No primeiro trabalho fora de Portugal do modelo e empresário Walter de Carvalho, este viu-se envolvido numa situação complicada. À chegada ao aeroporto de Las Palmas, em Espanha, foi levado por dois seguranças que lhe perguntaram pela droga. O mal-entendido foi desfeito, mas na altura ficou na dúvida se o teriam abordado por ser negro. «Se aceitasse isso não tinha seguido com a minha vida. Comecei a perceber que essa barreira era em grande parte culpa minha», contou.
Esta foi parte de uma das cinco histórias contadas na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, numa palestra a propósito da comemoração do Dia Internacional de Luta pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, que decorreu esta quarta-feira.
O presidente do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, Joaquim Evangelista, juntou-se ao antigo kickboxer José Reis (luso-cabo-verdiano), à atriz e apresentadora Cláudia Semedo (luso-guineense), a Walter de Carvalho (luso-angolano), ao coreógrafo Marco de Camillis (italiano) e à atriz Natasha Marjanovic (nascida na ex-Jugoslávia), que contaram as suas histórias relacionadas com a discriminação. A mesa redonda foi conduzida pela alta-comissária para a Imigração e Diálogo Intercultural Rosário Farmhouse, também ela de ascendência britânica.
Joaquim Evangelista tem sido um dos promotores da luta contra o racismo usando «a magia do futebol». «Alguns jogadores dizem-me ‘porque é que o Figo e o Rui Costa não fazem as campanhas do racismo?’. Respondia-lhes que todos temos o nosso papel, desde o mais pequeno ao mais reconhecido», disse.
Para o presidente do sindicato, esta data serve para relembrar algo que deve ser combatido todos os dias.
Superar barreira da cor
«Só tive noção da minha cor aos seis anos. Ao ir com o meu pai meter o totoloto, ouvi um senhor virar-se para a filha que estava a fazer birra:
«Se não te portas bem chamo o senhor preto que te mete num saco. Perguntei ao meu pai porque tinha ele dito aquilo e ele respondeu-me que era gente sem consciência», explicou Cláudia Semedo. Segundo a atriz, os seus pais sempre lhe ensinaram que a cor não é limite para nada, e «a cor vai sendo cada vez menos diferente à medida que o mundo se mistura».
José Reis também teve de lutar bastante para chegar onde chegou. Cresceu numa barraca, sem luz nem água, mas não desistiu de estudar. Tirou a licenciatura em Direito e, na vertente desportiva, chegou a campeão da Europa e Intercontinental na modalidade. Dedica-se atualmente a reeducar jovens em centros de reintegração onde fala do caminho que trilhou e de como superou as dificuldades.
Walter de Carvalho vivia numa barraca e tinha de ir buscar água todos os dias. Deixou a escola cedo e o mundo da moda veio raptá-lo de uma vida a «assentar tijolo». «Aos 15 anos achava que a polícia é que queria arranjar problemas comigo», conta o empresário da moda que atualmente fala com os mais novos para perceberem que a barreira, por vezes, «é criada por nós próprios».
Bruno Abreu
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