quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Cartagena+30: inovação e flexibilidade na proteção de refugiados, deslocados e apátridas na região

Refugiada colombiana faz compras em feira livre no interior de São Paulo (Brasil). Foto: ACNUR/ L.F.Godinho


Ministros dos governos de toda a América Latina e o Caribe, juntamente com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), se reuniram nesta terça-feira (2) para reafirmar a cooperação internacional e a solidariedade regional como respostas humanitárias efetivas aos refugiados, deslocados e apátridas na região.
O encontro de dois dias está ocorrendo em Brasília no Memorial JK, organizado pelo governo do Brasil e pelo ACNUR, para concluir o processo de comemorações do 30º aniversário da Declaração de Cartagena para Refugiados – melhor conhecido como Cartagena+30.

O evento conta com a participação dos ministros do Brasil José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luiz Alberto Figueiredo (Relações Exteriores), do secretário-geral do Conselho Norueguês para Refugiados, Jan Egeland, do Alto Comissário da ONU para Refugiados, António Guterres e da diretora do ACNUR para as Américas e o Caribe, Marta Juarez. Também estão presentes funcionários de todos os países da região, além de representantes de organismos internacionais, da sociedade civil e da academia.

O processo Cartagena+30 conduziu o mais amplo e inclusivo diálogo regional sobre questões humanitárias na América Latina e no Caribe desde 1984, quando a Declaração foi assinada e adotada.
 Participaram do processo mais de 30 governos, 150 organizações da sociedade civil e organismos internacionais relevantes, chegando a um consenso em torno de uma nova Declaração e Plano de Ação – que serão adotadas oficialmente na quarta-feira, dia 3, no encerramento da reunião.“Cartagena+30 adquiriu o status de uma marca humanitária internacional, que reflete a capacidade da América Latina e do Caribe de responder aos desafios humanitários com inovação e flexibilidade”, disse Guterres na cerimônia de abertura da reunião ministerial.

A América Latina abriu suas portas às pessoas que escapam da guerra e da perseguição, inclusive vindos de países distantes – como é o caso do congolês Charly Kongo, de 33 anos, refugiado que encontrou uma nova vida no Brasil em 2008. “Vi o massacre de crianças, mulheres e jovens, de muita gente. Pessoas deixaram meu vilarejo, fugindo da guerra e caminharam milhares de quilômetros para buscar segurança e proteção”, disse Charly, que também participou do evento em Brasília.

A bem sucedida integração local de Charly (que hoje vive e trabalha no Rio de Janeiro) é uma demonstração de como os sistemas de refúgio na região já atuam com altos padrões de proteção.Entretanto, Cartagena+30 é uma grande oportunidade para que os países da América Latina e do Caribe aprofundem ainda mais a qualidade do refúgio, reafirmando o princípio da não-devolução (ou non-refoulement), assegurando o acesso aos territórios e aos procedimentos de reconhecimento de refúgio por meio de um sistema justo e eficiente – além de expandir esses direitos aos solicitantes de refúgio em suas fronteiras ou onde estejam em busca de segurança para eles e para seus familiares também deslocados pela violência e pela perseguição.“Os países na América Latina e no Caribe participaram ativamente desta importante jornada que é o processo Cartagena+30, com uma motivação humanitária que permitiu a eles identificar os desafios de proteção para refugiados, deslocados e apátridas”, enfatizou Guterres.
Uma das novidades do processo Cartagena+30 é a ativa participação do Caribe. A solidariedade regional oferecida aos países da região irá ajudá-los a enfrentar os desafios de proteção relacionados aos complexos movimentos migratórios marítimos, encontra soluções duradouras para esta situação.
Em geral, assegurar a proteção a nível regional é um elemento chave para superar as dificuldades e especificidades da região em alcançar um balanço entre as legítimas preocupações de segurança dos países e as necessidades de proteção de refugiados e solicitantes de refúgio.
Outra novidade se refere ao compromisso dos países em erradicar a apatridia antes de 2014, assegurando o acesso de todas estas pessoas ao direito à nacionalidade. Desta forma, a América Latina e o Caribe se tornarão a primeira região, em todo o mundo, a assumir este compromisso.
Um exemplo da generosidade da América Latina é o caso de Ahmed Said, refugiado e apátrida que vive no Brasil há cinco anos. “O único documento verdadeiro que recebi em toda minha vida foi minha identidade de estrangeiro e refugiado no Brasil. Este documento me deu dignidade, liberdade de movimento e liberdade de opinião. Tenho minha vida de volta às minhas mãos. Antes, viajava e trabalha irregularmente, com documentos falsos. Eu não tinha uma identidade”, disse Ahmed, que agora está solicitando sua naturalização como brasileiro.

A cooperação regional é também necessária para responder às novas formas de violência causada pelos grupos ligados ao crime organizado transnacional no chamado Triângulo Norte da América Central, prevenindo o sofrimento dessas pessoas e também garantindo a proteção daqueles que são forçados a fugir de suas comunidades.

“A abertura da América Latina e do Caribe à migração, ao refúgio e à cooperação regional como tópicos que modulam suas sociedades no futuro é um exemplo único para o resto do mundo”, disse Guterres, reconhecendo que a região está à frente no papel de liderança para encontrar soluções duradouras às populações mais vulneráveis – incluindo solicitantes de refúgio, refugiados, deslocados internos e apátridas. Entre essas soluções, estão a integração local, a migração laboral e outros mecanismos que oferecem oportunidades para todos.


Acnur

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