Há oito meses o médico haitiano Guiford Etien
chegou a Três Lagoas com a roupa do corpo, um sonho e um diploma. Desgastado
por um terremoto que assolou seu país e pelos problemas sociais, textos na
internet sobre o Brasil reacenderam a esperança de ter uma vida melhor e
sustentar a família. No entanto, o médico relata que enfrenta no munícipio
racismo, xenofobia e burocracia para atuar na sua área.
Dr. Etien ficou sabendo do programa do Governo
Federal “Mais Médico” quando chegou ao país; no entanto, para atuar como médico
no Brasil precisa passar por trâmites exigidos pela legislação. Um deles é que
no diploma deve haver um carimbo de revalidação do título acadêmico. Esse
trâmite só pode ser feito em Cuba.
Honório Paes, empresário que auxilia os haitianos
em Três Lagoas diz que eles foram a Campo Grande. no Ministério da Saúde do
Estado e na UFMS (Universidade Federal do Mato Grosso do Sul) para tentar
ajudá-lo. No entanto, o Ministério informou que pelo programa “Mais Médicos”
ele não poderia atuar. “O Haiti também necessita de médicos; por esse motivo,
ele não pode ser incluído no programa. Eu sozinho não tenho condições de
levá-lo a Cuba para revalidar o diploma. Mas não desisto, por nós
três-lagoenses e por ele, de conseguir uma ajuda para mandá-lo a Cuba”.
Todavia o Dr. Etien foi informado de que se alguma
prefeitura mostrar interesse é possível colocá-lo para atuar na área da saúde,
como enfermeiro ou outro cargo. “Não tenho documentação necessária para atuar
como médico, mas posso em outras áreas. Apenas peço uma oportunidade. Já fui
informado de que Três Lagoas necessita de profissionais na área da saúde; só
quero ajudar e ter a oportunidade de sustentar minha família”.
Atualmente o Dr. Etien trabalha em um depósito de
distribuição de galões de água mineral e gás.
HISTÓRIA
O doutor conta que se formou em Havana – Cuba -
após a diplomação, permaneceu no país por mais quatro anos, mas sem atuar na
área, pois segundo ele, a oferta de emprego é muito baixa. Ele chegou a
trabalhar seis meses em um hospital; no entanto, só recebeu por um mês.
Dr. Etien conta que tinha uma quantia em dinheiro e
decidiu ir atrás do seu sonho, quando entrou na faculdade: ajudar as pessoas
que necessitam. “Chegamos a ir a Republica Dominicana, mas também é um país
complicado para nós. Comecei a pesquisar e vi que no Brasil eu poderia ajudar
as pessoas com minha profissão e também ser feliz com a minha família. No meu
país [Haiti] nunca sabemos que dia iremos comer; nem se acordaremos vivos; por
quanto tempo iremos sobreviver”.
FAMÍLIA
O filho do doutor deve chegar ao Brasil neste
domingo (18/05). Quando eles estavam saindo da República Dominicana, o filho
não pode vir por não ter todos os documentos necessários. “Nosso filho foi
tirado dos nossos braços pela polícia. Era um documento específico junto com o
passaporte. Quando fomos nos informar de quais eram necessários ninguém nos
falou desse, não correríamos esse risco. Mas o levaram”.
O filho do Dr. Etien ficou com a cunhada no país.
Agora, com todos os documentos, ele poderá embarcar.
Ele diz que a ajuda para comprar as passagens veio
de um empresário de Três Lagoas.
RACISMO
Outro motivo que o fez optar pelo Brasil é a ajuda
humanitária e militar que o país ofereceu para o Haiti após o terremoto. “Vimos
todas aquelas pessoas nos ajudando, nos tratando como humanos. Aquela gentileza
toda me deu esperança de que aqui no Brasil poderíamos retribuir o favor”,
disse o doutor.
O empresário Paes conta que ele e um grupo de
haitianos, incluindo o doutor, já sofreram preconceito e xenofobia na área
central de Três Lagoas. “Duas mulheres passaram por nós, nos xingaram (sic) de
macacos e cuspiram no chão dizendo que não deveríamos estar aqui, que somos
vermes. O que elas não sabiam é que eu sou brasileiro. Eu queria chamar a
polícia e denunciá-las, mas eles [haitianos] não deixaram. Disseram-me que
estão aqui para trabalhar e não para arrumar problemas”.
Paes ainda conta que foi a Cuiabá-MT para visitar
um projeto que ajuda haitianos e revela ter se impressionado com a qualidade do
tratamento com os estrangeiros. “Há alojamentos com ótima qualidade; eles são
bem tratados. Isso porque a cidade entende que a grande maioria deles oferece
ótima mão de obra e o mínimo que se pode oferecer em troca é receber e tratar
bem essas pessoas. Às vezes fico decepcionado em ver que na minha cidade eles
sofram tanto com preconceito. Eles estão ali para ajudar no crescimento da
cidade com mão de obra e com isso terem condições para dar uma boa vida à
família. Mas acredito que haverá pessoas que irão dirigir um olhar mais humano
para a situação deles”.
DOAÇÕES
Paes ajuda cerca de 20 haitianos que necessitam de
roupas, sapatos e alimentos. Para doar, basta comparecer a Rua Alexandre Costa,
201, Interlagos, ou ligar para 9215-2277 ou 9115-7142 e falar com Honório Paes.
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