quarta-feira, 14 de agosto de 2013

O problema da integração na Suecia


Para Nazanin Johansson, nunca houve problema. Evidentemente, repara-se nela por causa dos seus cabelos escuros, dos olhos castanhos e dos seus traços persas. E ela sabe que, mais do que qualquer outra pessoa, tem de dar o seu melhor. Apesar disso, para ela, a Suécia é um país que vale a pena. Onde, por exemplo e tal como ela, alguém se pode tornar uma dinâmica mediadora de um centro de emprego num bairro difícil.
Mas é preciso muita vontade. No entanto, quando Nazanin fala com os jovens, por vezes, tem dúvidas. “Eles querem um bom emprego, mas só se for uma coisa gira. E não querem começar de baixo. Por vezes, esquecemo-nos que a mentalidade de um grande número de jovens é um fator importante.”
Durante uma semana, houve carros incendiados e confrontos com a polícia.
Nazanin trabalha no centro de emprego de Kista, um subúrbio de Estocolmo, que também é o centro tecnológico da capital sueca. Mas Kista também fica situado entre Rinkeby, Husby e Tensta, os bairros onde rebentaram os motins desencadeados por jovens e que fizeram as primeiras páginas dos jornais, em maio passado. Durante uma semana, houve carros incendiados e confrontos com a polícia.
As imagens que vinham da Suécia deram a volta ao mundo. Um sentimento de raiva num país onde o governo toma conta das pessoas desde o primeiro grito até ao seu último suspiro? Racismo e segregação no país mais igualitário do mundo?
As desigualdades aumentaram
Rapidamente se tornou evidente que era verdade. Enquanto o mundo estava distraído, o modelo sueco era posto em causa. Depois de uma bolha económica durante a década de 1990, a coligação de centro-direita, liderada por Fredrik Reinfeldt, em 2006, cortou as despesas públicas, ao mesmo tempo que baixava a taxa máxima de imposto.
A Suécia continua a ser uma sociedade igualitária, mas as desigualdades aumentaram mais do que em qualquer outro país da Europa. Tal como no resto da Europa, os imigrantes, os trabalhadores pouco qualificados e os jovens – sobretudo os rapazes -, são os mais desfavorecidos. E tal como no resto da Europa, há muitos arruaceiros em todas essas categorias.
A Suécia concede, todos os anos, cada vez mais vistos de residência, ao contrário de muitos países da Europa, onde esse número baixou. Os 110 mil vistos concedidos em 2012 foram um recorde. Entre os refugiados há agora, sobretudo, sírios, somalis, iraquianos e ciganos.
Sair dos subúrbios, contudo, é agora muito mais difícil para eles do que foi para quem chegou anteriormente. Há menos empregos, a sociedade tornou-se mais complexa, a fasquia está muito mais alta. “Gostava de ser vigilante mas, para isso, preciso de ter carta de condução” explica, por exemplo, Sameh Sakr, um egípcio de 22 anos que mora no bairro de Hallunda. “Uma carta de condução”, ironiza. “Mas onde vou arranjar dinheiro para a pagar?”
Rumo às comunidades fechadas
Na Suécia, a segregação é enorme. Em Estocolmo, a maior parte dos imigrantes vive em cidades-jardins que se estendem ao longo da linha de metro azul, que recebeu a alcunha de Expresso do Oriente. São prédios de betão de três a sete andares, construídos nos anos 1960 e 1970.
Em alguns bairros, 80% das pessoas que ali vivem são imigrantes de primeira ou de segunda geração
Em alguns bairros, 80% das pessoas que ali vivem são imigrantes de primeira ou de segunda geração e 50% estão desempregadas, contra os 8% de taxa global de desemprego da Suécia. Um imigrante em cada quatro não acabou a escolaridade. E se 3% das crianças suecas são pobres, essa taxa sobe para os 40% entre as crianças filhas de imigrantes.
Em termos de habitação, existe separação entre ricos e pobres em todas as cidades da Europa. Mas, em Estocolmo, há ilhas e vastas zonas verdes entre os bairros, o que faz com que as classes prósperas se tornem quase automaticamente gated communities, comunidades fechadas. O bairro de Nockeby está cheio de moradias completamente equipadas com sistemas de alarme. Em contrapartida, perto da estação de metro de Rinkeby, há homens deitados nos bancos da rua. Há, também, um café turco e um bazar somali, mas não há uma caixa Multibanco.
Como é possível que a igualitária Suécia tenha deixado crescer a este ponto as suas estatísticas alarmantes e as suas ilhas de descontentamento? Não é porque os poderes públicos não se interessam pelo assunto. Pelo contrário, o Ministério da Integração e do Emprego quer criar empregos “trampolim” subsidiados e diversificar os cursos de sueco, para que um engenheiro iraquiano não tenha de frequentar as aulas do mesmo nível que um somali que mal sabe ler.
Falar Rinkeby-Svenska, um obstáculo
O ministro da Integração, Erik Ullenhag, defende que não há razão para implantar uma política mais restritiva em matéria de refugiados, como deseja o partido xenófobo dos Democratas Suecos. “Entendemos que se trata de um problema económico e de um problema dos jovens e não de um problema de imigração. Quando endurecemos o tom em relação aos imigrantes estamos, enquanto país, a atentar contra a sua dignidade. Prejudicamos ainda mais a posição de quem já é prejudicado. Além disso, a Suécia precisa de imigrantes.”
Tobias Hübinette, investigador especializado em questões de imigração no Centro Multicultural no subúrbio meridional de Botkyrka, diz que, na realidade, os imigrantes precisam duma enorme vontade, de muita perseverança e de sorte para ultrapassarem o fosso dos salários, da educação e também da diferença étnica.
Frequentemente não são considerados suecos, mesmo que já tenham nascido na Suécia
Frequentemente não são considerados suecos, mesmo que já tenham nascido na Suécia. Por exemplo, quem fala Rinkeby-Svenska, o sueco com sotaque, não tem a menor possibilidade de arranjar um emprego.
Um debate multicultural atrasado
Ullenhag tem a solução: um novo “nós” para a Europa. “Não gosto do facto de, na Europa, o “nós” se referir sempre ao passado. Nos Estados Unidos todas as pessoas que moram em território americano são americanas. Ali, o “nós” está virado para o futuro. É preciso que também seja assim na Europa.”
“Seria tudo muito diferente se começássemos por reconhecer que já não somos o país homogéneo onde toda a gente é igual”, diz o escritor e jornalista Viggo Cavling.
Mas é precisamente isso que a Suécia tem dificuldade em reconhecer, segundo o investigador em imigração Hübinette. “Atualmente, há 19 % de suecos com um ou até mesmo os dois dos seus progenitores de origem estrangeira. Mas ainda não temos consciência disso. É preciso não esquecer que a Suécia nunca teve colónias. É sobretudo por isso que a Suécia é um país nacionalista. Os suecos não gostam apenas de fazer bem, também nos achamos muito bons. Acolhemos voluntariamente os refugiados mas temos dificuldade em reconhecer que os deixamos à mercê de situações inadmissíveis. Temos duas décadas de atraso no debate multicultural.”

 Presseurop

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