segunda-feira, 17 de junho de 2013

Brasileira que teve família deportada defende irregulares nos EUA

A brasileira Renata Teodoro, 25, lidera um dos movimentos pela legalização dos imigrantes sem papéis nos EUA. Ela mora no país desde os seis anos, quando seus pais imigraram. Na semana passada, encontrou pela primeira vez em seis anos a mãe, que foi deportada do país em 2007, na cerca que separa os EUA do México. A mãe está proibida de voltar ao país por dez anos.
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Consegui abraçar e beijar minha mãe por meio da cerca que separa o Arizona do México. Foi a primeira vez em seis anos que nos vimos, desde que ela foi deportada dos Estados Unidos e voltou para Criciúma, em Santa Catarina.
Fazia 43º C, eu usava chapéu e minha mãe ficava passando a mão no meu cabelo. Ela me trouxe fotos da família e uma camisa do Criciúma [Esporte Clube, time catarinense de futebol]. Choramos as duas durante mais de uma hora. E eu não sou de chorar.
Meus irmãos e meu pai foram deportados antes, mas fiquei. Tinha acabado de entrar na universidade.
Hoje tenho 25, mas desde os seis anos moro aqui. Decidi ficar e lutar para mudar as leis deste país.
Meu pai trabalhava em minas de carvão em Santa Catarina. Era muito perigoso. Ele tinha um irmão vivendo nos EUA que o convenceu de que seria melhor vir pra cá.
Ele chegou primeiro. Minha mãe pegou os três filhos -meu irmão de dez anos, minha irmãzinha de um ano e meio e eu-, voamos até a Cidade do México e depois pegamos vários ônibus até a fronteira.
Só lembro que tivemos que dormir a céu aberto, no chão, e que fiquei com muita fome e escondida.
Lembro da primeira vez que minha mãe perguntou se eu gostava de morar nos Estados Unidos. Eu disse que não, porque tinha dificuldades com o inglês.
Ela perguntou se eu queria voltar. Respondi na hora que não. A última coisa do mundo seria voltar a fazer aquela jornada insana.
Meus pais trabalharam duro. Ficamos só um ano em Minnesota [Estado no Meio-Oeste dos EUA]. Eles andavam com umas pás tirando a neve para as pessoas.
Quando mudamos para Massachusetts, minha mãe passou a trabalhar como faxineira, e meu pai começou a fazer pães.
Só que, em 2001, com sete anos aqui, meu pai teve o pedido para visto permanente negado e precisou voltar. O processo foi muito estressante para todos e meu pai e minha mãe acabaram se separando. Ela decidiu ficar.
Em 2007, meu irmão foi detido pela polícia como ilegal. E disseram para ele que estavam atrás da minha mãe. Ela foi à Imigração e os dois foram deportados. Mas eu decidi ficar. Tinha 19 anos.
Criei um movimento com outros estudantes sem documentos. Pela primeira vez, tive que morar sozinha, pagar minhas contas.
Trabalhei em loja, fiz faxina, fui babá, virei monitora de inglês para estrangeiros, sempre com dois empregos ao mesmo tempo. Teve hora em que não consegui pagar o aluguel e fui quase despejada.
Comecei a estudar política pública e direito na Universidade de Massachusetts [Estado na Costa Leste dos EUA], mas, como sou ilegal e não tenho direito a empréstimos do governo, consegui uma bolsa pequena.
Estudo devagar; curso um semestre e paro outro, conforme consigo pagar as taxas. Ainda falta um ano e meio para eu me formar.
Mas atualmente sou coordenadora da ONG Student Immigrant Movement ["movimento dos imigrantes estudantes", em inglês].
Conseguimos várias doações para pagar as passagens da minha mãe e de parentes de outros dois amigos na mesma situação, além de chamar a atenção das pessoas.
Tem gente que acha que ilegal é criminoso e precisa ser deportado, então precisamos contar o nosso lado.
Já fui várias vezes a Washington. Já fui recebida pelos senadores Chuck Shummer, Marco Rubio e Dick Durbin. Só falta encontrar o [presidente Barack] Obama.
PASSO PARA A CIDADANIA
Não sei se a lei que será aprovada será a ideal, mas pelo menos criará um passo a passo para se chegar à cidadania plena. Mesmo com medo de ser deportada, desde 2008 conto a minha história.
No ano passado, Obama decidiu não deportar mais os imigrantes que tenham vindo para cá menores de idade.
Minha mãe, por ter sido deportada, está proibida de pisar no país por dez anos. Enquanto ela chorava naquela cerca, pediu-me para voltar com ela. Disse que não, e ela entendeu. Luto para que as famílias possam ser reunidas de novo. Será uma nova luta.


Folha São Paulo

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