio dos idiomas nacionais em uma sociedade é válido, especialmente para a questão da obtenção da nacionalidade, mas para outras formas de participação social, sabemos que as pessoas podem fazê-lo mesmo se suas competências nos idiomas nacionais ainda são mínimas.
É muito fácil para os políticos apelar para a arma dos testes de idioma, mas mesmo se concordo com a força do argumento de inclusão dos conhecimentos linguísticos como um critério de aceitação na sociedade, penso que ser um bom cidadão é uma questão muito mais complexa do que isso.
Clare O'Dea, swissinfo.ch
Adaptação: Alexander Thoele
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