quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Razões pelas quais a Europa precisa de uma estratégia de migração internacional, segundo Kofi A. Annan


Um dos maiores testes a uma União Europeia alargada, nos próximos anos e décadas, será a maneira como gere o desafio da imigração. Se as sociedades europeias estiverem à altura do desafio, a migração internacional será um fator de enriquecimento e irá fortalecê-las. Se o não conseguirem, isso pode ter como consequência uma queda do nível de vida e a divisão social.
Não há a menor dúvida de que as sociedades europeias precisam de migrantes internacionais. Nos nossos dias, os europeus vivem mais anos e têm menos filhos. Sem a migração, a população dos Estados-membros da UE diminuirá, passando de cerca dos atuais 450 milhões para menos de 400 milhões, em 2050.
Isto não se passa apenas na UE. O Japão, a Federação Russa e a Coréia do Sul, entre outros, podem vir a conhecer um futuro semelhante – situações em que haverá cargos que ficarão por ocupar e serviços que não poderão ser prestados, à medida que se dá uma contração das suas economias e as sociedades estagnam. A migração internacional só por si não resolverá estes problemas, mas é uma parte essencial da solução.
Podemos estar certos de que as pessoas de outros continentes continuarão a querer vir viver na Europa. No mundo tão desigual de hoje, há um número elevado de asiáticos e africanos que carecem das oportunidades de melhorar a sua situação que a maioria dos europeus considera um dado adquirido. Não deve, pois, surpreender-nos que muitos deles vejam na Europa uma terra de oportunidades, onde anseiam começar uma nova vida, do mesmo modo que as potencialidades do novo mundo atraíram, em tempos, dezenas de milhão de europeus empobrecidos, mas empreendedores.
Todos os países têm o direito de aceitar ou não migrantes voluntários (ao contrário do que se passa com os refugiados de boa fé, que gozam do direito à proteção consagrado no direito internacional). Mas não seria sensato da parte dos europeus fechar-lhes as portas. Isso não só prejudicaria as suas perspectivas econômicas e sociais a longo prazo, como levaria cada vez mais pessoas a tentarem recorrer a estratégias para entrar nos seus países, quer pedindo asilo político (sobrecarregando, assim, um sistema que visa proteger os refugiados que fugiram dos seus países com medo de serem perseguidos) quer procurando obter a ajuda de contrabandistas, arriscando-se a morrer ou a ficarem feridas por, num ato de desespero, utilizarem o transporte clandestino em barcos, caminhões, trens ou aviões.
A migração ilegal é um problema real e os Estados têm de cooperar no âmbito dos esforços para lhe pôr termo, especialmente reprimindo os contrabandistas e traficantes, cujas redes de crime organizado exploram os vulneráveis e subvertem o primado do Direito Internacional. Mas o combate à migração ilegal deveria fazer parte de uma estratégia mais ampla. Os países deveriam proporcionar mecanismos reais para a migração legal e tentar aproveitar os benefícios que ela traz, salvaguardando, ao mesmo tempo, os direitos humanos dos migrantes.
Os países pobres também podem beneficiar com a migração. Em 2002, os migrantes enviaram aos países em desenvolvimento remessas no valor de pelo menos 88 mil milhões de dólares, ou seja, 54% mais do que a ajuda pública ao desenvolvimento (57 mil milhões de dólares) que estes países receberam, no mesmo período.
A migração é, portanto, uma questão que todos os países têm interesse em resolver bem e que exige uma maior cooperação a nível internacional. A Comissão Mundial sobre as Migrações Internacionais pode ajudar a estabelecer normas internacionais e a definir melhores políticas, tendo em vista gerir as migrações no interesse de todos. Estou confiante em que terá boas ideias para apresentar e espero que possa contar com o apoio tanto dos países que “enviam” migrantes como daqueles que os acolhem.
Gerir o fenômeno migratório não implica apenas abrir as suas portas e colaborar no plano internacional. Também exige que cada país desenvolva mais esforços para integrar os recém-chegados. Os migrantes internacionais devem adaptar-se às novas sociedades que os recebem e estas têm igualmente de se adaptar. Só graças a uma estratégia criativa de integração dos migrantes os países podem assegurar que estes enriqueçam a sociedade de acolhimento, em vez de trazerem instabilidade.
Ainda que cada país aborde esta questão de acordo com o seu próprio caráter e cultura, nenhum deveria esquecer a enorme contribuição que milhões de migrantes já deram para as sociedades europeias modernas. Muitos vieram a ocupar lugares de destaque em governos, na ciência, nas universidades, nos esportes e nas artes. Outros são menos famosos, mas desempenham um papel igualmente crucial. Sem eles, muitos sistemas de saúde lutariam com falta de pessoal, muitos pais não teriam, em casa, a ajuda de que precisam para se dedicar a uma carreira, e muitos lugares na área da prestação de serviços ficariam por preencher. Os migrantes fazem parte da solução, não do problema.
Todos os que estão empenhados no futuro da Europa e na dignidade humana, devem, por isso, tomar uma posição clara contra a tendência para fazer dos migrantes internacionais os bodes expiatórios dos problemas sociais. Eles não querem viver à custa dos outros. Querem uma oportunidade justa para eles próprios e para as suas famílias. Não são criminosos nem terroristas. São pessoas respeitadoras da lei. Não querem viver isolados do resto da comunidade. Querem integrar-se, mantendo, simultaneamente, a sua identidade própria.
Neste século XXI, os migrantes precisam da Europa, mas a Europa também precisa deles. Uma Europa fechada seria mais egoísta, mais pobre, mais fraca e mais velha. Uma Europa aberta será uma Europa mais justa, mais rica, mais forte e mais jovem, desde que saiba gerir bem as migrações.
Fonte: UNRIC

Nenhum comentário:

Postar um comentário