segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Migração no Brasil: uma nova questão social


O fenômeno migratório está intrinsecamente relacionado ao processo de globalização, o qual ao aproximar e intensificar as relações entre os países faz com que as migrações sejam cada vez mais dinâmicas e interdependentes das condições sociais, econômicas, políticas e ambientais do cenário internacional. Nesse sentido, é inegável a relação existente entre os acontecimentos internacionais e as configurações dos fluxos migratórios.

Ademais aos fatores políticos e ambientais, desde o ano de 2008 a principal instabilidade no cenário internacional é a crise econômica que atingiu os três principais polos de desenvolvimento mundial – Estados Unidos, Europa e Japão. A partir deste período, tais países, até então tradicionais lugares de atração de imigrantes, em alguns casos, passaram a acompanhar a saída de seus cidadãos em busca de melhores condições de vida.


Esta realidade pode ser percebida no fluxo oriundo da Espanha em direção aos países latino-americanos e o de portugueses para o Brasil e Angola, suas antigas colônias. Além disso, evidenciam-se as migrações de retorno que também são motivadas pela crise econômica, uma vez que a falta de emprego e outras situações adversas tem feito com que muitos imigrantes indianos, venezuelanos e brasileiros decidam retornar aos seus países de origem, por exemplo.

Há de se evidenciar o aumento dos movimentos migratórios de curta-distância. No caso da União Europeia, esta tendência se verifica em decorrência do acordo de livre-circulação de trabalhadores no interior do bloco, aspecto no qual a Alemanha ganha um destaque enquanto país de destino. Neste contexto encontram-se também os equatorianos que ao saírem da Espanha buscam uma nova experiência migratória em outros países europeus, como o Reino Unido ou Itália. Por fim, tal aspecto também fica evidente em países como a Argentina e Chile, onde os imigrantes latino-americanos vão buscar melhores oportunidades.

A realidade brasileira ganha destaque nesta Resenha, pois o país vem sendo considerado a "bola da vez” no que se refere à atração e recepção de imigrantes. A análise histórica das migrações internacionais no país, até então, era estudada a partir de dois períodos: o primeiro no século XIX, marcado por uma fase de recepção de imigrantes europeus, africanos, orientais entre outros; e o segundo, ao final do século XX (nas décadas de 80 e 90) onde os brasileiros passaram a emigrar em direção aos Estados Unidos, Canadá, Europa e Japão, predominantemente por motivações econômicas. É possível afirmar que o país vive hoje um novo momento. O mais recente levantamento do Ministério da Justiça mostra que a quantidade de estrangeiros vivendo no Brasil - trabalhando, estudando ou simplesmente acompanhando seus cônjuges - superou, pela primeira vez em 20 anos, o número de brasileiros que deixam o país para viver no exterior pelos mesmos motivos.

O cenário migratório do Brasil pode ser entendido como uma nova questão social, uma vez que compreende a exportação de emigrantes brasileiros, em paralelo com a entrada de imigrantes no país. Neste contexto a crise financeira, o estancamento do processo de desenvolvimento, o excedente de mão de obra, a pobreza, a ausência de perspectiva de mobilidade social, entre outras causas, seriam os principais determinantes (Patarra, 2005).

O crescimento da economia brasileira, aliado às crises internacionais, transformou o país em um polo de atração para trabalhadores migrantes. Somado a isso está a formação do imaginário de um Brasil próspero e acolhedor, onde é possível crescer e ganhar dinheiro, como assinalam Sidnei Silva e Duval Magalhães em um dos artigos desta resenha. É preciso lembrar que, ao mesmo tempo, que o Brasil vem trabalhando com uma política de tolerância e fraternidade para com os estrangeiros que vivem no país, como no caso dos haitianos, por outro lado, existem tentativas de contenção deste fluxo limitando a quantidade de vistos emitidos por mês.

A nova configuração das migrações internacionais traz para a comunidade internacional um questionamento: sob qual perspectiva as migrações são entendidas? Os migrantes seriam um problema ou uma possibilidade de enriquecimento sociocultural? É nesse sentido que a diversificação dos fluxos migratórios impõe um desafio às políticas migratórias de cada país, haja vista que muitos não têm uma política adequada para lidar com o tema, ou quando têm, não necessariamente teriam como foco o respeito à dignidade do migrante enquanto pessoa humana. No caso brasileiro este desafio é ainda maior, pois o país tem um instrumento legal defasado historicamente no que se refere à política de migração, o qual contrasta com atual perspectiva ideológica e de atuação prática do Conselho Nacional de Imigração – CNIg/MTE.

Por fim, fazem-se necessárias políticas públicas que atendam aos interesses dos países, mas que, acima de tudo, reconheçam os migrantes, não somente como trabalhadores, mas como indivíduos que precisam ter sua dignidade respeitada e seus direitos garantidos.

Por Tuíla Botega Cruz
Centro Scalabriniano de Estudos Migratórios – CSEM

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