quarta-feira, 1 de maio de 2013

Crianças migrantes: sozinhas no mundo


O suposto envolvimento de dois irmãos de etnia chechena nos ataques mortais da Maratona de Boston deveria levar os americanos a refletir se fazemos um trabalho adequado em assimilar imigrantes que chegam aos Estados Unidos ainda quando crianças ou adolescentes.
Em 1997, iniciamos um estudo de grande escala com cinco anos de duração, envolvendo imigrantes recém-chegados com idade entre nove e 14 anos em escolas primárias e secundárias de Boston e Cambridge, em Massachusetts, e da área da Baía de São Francisco. Os participantes vinham da Ásia, da América Latina e do Caribe e muitos haviam fugido não apenas da pobreza, mas também de conflitos armados, como na Guatemala, Nicarágua, El Salvador e Haiti. Ao longo de cinco anos, entrevistamos mais de 400 estudantes, bem como pais e professores. Reunimos dados sobre seus currículos escolares, notas de provas e medidas de bem-estar psicológico.
Os dois irmãos acusados pelos bombardeios de Boston – Tamerlan Tsarnaev, de 26 anos, que foi morto na sexta-feira (19), e seu irmão, Dzhokhar, de 19 anos, capturado no mesmo dia – tinham 15 e 8 anos, respectivamente, quando imigraram. Ambos frequentaram a "Cambridge Rindge and Latin", a única escola pública de ensino médio da região. Eles não participaram do estudo, mas tinham o mesmo perfil demográfico dos sujeitos de nossa pesquisa: nascidos em famílias deslocadas por guerras ou conflitos, os jovens passaram por idas e vindas migratórias e por dificuldades linguísticas, e conviveram com ambientes onde as gangues e a criminalidade são tentadoras.
Quando questionado sobre "o que mais gostava nos Estados Unidos", um menino haitiano de 11 anos em Cambridge respondeu: "Aqui menos gente é assassinada". Sua resposta foi incrivelmente sucinta, mas ele não foi o único a dizer isso.
Um salvadorenho de 10 anos cuja família escapou por pouco dos esquadrões da morte falava a respeito de sua solidão intensa. Quando alguém estourou uma bombinha em sua sala de aula, em um bairro de Cambridge, o menino correu e pulou nos braços de uma pesquisadora impressionada.
Uma menina de 12 anos cuja família fugiu do caos na Guatemala para a Baía de São Francisco também se tornou ensimesmada. Ela lamentava estar "trancada" por conta da violência das gangues em sua nova comunidade.
Não surpreende que os estudantes vindos de áreas assoladas por conflitos armados tivessem mais chances de apresentar sintomas como ansiedade, depressão, problemas de concentração e sono.
Muitos estudantes recém-chegados frequentam áreas urbanas pouco solidárias e sem coesão. Em muitos casos não encontramos um senso de propósito compartilhado, mas um corpo discente dividido racial e etnicamente, entre imigrantes e nativos, ou entre recém-chegados e imigrantes mais adaptados. Apenas 6% dos participantes citavam um de seus professores como alguém a quem poderiam recorrer em caso de problemas; apenas 3% puderam identificar um professor que tivesse orgulho deles.
Quando questionados sobre o que os americanos pensam sobre os imigrantes de sua origem nacional, 65% dos estudantes forneceram adjetivos negativos. "A maior parte dos americanos acha que somos preguiçosos, bandidos, viciados e que só viemos para roubar seus empregos", afirmou um menino de 14 anos na Baía de São Francisco. Também descobrimos que muitos educadores que já enfrentavam os grandes desafios das aulas na cidade grande, consideravam os pais imigrantes mal informados e subdesenvolvidos.
Ter ao menos um amigo que falasse inglês fluentemente era um grande indicativo de bons resultados acadêmicos. Ainda assim, mais de um terço dos estudantes entrevistados afirmaram que tinham pouca ou nenhuma oportunidade de interagir com estudantes nascidos nos Estados Unidos e ainda menos de fazer amizade.
Nossa pesquisa também confirmou que as crianças que chegam ao país em idade escolar, assim como Tamerlan Tsarnaev, tinham poucas chances de sucesso, especialmente se deixassem de frequentar a escola, ou se enfrentassem instabilidades familiares e deslocamentos traumáticos em seus países de origem.
De acordo com os relatos dos jornais, o irmão mais jovem, Dzhokhar, era um aluno "inteligente" e "respeitado" da escola "Rindge and Latin", onde tinha amigos e era capitão do time de luta greco-romana. Mas na Universidade de Massachusetts em Dartmouth, ele estava se saindo muito mal. O sociólogo Alejandro Portes, de Princeton, e a psicopedagoga Cynthia Garcia Coll, da Universidade Brown, identificaram uma queda no desempenho escolar dos imigrantes ao longo do tempo. Quase dois terços dos estudantes entrevistados apresentavam esse declínio. Alguns deixavam a escola para buscar trabalho; outros entravam em gangues.
A boa notícia é que um quarto dos estudantes manteve um bom desempenho acadêmico ao longo dos cinco anos de estudo e outros 11 % demonstraram uma melhora significativa. Embora tenham passado pelo choque inicial da imigração, eles frequentemente estavam matriculados em escolas que os apoiavam, com professores cuidadosos que desenvolviam programas informais de orientação com treinadores, conselheiros e pastores. Além disso, outros pesquisadores como Philip Kasinitz, John H. Mollenkopf e Mary C. Waters descobriram que a segunda geração de imigrantes – crianças americanas filhas de imigrantes – assimilam e até superam os resultados da "geração 1.5" (crianças que imigram antes da adolescência).
Seja lá o que motivou os irmãos Tsarnaev, certamente não é culpa da escola e talvez nunca saibamos da verdade. Entre alguns dos traços específicos desse caso estão a distância da família e as inúmeras mudanças de país.
Mas a lição que devemos aprender – assimilar estudantes imigrantes ao tecido da sociedade por meio de apoio acadêmico, psicológico e de outros tipos – deve servir de base para educadores e políticos nas próximas décadas, pois, no futuro, imigrantes e seus filhos serão responsáveis pela maior parte do crescimento do país. Um modelo bem sucedido é o das Redes Internacionais para Escolas Públicas, nas quais os educadores se concentram nas diversas necessidades dos estudantes e os ajudam a desenvolver conexões autênticas ao lado de suas famílias.
É preciso levar em conta o que Emma Lazarus chama de "recusa miserável", que ocorre com pessoas que buscam asilo político como os irmãos Tsarnaev, mas não recebem a rede de apoio que impede a conquista do sonho americano.
(Marcelo M. Suarez-Orozco e Carola Suarez-Orozco são respectivamente reitor e professora da Faculdade de Educação e Estudos da Informação da UCLA e autores do livro "Learning a New Land: Immigrant Students in American Society", ao lado de Irina Todorova.)

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