Muitos
estrangeiros detidos que aguardam expulsão administrativa de Portugal não
conseguem ter, “em tempo útil”, acesso a um advogado que os ajude a contestar a
decisão, refere o jurista do Serviço Jesuíta aos Refugiados, João Lima, com
base na experiência de um centro do Porto onde são detidas pessoas que aguardam
"afastamento coercivo" do país. Desde 2012 passou a poder ser expulso
de Portugal mesmo quem cá tenha nascido, quem aqui viva desde idade inferior a
dez anos ou quem cá tenha filhos menores, desde que ponha em causa “a segurança
nacional ou a ordem pública.”
Está
previsto que a resposta ao pedido de apoio judiciário – nomeação de um
advogado pelo Estado quando a pessoa não tem meios económicos para pagar a um – leve
30 dias, explica o jurista. Mas as respostas da Segurança Social chegam a
demorar 60, diz. “Demoram muito tempo e às vezes não chegam”, nota o jurista.
Muitas pessoas são, entretanto, expulsas do país.
O
Serviço Jesuíta aos Refugiados começou, no início do ano passado, a fazer “um
diagnóstico à legalidade dos afastamentos coercivos e às condições das
detenções” na chamada Unidade Habitacional de Santo António, centro de detenção
do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) onde esta instituição presta
apoio. Ainda não tem resultados. Também existem centros de detenção nos
aeroportos internacionais de Lisboa, Porto e Faro. Pode ser expulso do país o
estrangeiro que se encontre em situação irregular ou que tenha cometido crimes.
O
Serviço Jesuíta de Refugiados já tinha alertado para o problema das falhas no
apoio jurídico num parecer enviado ao anterior Governo, a propósito da
alteração da lei de estrangeiros de 2012. Aí se referia que o prazo máximo de
detenção administrativa previsto na lei é de 60 dias, mas que a média da
detenção rondará os 20 dias, e que “durante o período de detenção o apoio por
parte de advogados oficiosos é muito escasso ou até mesmo inexistente”. Uma
afirmação que continua actual, reforça o jurista.
A
presidente da Associação Luso-Caboverdiana de Sintra, Rosa Moniz, tinha já dito
, num artigo sobre este assunto que “a fragilidade [das pessoas que estão para
ser expulsas] está em não terem capacidade para responderem ao SEF. Às
vezes, as situações podiam reverter-se se tivessem advogado. O advogado
oficioso não faz nada”, notando que "a lei actual veio facilitar muito as
expulsões”.
A
associação Solidariedade Imigrante chegou mesmo a propor “a criação de um
gabinete sem encargos financeiros para o imigrante na zona internacional dos
aeroportos, tutelado pela Ordem dos Advogados em parceria com organizações da
sociedade civil.”
Numa reportagem do PÚBLICO em Cabo Verde,
publicada no domingo, representantes das autoridades cabo-verdianas revelaram
que o país tem recebido alguns casos de cidadãos expulsos de Portugal que
viviam em Portugal desde crianças, e mesmo de “pessoas [expulsas] que nunca
estiveram [em Cabo Verde]. Responsáveis do Ministério das Comunidades
denunciaram "situações desumanas" na forma como Portugal faz as
deportações.
A
ministra das Comunidades, Fernanda Fernandes, contou o caso de um sem-abrigo
encontrado nas ruas do Estoril pelo SEF que foi deportado ainda com a pulseira do
departamento de Psiquiatra do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, onde esteve
internado um mês antes de ser enviado para Cabo Verde “só com a roupa do
corpo”. O seu relatório médico dizia que tinha sofrido “episódio depressivo
severo com sintomas psicóticos”, adiantou Nádia Marçal, responsável, naquele
ministério, pelo dossier do “Retorno
Involuntário” no arquipélago africano. Tinha nascido em São Tomé e Príncipe e
ido para Lisboa em criança. Quando chegou à Praia, depois de ter sido expulso
de Portugal, não conseguiu identificar quaisquer familiares em Cabo Verde.
O
PÚBLICO contou também a história de Daniel Sousa Varela, um recluso de 27 anos
que está no Estabelecimento Prisional de Setúbal, condenado por furto. Nasceu
em Setúbal e tem na cidade duas filhas portuguesas menores, uma de três e outra
de oito anos. Foi-lhe aberto um processo de afastamento coercivo, ainda sem
decisão de expulsão. Daniel chegou a ter bilhete de identidade português. Nunca
esteve em Cabo Verde.
Ptortugal
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