terça-feira, 26 de março de 2013

Comissão Europeia financia política grega contra imigrantes


Enquanto os combates prosseguem na Síria, famílias desesperadas fogem para o oeste, rumo à Grécia. Contudo, neste país não recebem exatamente calorosas boas-vindas. Na Grécia encontram maciças operações para fechar as fronteiras e reunir os que as autoridades consideram “imigrantes ilegais”, mediante detenções arbitrárias, centros de detenção em más condições e uma forte caracterização racial.
Centenas de efetivos participam da Operação Aspis, na região de Evros, fronteira com a Turquia, e da Operação Zenios Zeus, em todo o país. A guarda fronteiriça localiza as pessoas que tentam entrar em território grego e as convencem a não fazê-lo. Para isso contam com equipamento de alta tecnologia, adquirido com ajuda da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia (UE).
Enquanto isso, a polícia varre a região fronteiriça em busca de pessoas sem documentos em ordem, entre as quais há algumas refugiadas, e as manda para acampamentos de detenção improvisados. Desde o começo das operações, em agosto de 2012, organizações defensoras dos direitos dos imigrantes, entre outras, denunciam os maus-tratos que sofrem estas pessoas, bem como as péssimas condições de detenção.
Durante uma visita a este país, em meados de janeiro, uma delegação da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (Pace) pediu urgência aos membros da UE no sentido de se solidarizarem com a Grécia nesta “crise migratória”. A Pace deplorou a detenção de cidadãos sírios, pois equivale a impedi-los de solicitar asilo por carecerem de assistência legal, de serviços de intérprete e de informação nos centros de detenção.
Além disso, entre 21 e 31 de janeiro o Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária, do escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), realizou sua primeira missão de investigação na Grécia, para avaliar a dimensão da privação de liberdade neste país.
“A detenção de uma pessoa imigrante ou solicitante de asilo durante 18 meses, e às vezes em condições piores do que nas prisões regulares, pode ser considerado um castigo imposto a quem não cometeu crime algum”, afirmou Vladimir Tochilovsky, um dos integrantes da missão do Acnur, durante uma entrevista coletiva em Atenas. O grupo se reuniu em seguida com cidadãos sírios em vários centros de detenção, disse posteriormente à IPS.
As autoridades gregas de migração são responsáveis por esta política, com a cumplicidade de funcionários europeus e a ajuda financeira da Comissão Europeia. A IPS teve acesso a documentos técnicos relativos aos fundos para as operações migratórias na Grécia, que provam que a Comissão Europeia considera que as duras políticas na fronteira e no território gregos são um “imperativo” para proteger os direitos humanos.
Em dezembro, a Comissão Europeia deixou claro que era uma prioridade continuar oferecendo, “por meio do Fundo para as Fronteiras Externas, assistência econômica e operacional à Grécia para montar um sistema de gestão fronteiriça efetivo”. Também diz que o dinheiro dado a este país tem o objetivo de “melhorar os padrões e garantir o respeito aos direitos fundamentais e às normas da Comissão Europeia”.
Uma versão revisada do Programa Anual de Financiamento do Fundo de Retorno Europeu, enviada à polícia grega pela Comissão Europeia, detalha uma iniciativa superior a US$ 11 milhões para renovar ou construir novos centros de detenção, com capacidade para abrigar cerca de 7.200 imigrantes. O projeto pretende “reduzir as denúncias de violações de direitos humanos”. A Comissão Europeia reestruturou há pouco o fundo para o Retorno, dotado de mais de US$ 883 milhões durante o período de 2008 a 2013, para atender as novas necessidades surgidas da Operação Zenios Zeus.
Uma emenda do Fundo para o Retorno, adotada em setembro do ano passado, “inclui várias mudanças que ampliam a possibilidade de financiar projetos de infraestrutura, como renovação e restauração, ou, em caso de necessidades específicas, construir centros de detenção”, disse à IPS o porta-voz da Comissão Europeia para assuntos internos, Michele Cercone.
Cercone acrescentou que, “além disso, em julho de 2012, foram oferecidas novas pautas aos Estados-membros que ampliam o financiamento aos gastos correntes dos acampamentos de detenção para melhorar suas condições de recepção”. Até então, o fundo não cobria gastos correntes, mas a reforma permitiu “aos países-membros operar os centros de detenção”, explicou. Outros US$ 2,4 milhões serão destinados à continuação da Operação Aspis, até junho ou julho deste ano.
Além disso, a Comissão Europeia prevê aumentar até 95% sua contribuição para toda ação similar, e com isto praticamente assumirá todo o custo das operações. Na verdade, o Parlamento Europeu já estuda uma proposta com este objetivo, que será oficial no final deste mês. “Qualquer um que tome as decisões em Bruxelas sabe exatamente o que faz”, disse à IPS a europarlamentar alemã Annette Groth, que integrou a delegação do Pace que visitou este país.
“A situação na Grécia não se parece em nada aos direitos humanos dos quais falamos na Europa, pela política de detenções em massa, em condições deploráveis, de todos os imigrantes e refugiados que chegam. Para estes últimos equivale a negar o direito de asilo”, pontuou Groth. Não tem sentido responsabilizar apenas a Grécia. “Temos de reconhecer que a Comissão Europeia é indiretamente responsável por estas violações de direitos humanos”, ressaltou.
Segundo Cercone, porta-voz da Comissão Europeia para assuntos internos, “só após o final de todo o processo”, no prazo de três anos, “será possível avaliar em detalhe o uso efetivo dos fundos” entregues. Uma fonte de uma grande organização internacional com status de interlocutor na Comissão Europeia disse à IPS que este órgão não só sabe, como está muito preocupado com a situação na Grécia.
Além disso, a assistência do Fundo de Retorno somente será oferecida para gastos vinculados aos centros de detenção que não têm solicitantes de asilo. “Como a Grécia está realizando detenções de forma indiscriminada, os fundos poderiam ser retirados desse país”, informou a fonte à IPS.
 Envolverde/IPS


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