A publicação de um artigo em um jornal conservador japonês em que uma
conhecida autora defende a criação de um "apartheid" como modelo de
controle para a imigração no Japão gerou enorme polêmica nas redes sociais. A
controvérsia chega em um momento no qual o país asiático, um dos mais
restritivos em imigração e onde os estrangeiros representam apenas 1,6% da
população, cogita abrir mais suas fronteiras por necessidade diante da
constante diminuição do volume de mão-de-obra disponível. Coincidindo com a
celebração, semana passada, do Dia da Fundação da Nação japonesa, o jornal
conservador "Sankei" publicou um artigo da escritora Ayako Sono
intitulado "Deixem-nos entrar, mas mantenham 'a distância adequada': a
escassez de mão de obra e os imigrantes". A proposta da ex-assessora do
atual primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, teve rejeição generalizada em
redes sociais como o Twitter, com tuítes que a qualificavam de
"ridícula" e "terrível". "Parece que Ayako Sono nunca
ouviu falar de um gueto ou não tem conhecimento, nem acadêmico nem pessoal,
sobre os efeitos sociais da segregação", escreveu uma internauta. Em sua
polêmica coluna, Sono mostrou simpatia pelo regime do "apartheid",
que durante anos manteve a discriminação entre brancos, asiáticos e negros.
"Desde que conheci a situação da República da África do Sul, há uns 20 ou
30 anos, fiquei convencida de que é melhor para as etnias viver separadas umas
das outras", escreveu Sono. Em carta enviada à autora e ao diretor do
jornal, um grupo sem fins lucrativos dedicado a promover o conhecimento sobre a
África no país asiático, chamado "Africa Japan Forum", mostrou seu
mal-estar com o que definiu como um "ato vergonhoso". "É
abominável defender o apartheid, que foi amplamente condenado pela comunidade
internacional como um 'crime contra a humanidade'", apontou no texto Naoko
Tsuyama, presidente da organização. Paradoxalmente, a data escolhida para a
divulgação da coluna também coincidiu com o 25º aniversário da saída de prisão
de Nelson Mandela, 11 de fevereiro. "Foi muito decepcionante encontrar
nesse dia memorável uma coluna que nega a importância da luta dos
sul-africanos, que arriscaram sua vida para terminar com o apartheid e alcançar
uma sociedade sem discriminação racial", acrescentou Tsuyama. Em sua
coluna, a autora argumentou que "não há nada desumano em deixar que as
pessoas vão ao Japão fazer dinheiro enquanto as condições de seu contrato
permitirem", mas que ao mesmo tempo "deveria ser criado um sistema
que mantenha estritamente o status legal destas pessoas como imigrantes".
A escritora fez este comentário por causa da decisão do Japão de facilitar o
acesso a estrangeiros em setores como enfermagem. Esta não foi a primeira vez
que Sono, uma católica de 86 anos, protagoniza polêmicas. A mais recente
aconteceu em agosto de 2013, após a publicação de um artigo em uma revista
semanal japonesa no qual ela criticou mulheres que insistem em manter seus
postos de trabalho após serem mães, e pediu para que fiquem em casa para criar
seus filhos em vez de levá-los para creches.
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