O ativista pelos direitos dos imigrantes
russo Pavel Kovalenko pode ser condenado a até cinco anos de prisão por ter
tentado registrar pelo menos 4,5 mil estrangeiros no escritório de sua
associação.
Em um momento no qual a
Rússia está sob os holofotes por causa do pedido de asilo político feito pelo
ex-consultor da CIA Edward Snowden, o caso de Kovalenko joga luz sobre a
questão de imigração.
Na Rússia, todos os
estrangeiros, inclusive turistas, devem fazer o registro domiciliar no prazo de
sete dias após a entrada no país. Em grandes hoteis, o registro é feito pela
administração do estabelecimento. Em hotéis menores e albergues da juventude,
costuma-se cobrar aproximadamente 1 mil rublos (R$ 72) pelo registro.
Para os imigrantes que
trabalham na Rússia, conseguir este registro pode significar uma odisseia de
súplicas e subornos. Como a maioria dos proprietários se recusa a registrar
seus inquilinos estrangeiros, a opção de muitos imigrantes é pagar para que
agências forjem um endereço e emitam um documento idêntico ao oficial, o que já
é suficiente para driblar os rotineiros controles policiais nas ruas de Moscou.
No metrô e na Internet,
inúmeras agências oferecem o “serviço de registro” por valores que começam em 5
mil rublos (R$ 360). Após o atentado terrorista no metrô de Moscou em 2010,
muitas destas agências foram fechadas, mas não demorou muito para que
reabrissem.
Segundo a porta-voz da
Polícia da região sudoeste de Moscou, Yulia Anosova, o crime do ativista Pavel
Kovalenko foi ter solicitado o registro de milhares de imigrantes no mesmo local.
Kovalenko declarou ao site russo Yopolis.ru que pelo menos 60 mil imigrantes já
estão registrados nos escritórios da organização na capital russa.
O ativista disse que o
grupo tem como objetivo registrar os imigrantes gratuitamente para que eles
consigam encontrar trabalho. Muitos empregadores só contratam pessoas
registradas na cidade, o que faz do documento ainda mais importante para
qualquer estrangeiro no país.
Medida eleitoreira
O maior controle dos
imigrantes em Moscou é apontado pela oposição como uma medida eleitoreira. Com
o aumento do sentimento nacionalista na Rússia e, consequentemente,
anti-estrangeiro, as televisões estatais do país exibiram com tom de heroísmo
as recentes cruzadas anti-“ilegais”.
O prefeito de Moscou,
Sergei Sobyanin, se apressou em responder às críticas: “Isso é absolutamente
normal. Em qualquer sociedade, em qualquer país, se há uma situação de
emergência, o governo e a sociedade começam a agir com mais rigor”. Sobyanin é
candidato à reeleição para a prefeitura de Moscou nas eleições do próximo dia 8
de setembro.
Em entrevista a Opera
Mundi, Georgy Satarov , presidente da proeminente ONG russa INEM,
que trabalha com direitos humanos e democracia, també vê o maior controle de
imigrantes em Moscou como uma medida populista. “Por trás de um imigrante
ilegal, há um governo e uma empresa local coniventes com a exploração e a
ilegalidade”, falou. “O governo russo faz vista grossa à imigração
não-qualificada que vem da Ásia Central. Quando estes controles de imigrantes
aparecem na televisão, soa vergonhoso, hipócrita, mas a maioria dos russos
compra esta história”, sublinhou.
Em pesquisa divulgada em
junho pelo VTsIOM ( sigla em russo para Centro de Estudos da Opinião Pública da
Rússia), 35% dos russos colocam a entrada de imigrantes como a principal ameaça
do país, antes de problemas como corrupção, qualidade de vida ou terrorismo.
“Eles nos contratam por
um salário que é três vezes inferior ao que seria cobrado por um moscovita.
Trabalhamos dia e noite sem descanso e ainda temos que aguentar a cara de nojo
dos russos na rua”, desabafa Yusuf, que nasceu no Tajiquistão, país da Ásia
Central que fazia parte da extinta União Soviética, e se mudou para Moscou há
quatro anos. “E agora querem nos expulsar porque não temos todos os documentos.
Pergunte a qualquer norte-americano em Moscou se ele tem este registro”,
sugere.
Crise demográfica
Segundo Konstantin
Romodanovsky, chefe do Serviço Federal de Migração da Rússia, o país precisa de
pelo menos 300 mil trabalhadores estrangeiros por ano para atender às demandas
econômicas. “Eles devem vir e se naturalizar. O Kremlin ordenou que se mantenha
este nível de migração anual e destacou que este número deve incluir russos
étnicos que moram no exterior, especialistas estrangeiros com alta qualificação
e jovens promissores”, declarou Romodanovsky em março deste ano. Estima-se que
a população russa vá diminuir de 143 milhões para 139,3 milhões até 2030.
O relatório “Panorama
Internacional da Imigração”, publicado em 2010 pela OCDE (Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico) diz que a Rússia é o país com o maior
número de imigrantes sem autorização de residência, representando cerca de 7%
da população ativa do país. O idioma é apontado como uma barreira para a
integração. O Centro de Estudos Migratórios de Moscou diz que apenas 50% dos
trabalhadores migrantes têm um nível de alfabetização em russo considerado
suficiente para preencher documentos oficiais e 20% não têm nenhum domínio do
idioma.
UOL
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