sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Lei da imigração obriga a novo recuo de Cameron face aos radicais do seu partido


Primeiro-ministro disse "simpatizar" com uma proposta da ala direita dos conservadores que o seu Governo disse ser ilegal e que acabou chumbada pelos votos da oposição e dos parceiros de coligação.
A 15 meses das legislativas, a ala mais à direita do Partido Conservador está apostada em não dar descanso ao primeiro-ministro britânico. Para evitar que a aprovação da nova lei de imigração ficasse marcada por uma nova rebelião na sua bancada, David Cameron disse concordar com uma proposta para agilizar a deportação de estrangeiros condenados no Reino Unido, mesmo admitindo que a iniciativa violava a Convenção Europeia dos Direitos Humanos. O projecto só não avançou porque os liberais-democratas, parceiros na coligação de governo, e os trabalhistas se uniram contra a iniciativa.
A rebelião ensombrou a aprovação de uma lei com a qual o Governo queria enviar aos eleitores uma mensagem de firmeza – a imigração está entre as principais preocupações dos eleitores britânicos, num terreno que se tem provado fértil para os populistas do Partido da Independência (UKIP), ameaçando as hipóteses de reeleição de Cameron em 2015. Entre outras alterações, a lei obriga os senhorios a verificar a documentação dos imigrantes antes de lhes arrendar a casa, endurece as penas para quem contrate mão-de-obra ilegal, obriga os residentes temporários, incluindo estudantes estrangeiros, a pagar uma caução anual de 200 libras para ter acesso ao serviço nacional de saúde e prevê que os estrangeiros condenados por crimes possam ser deportados antes de esgotarem todos os recursos.
Mas para a ala mais radical da bancada conservadora, era preciso ir mais longe. Depois de uma tentativa infrutífera para introduzir no debate o prolongamento das restrições aos trabalhadores romenos e búlgaros (que expiraram no início deste ano em todos os países da UE que tinham recorrido a esse dispositivo), uma centena de deputados assinou uma proposta para impedir que os estrangeiros condenados a penas superiores a um ano possam invocar o direito a permanecer junto da família para evitarem a deportação.
Segundo dados do Ministério do Interior, dos mais de 200 estrangeiros que todos os anos recorrem aos tribunais para travar ordens de expulsão, 90% apoiam-se no “direito à vida privada e familiar”, previsto no artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos. Citando casos em que  “perigosos criminosos” usaram o argumento para evitar a deportação, o deputado Dominic Raab, autor da proposta, defendeu que só o risco tortura no país de origem ou “prejuízo grave para os filhos” dos condenados poderia ser invocado para evitar a deportação.
No Parlamento, a ministra do Interior, Theresa May, disse que a medida não só seria ilegal à luz da Convenção – de que o Reino Unido é subscritor, apesar dos sucessivos repúdios da ala eurocéptica – como poderia acabar por dificultar as deportações. Pouco depois, contudo, Downing Street emitia um comunicado, garantindo que Cameron tinha uma “imensa simpatia” pelos planos e deu instruções para ninguém travar a proposta.
Uma concessão que de pouco lhe valeu – 85 tories votaram a favor da proposta, os parceiros de coligação repudiaram a cedência e foi salvo do embaraço pelos votos da oposição trabalhista. Mas com os avanços e recuos, escreveu o jornal Telegraph, Cameron pôs de novo em causa “a sua autoridade sobre o partido e o Governo”, já muito abalada pelas sucessivas cedências aos eurocépticos. "Na melhor das hipóteses demos uma imagem de caos", confessou à BBC um dirigente do partido.
O que acabou por ser aprovado foi a alteração de última hora apresentada por May para tentar calar a rebelião e que prevê a retirada da cidadania britânica a quem representar uma “ameaça para a segurança nacional”, mesmo que isso transforme o visado em apátrida. Vários suspeitos de terrorismo perderam já o passaporte britânico, mas até agora a lei impedia que a medida fosse aplicada a quem não tem outra nacionalidade. “Os suspeitos de terrorismo têm de ser ser acusados e julgados. Primeiro os políticos quiseram evitar julgar os estrangeiros, agora querem fazer o mesmo com os cidadãos nacionais”, reagiu Shami Chakrabarti, director da organização de direitos humanos Liberty.

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