terça-feira, 23 de julho de 2013

Pela democracia, mais imigração na Europa!

O poderoso gesto do Papa Francisco em Lampedusa permitiu atrair as atenções do mundo sobre a imoralidade que constituem as perseguições e a morte de imigrantes que tentam entrar na Europa. Permite, igualmente, fazer luz sobre um impressionante paradoxo: ao mesmo tempo que a Europa precisa de mais imigração, os discursos públicos dominantes sobre imigração estão impregnados de desconfiança e medo.
Com efeito, tendo em conta a evolução demográfica no continente depois da Segunda Guerra Mundial, nomeadamente a crónica descida das taxas de natalidade e uma cada vez maior esperança de vida, a Europa precisa do contributo externo da imigração para não se ver condenada a assistir perpetuamente à redução dos direitos sociais, ao aumento da idade da reforma, à diminuição do montante das pensões…
No entanto, as políticas migratórias levadas a cabo na Europa nestas últimas décadas estão marcadas pelo ferrete da desconfiança. Desconfiança que, partilhada pelo conjunto dos Estados europeus, seja qual for a cor política dos dirigentes no poder, tem como consequência o carácter extremamente restritivo das suas políticas.
A criação da agência europeia Frontex, cuja principal missão é interceptar imigrantes nas fronteiras da UE, é disso exemplo. Caracterizada pela violência das suas intervenções, a Frontex tornou-se um símbolo da “Europa-fortaleza”, um continente fechado sobre si próprio, insensível à esperança daqueles que arriscam a vida durante longos meses de perigosos périplos para construírem um futuro no nosso continente. No ano passado, foi no meio de uma grande indiferença que cerca de 500 pessoas vindas de África morreram na tentativa de chegarem a Lampedusa, enquanto milhares de refugiados estavam enclausurados em centros de detenção ou em lúgubres prisões.
Os acordos “Dublin II” são outro exemplo. Permitem em particular aos Estados-membros reenviar os migrantes em situação irregular para o país que lhe serviu de porta de entrada na União Europeia. É assim que muitos refugiados se encontram na Grécia, principal ponto de entrada de migrantes na Europa juntamente com a costa do Sul de Itália, o que levou à criação de uma situação ingerível, instrumentalizada pelos neonazis gregos para assegurarem uma base social e eleitoral de apoio, perseguindo e matando imigrantes com total impunidade.
Posição política culturalmente dominante hoje na Europa, a desconfiança face à imigração não é fruto do acaso. É uma vitória ideológica da extrema-direita, resultante de um combate encarniçado ao longo de mais de 30 anos.
Conscientes de que a expressão pública do seu anti-semitismo e do seu racismo lhes barraria irremediavelmente o acesso ao poder, numerosos partidos de extrema-direita têm usado a estigmatização dos imigrantes como discurso social estruturante e puderam, desse modo, impor gradualmente os seus pontos de vista.
As consequências desta vitória ideológica da extrema-direita são extremamente dolorosas: menos direitos sociais para todos e mais violência e assassinatos racistas, como na Grécia. Do mesmo modo, a complementaridade dos diferentes movimentos e partidos europeus de extrema-direita surge com clareza. Aqueles que, por vezes às portas do poder, se declaram “normalizados”, asseguram a sua vitória ideológica e preparam o terreno para actos violentos daqueles que nunca tencionaram abandonar a sua ideologia profundamente baseada no ódio.
No entanto, se falta imigração na Europa não é só para assegurar direitos sociais dignos, é também e sobretudo uma necessidade para a democracia e para os Direitos Humanos.
Em primeiro lugar, acolher imigrantes permitirá aumentar o número de beneficiários de direitos garantidos na Europa. Na condição de não pilhar as elites dos países mais pobres, um número cada vez maior de pessoas poderá usufruir dos valores democráticos.
Em segundo lugar, a Europa é vista no mundo como um dos principais espaços de invenção e regeneração da democracia. Logo, o futuro da Europa e da democracia estão fortemente ligados. Estimular a migração para a Europa permitir-lhe-á beneficiar de um mercado maior, de uma inovação plena de vitalidade, de uma economia mais aberta ao mundo e mais dinâmica, além de concorrer com novas potências mundiais de regimes autoritários. Os países emergentes serão então, mais do que hoje, tentados pela democracia, que progredirá no mundo enquanto continuar a representar um modelo de desenvolvimento eficaz.
Para que a Europa possa enfrentar o desafio da imigração, que é o mesmo que dizer o do seu futuro, uma vitória cultural é necessária: substituir a desconfiança face à imigração pelo desejo de alteridade.
Isto significa, nomeadamente, o fim da indiferença quanto à instalação dos refugiados, frequentemente vindos de antigas colónias europeias africanas e asiáticas, em centros de retenção e em condições desumanas. Significa igualmente um combate renhido pela igualdade, para libertar o nosso continente do racismo e do anti-semitismo. Numa palavra, significa colocar os valores fundamentais da UE e da promoção da democracia no coração de um projecto europeu partilhado, e não deixar que o dogma da austeridade seja a bússola dominante das instituições e dos Governos da Europa.
É o futuro do nosso continente e também da democracia que está em jogo.

Benjamin Abtan
Presidente do Movimento Popular Anti-racista Europeu EGAM

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