A falta de
infraestrutura da Polícia Federal e de pessoal capacitado são apontados como os
principais motivos para lentidão no atendimento de estrangeiros refugiados que
chegam a São Paulo, no Brasil. De acordo com entidades que auxiliam essas pessoas, há dias em que são realizados
apenas três atendimentos, muito pouco para uma fila que já passa de três mil
estrangeiros que fizeram a solicitação somente neste ano.
Alguns refugiados esperam até sete meses para
conseguir atendimento. Segundo a Polícia Federal, houve uma explosão na
quantidade de solicitações. Musehg Esenkua teve que deixar às pressas a República
Democrática do Congo, antigo Zaire, após um amigo próximo ser executado por questões políticas. A intenção dele era
ir para a França, onde estão alguns parentes, mas pegou o navio errado e, 21
dias depois, desembarcou em Santos, no litoral paulista. A solicitação de
refúgio deve ser feita na Polícia Federal, por meio de entidades que fazem a
intermediação, mas o estudante de Contabilidade só conseguiu vaga para o início
de outubro. Serão sete meses de espera e, sem esse protocolo, ele não consegue
ter acesso à outros documentos, como CPF e carteira de
trabalho. "Prejudica muito porque aqui no Brasil, para conseguir trabalhar,
tem que ter a carteira de trabalho. Então, até quando vamos ter que esperar?
Como a pessoa vai viver?", questiona.
Depois desse processo, o pedido ainda segue para a
avaliação do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), órgão ligado ao
Ministério da Justiça, que avalia se o solicitante tem osrequisitos para ser considerado
refugiado. Mas a situação nem sempre foi tão complicada. O congolês Kanga
Hercult, que atualmente trabalha como agente comunitário de saúde, chegou ao
Brasil em 2008. Na época, foi atendido em apenas uma semana. "Não demorou
muito. Acho que depois de sete dias eu fiz a entrevista da Polícia Federal,
consegui o protocolo, a carteira de trabalho e o CPF", lembra o congolês.
Aumento anormal das demandas
Para a Polícia Federal, parte da lentidão no
atendimento se deve ao aumento das demandas. Em 2009, 575 pessoas solicitaram
refúgio em solo brasileiro, número que cresceu nos últimos anos e que em 2013
atingiu a marca de 17.929 pedidos. No entanto, nem a Polícia Federal nem o
Ministério da Justiça informaram quanto foi investido nesse setor para
acompanhar a alta de solicitações. Entidades especializadas em dar suporte a
pessoas nessa situação também questionam a atual qualidade do atendimento.
Marcelo Haydu, fundador e diretor executivo do Instituto de Reintegração do
Refugiado (ADUS), acredita que o principal motivo para a fila de meses é a
falta de investimento no setor.
Refugiados na França
Em países europeus, a obtenção do refúgio é ainda
mais rígida. Na França que é um destino muito procurado por cidadãos da
República Democrática do Congo por causa da língua em comum, o solicitante pode
enfrentar uma espera de até três anos para conseguir os documentos necessários
para permanecer no país. O processo é um pouco diferente. Ao contrário do
Brasil, o primeiro contato deve ser feito na prefeitura do departamento onde o
solicitante pretende morar. Pedro Vianna, coordenador da revista Migration
Société, uma importante publicação que desde 1989 edita artigos e relatórios
sobre a atividade migratória e seus impactos sociais na França, explica que o
governo já sinalizou a redução desse prazo, mas o problema persiste.
"Todas as questões de reunificação familiar ou do reconhecimento do status
de refugiado apresentam prazos longos e uma burocracia enorme. E isso é um
combate cotidiano daqueles que exigem que os estrangeiros sejam tratados como
qualquer cidadão para melhorar as condições do exercício e do reconhecimento
desses direitos", argumenta o especialista.
Atualmente, na França, 20% do total das demandas
ganham o reconhecimento do status de refugiado. No Brasil, especialistas
acreditam que esse percentual atinja 30%. Segundo Vianna, as autoridades
francesas explicam que o baixo percentual se explica porque muitas demandas
são, na verdade, falsas. Em razão das duras regras de imigração no país, muitas
pessoas tentam burlar a legislação por meio do uso indevido do status de
refugiado, fazendo com que o índice caia.
Camila Cesar em colaboração com a CBN
RFI
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