O
ex-diplomata colombiano diz que a região tem sofrido com a defasagem de
conhecimento em alguns setores.
"Se nós não
temos mão de obra, temos que importá-la", afirma. "Essa também é uma
oportunidade para ganhar conhecimento e, como consequência, ter maior
integração com países da Europa (origem provável da maioria dos futuros
imigrantes)".
Para Moreno, elevar
a qualidade da mão de obra deve ser uma prioridade dos governos
latino-americanos, assim como ampliar a integração regional, investir em
infraestrutura e inovação. As ações, diz ele, são essenciais para que a região
possa competir com as economias asiáticas.
Leia, a seguir, os
principais trechos da entrevista.
BBC Brasil -Na
América Latina, enquanto membros da Aliança do Pacífico, entre os quais México
e Chile, vêm firmando acordos de livre comércio com os Estados Unidos e a União
Europeia, o Mercosul tem adotado um modelo comercial mais fechado e voltado à
região. Qual modelo é melhor?
Luis Alberto Moreno
- É importante
ter em conta que um país grande como o Brasil, que tem um comércio exterior
pequeno como porcentagem de seu PIB, vai focar naturalmente seu mercado
interno, que é muito grande. Os países menores, como Chile, Colômbia e Peru,
têm que se voltar à exportação, têm que buscar mercados de outras partes.
É verdade que a
construção do Mercosul é diferente da Aliança do Pacífico. Os países respondem
a demandas do setor privado, e as diferenças nos dois blocos refletem as visões
distintas de seus setores privados.
Na Aliança do
Pacífico, esses setores estão pensando todos os dias em maneiras de ter uma
integração em torno de cadeias de valor – essa é a mesma forma de integração da
Ásia.
BBC Brasil -Existe
margem para uma integração maior dentro do Mercosul, levando em conta as
assimetrias entre seus membros?
Moreno - Os governos têm de tomar
decisões fortes, sabendo que a integração é nossa oportunidade para crescer
mais. Nos próximos cinco anos, o mundo não vai crescer tanto como antes.
Esse menor
crescimento tem duas origens: um, a crise internacional; outro, a necessidade
de que os países encarem reformas estruturais. Nossa possibilidade de conseguir
maior crescimento é pela integração, que exige vontade política e também uma
integração física muito maior.
BBC Brasil – Mas há
crescente oposição de comunidades locais a grandes obras de integração física
na América Latina.
Moreno – Isso pode fazer com que a
integração física demore mais, mas não pode travá-la. Ela é uma necessidade que
todos os países têm. E há também a necessidade de aumentar o investimento em
infraestrutura.
No Brasil, a
presidenta anunciou no ano passado investimentos de cerca de US$ 60 bilhões em
parcerias publico-privadas. Todos os países estão procurando maneiras de
acelerar os investimentos em infraesteutura, porque eles se traduzem em maior
competitividade.
BBC Brasil -No
Brasil, em resposta à crescente fragilidade da indústria, que não tem
conseguido fazer frente à competição externa (especialmente asiática), o
governo tem adotado políticas de isenção fiscal e barreiras a produtos
importados. Qual o caminho para fortalecer a indústria sem viciá-la e
considerando nossas desvantagens competitivas em relação à Ásia?
Moreno – Esse é um tema não só do Brasil,
mas de toda a América Latina. A América Latina tem um risco relativamente baixo
para investidores, mas o custo dos países é muito alto em comparação com o de
países asiáticos.
Temos um problema
muito grande de produtividade, que envolve custos de energia, telecomunicações,
capital humano, qualidade de educação, treinamento técnico, investimentos em
ciência e tecnologia, infraestrutura e inovação. Os nossos países têm que focar
esses temas.
BBC Brasil –Isso
implica uma participação maior do Estado na economia?
Moreno - Os investimentos em
infraestrutura dependem do setor público, não importa o modelo. O mesmo vale
para as decisões sobre educação e capacitação de mão de obra.
Começamos a ter uma
defasagem de conhecimento em alguns setores. Nossa força de trabalho é
insuficiente e deve haver uma resposta importante dos governos.
BBC Brasil –
Estimular a imigração é um caminho?
Moreno - Se nós não temos mão de obra,
temos que importá-la. O programa Brasil Braços Abertos (em elaboração pela
Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência e que visa facilitar a
entrada de mão de obra estrangeira qualificada) trata disso.
Essa também é uma
oportunidade para ganhar conhecimento e, como consequência, ter maior
integração com países da Europa. As pessoas que vêm da Europa para cá podem
abrir empresas, criar novos laços entre as regiões.
No passado, a
imigração foi boa para o Brasil, que tem gente do Japão, Alemanha, Itália...
Ela criou o caldeirão cultural brasileiro.
BBC Brasil –Alguns
analistas dizem que o modelo de bem-estar social que vem sendo adotado no
Brasil, com crescentes gastos com programas de transferência de renda, tem
engessado a capacidade do Estado de investir em outros setores. Há
incompatibilidade entre esses tipos de investimento?
Moreno - É normal que haja essas
tensões. Mas acredito que o crescimento deve ser inclusivo e beneficiar a
maioria das pessoas. O Brasil tem grande sucesso nisso, com as milhões de
pessoas que deixaram a pobreza extrema.
Hoje há uma grande
discussão, que eu acompanho de fora, sobre como o Brasil se posicionará diante
das reformas estruturais necessárias para que possa aumentar sua produtividade,
e que implicam todas as reformas em áreas de capital humano, investimento em
infraestrutura, inovação, e mercados laborais.
BBC Brasil – Alguns
países têm se queixado do que consideram uma escalada protecionista na América
do Sul. A premiê alemã, Angela Merkel, disse recentemente que Brasil e
Argentina não podem adotar as mesmas políticas protecionistas que levaram o
mundo à crise várias décadas atrás. A crítica procede?
Moreno - A escalada do protecionismo
começa pelos países industrializados. O mais importante para nós, agora, é uma
maior integração da América Latina. Essa é a grande pendência que temos.
BBC BRASIL
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