O muro na fronteira entre a Bulgária e a Turquia, construido em 2014
Nos últimos dias muita gente
consumidora apenas do generalismo informativo parece ter acordado e constatado
que são cada vez mais os muros que nos separam e iludem. Em vários territórios.
Em vários continentes. E quase todos por uma só razão. Para impedir a
circulação de pessoas. De (i)migrantes. Sim. Parece que a generalidade das
pessoas acordou para uma realidade que infelizmente se tem vindo a impor já há
algum tempo.
Provavelmente vão voltar a encolher
os ombros em relação ao fenômeno migratório, deixando um espaço vazio para uma
minoria que teima em não assumir que no domínio das migrações o mundo está a
adiar as decisões corretas ao nível das políticas públicas adequadas para a
(i)migração.
É pois urgente que as opiniões
públicas não se alheiem da vergonhosa existência em pleno século xxi (o século
do movimento dos povos), sucessor do século do povo (que foi o século xx), de
cada vez mais muros a separar-nos. O alheamento em relação ao fenômeno
migratório alimenta todos quantos têm uma atitude fechada, securitária,
desconforme com a realidade, no que diz respeito à (i)migração.
Alimentando assim sentimentos e
decisões que em cada vez mais países e territórios desembocam na vergonha da
construção de cada vez mais muros. E que nos levam a um mundo de muros quase
sempre só para as pessoas, mas não para os capitais, as armas e as empresas.
Não destacando diferenças e semelhanças e motivações para a sua edificação.
Seja entre Israel e a Jordânia, seja entre a Tunísia e a Líbia ou entre
Marrocos e a Mauritânia, ou entre os EUA e o México, ou entre a Índia e o
Bangladesh, ou entre a Turquia e a Bulgária, ou entre o Zimbábue e o Botsuana.
Muros com muitas diferenças em relação à Muralha da China e ao Muro de
Berlim.
O muro na fronteira
entre a Bulgária e a Turquia, construído em 2014 ©
Dimitar Dilkoff/AFP
Mas o mais grave é o novo muro que
será construído numa das fronteiras externas da União Europeia, entre a Hungria
e a Sérvia, e direi também um outro que existe e que a tal indiferença e
alheamento vão alimentando, que é na prática o existente entre Espanha e
Marrocos.
Estes muros são o exemplo de como já
nem verdadeiras democracias conseguem lidar com o fenômeno migratório com base
em princípios e valores de vida que sustentam os direitos, liberdades e
garantias dos cidadãos. Infelizmente são mais um exemplo do estado da nossa
democracia, que vive muito prisioneira da ortodoxia dos números e pouco
interessada em inspirar-se em valores de vida humanistas, que estão na sua
origem.
Isto um dia vai ter de mudar. Não é
possível continuarmos a alimentar tantos muros que nos dividem. E iludem.
Porque estes muros não são a solução. Pelo contrário. Só adiam, e mal, os
problemas. Este tipo de desnorte e de manifestação gratuita de força, que tem
estado na base das decisões da edificação destes muros, são um a somar a outros
exemplos de como não existe uma capacidade de resposta coerente para os
desafios que as migrações estão a apresentar a países de vários continentes. De
má-fé muitas vezes utilizam-se quer o desemprego quer o terrorismo como
pretextos destas decisões.
É um erro fazê-lo, porquanto as
migrações não são um problema mas sim uma oportunidade, no domínio da
demografia, do desenvolvimento, da democracia e da segurança. Nós, na Europa,
esquecemos o que vários estudos e várias das suas propostas, sempre em nome da
sustentabilidade econômica e social da União Europeia, nos têm dito – a
imigração é necessária para a Europa e para o seu futuro em termos econômicos e
sociais.
Não esquecendo do ponto de vista
cultural, religioso e político, que a Europa se construiu de baixo para cima
com base em valores de vida assentes na nossa herança judaico-cristã. Somos uma
minoria aqueles que, perante os erros que vão sendo cometidos nestas matérias,
teimamos em sugerir que entremos num caminho completamente diferente. A ilusão
de que a imigração se trata assim vai ter de acabar a bem o
Jornal
I
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