Quando se deitou para dormir em um colchão, no chão de
uma das salas improvisadas da Vila da Cidadania, em Piraquara, o haitiano
Junior Nelson, de 30 anos, enfim, se sentiu seguro e cheio de expectativas. Ele
é um dos 76 migrantes do Haiti e Senegal que nos últimos dias foram mandados a
Curitiba pelo governo do Acre– por onde entraram no Brasil. Essas novas “levas”
foram as primeiras a contar com uma estrutura de acolhimento, que começa a ser
esboçada no Paraná. Apesar de ainda estar em articulação, este centro de
orientação na Vila garante um mínimo respaldo aos forasteiros, o que lhes
permite sonhar. “Como sou jardineiro, quando vi a cidade cheia de jardins e
flores, fiquei feliz. Com o meu trabalho, vou poder deixar Curitiba mais
bonita”, disse Nelson, em bom espanhol. “Pensamos que os brasileiros amam o
Haiti. Por isso, quero ficar aqui”, completou.
Os ônibus fretados pelo governo do Acre vieram
diariamente entre 26 de abril a 1º de junho. Assim que chegam à Vila da
Cidadania, os migrantes passam por uma triagem. A equipe os cadastra de acordo
com o perfil profissional, tenta providenciar documentos que faltam –
principalmente carteira de trabalho – e localizar parentes que estejam
estabelecidos no país.
Nem todos fincam raízes por aqui. Apenas 16 dos migrantes
que chegaram nas últimas levas permanecem provisoriamente alojados na Vila da
Cidadania. São os que mais precisam de apoio, porque não têm conhecidos no
Brasil ou perspectivas de emprego a curto prazo. Outros 18 permanecem no Paraná,
mas estão e morando na casa de parentes e trabalhando. A maioria – 42 pessoas –
seguiu para outros estados, principalmente Santa Catarina e São Paulo.
“A estrutura ainda é improvisada. Pegamos salas que
estavam ociosas e adaptamos de forma a atender os migrantes que chegam,
enquanto discutimos a implantação de uma estrutura consolidada”, conta o
professor Lúcio Sérgio Ferracin, coordenador da Vila da Cidadania. “O
importante é prestarmos esse primeiro acolhimento e orientação”, complementa.
Os migrantes chegam à Vila da Cidadania à beira da
exaustão, depois de enfrentarem cerca de dez dias de viagem. A rota de entrada
no Brasil inclui a ação de “coiotes”, o cruzamento clandestino de fronteiras e
o pagamento de propinas. A maioria chega sem dinheiro e só com a roupa do corpo
– já que muitos tiveram a mala roubada na viagem.
Apenas dois dos haitianos que aportaram no Paraná falam
algumas palavras em português. Assim, a língua deve ser outro entrave que os
migrantes terão que superar. No acolhimento, professores voluntários fazem as
vezes de intérpretes. A Vila também oferece cursos gratuitos. “Este acolhimento
é o começo, mas precisamos saber como vai ficar após, porque precisamos
assegurar as condições de permanência”, pondera a professora Daiane Regina
Stolberg Wzorek.
Gazeta do Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário