Deslocamentos
populacionais no Brasil e em áreas limítrofes são hoje muito diferentes
daqueles que ocorriam até algumas décadas atrás. Estudo mostra que o novo
padrão migratório do país envolve essencialmente áreas urbanas.
Vista parcial da zona
sul de Sorocaba, no interior de São Paulo, com cerca de 590 mil habitantes. As
cidades de porte médio (com entre 100 e 500 mil habitantes) são as que mais
crescem no Brasil por influência da migração interna. (foto: Tonelada/ CC 3.0)
Até a década de 1970, o fluxo migratório típico no Brasil
era das áreas rurais para os grandes centros urbanos. Mas esse modelo sofreu
alterações profundas, como mostra o geógrafo Fernando Gomes Braga na tese de
doutorado que defendeu no Programa de Pós-graduação em Demografia da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
“Hoje a maior parte de nossos migrantes não só vem de áreas
urbanas como também se dirige a elas”, sustenta o geógrafo, que é professor do
Instituto Federal de Minas Gerais, em Ouro Preto. Segundo Braga, a migração
rural-urbana arrefeceu no país e quase se iguala, em números, ao processo
denominado ‘rurbanização’ (movimento de habitantes da cidade para o campo). Ele
lembra que a migração definiu a redistribuição espacial da população
brasileira. “Atualmente, quase 90% de nossa gente vive nos centros urbanos.”
A migração foi o principal veículo dessa mudança radical,
ocorrida em espaço de tempo relativamente curto e motivada, segundo o geógrafo,
pela consolidação econômica de uma sociedade urbana e industrial. “Como os
migrantes vêm de centros urbanos, em geral estão mais qualificados para o
trabalho e adaptados a novas situações.” Isso, segundo ele, decorre do aumento
da seletividade no mercado de trabalho em áreas metropolitanas e tecnopolos.
“Como os migrantes vêm de centros urbanos, em
geral estão mais qualificados para o trabalho e adaptados a novas situações”
Na nova realidade, outros eixos territoriais se consolidam
como áreas urbanizadas no país, com elevada atratividade populacional. Após
examinar as trocas populacionais ocorridas nas 558 microrregiões brasileiras
nos períodos 1975-1980, 1986-1991 e 1995-2000, o geógrafo identificou, entre
outros, os eixos rodoviários Brasília-Belém (centro-norte) e Brasília-Porto
Velho (centro-noroeste), e o que liga cidades do litoral nordestino.
Mas esses novos padrões migratórios, ressalva Braga, ainda
convivem com o padrão antigo: fluxo Nordeste-Sudeste e desconcentração das
capitais das regiões Sudeste e Sul. “Isso comprova o processo de
‘metropolização’ do país”, resume.
Além de fazer uma análise da migração interna
brasileira, com base em dados dos censos de 1980, 1991 e 2000, a tese de Braga
identifica outro padrão de migrações no Brasil, específico das regiões de
fronteira, e apresenta, de forma inédita, metodologia para reconhecimento das
sobreposições entre migração interna e externa.
Na fronteira
Como o trabalho de Braga pretendia discutir os novos padrões
de migração no Brasil, era preciso focalizar não só os movimentos internos, mas
também os que se dão nas áreas de fronteira. Assim como há uma dinâmica de
mobilidade no interior do país, na fronteira com os vizinhos do Cone Sul também
há intensa circulação populacional.
Embora historicamente consolidadas, as relações migratórias
com esses países mostraram significativo aumento nas últimas décadas,
fortalecendo ainda mais as comunidades instituídas a partir de interações e
trocas.
Com o objetivo de inserir seu trabalho no âmbito dos estudos
culturais, o geógrafo fez distinção entre fronteira e limite. 'Limite' seria
uma linha traçada na cartografia, usada para separar os domínios de cada nação.
Já 'fronteira' seria o espaço da integração, do contato entre culturas.
“Isso foi necessário
para identificar microrregiões nas quais a migração transfronteiriça
predominasse sobre outros tipos de mobilidade populacional, como migração
interna ou para países não fronteiriços”, explica. Na fronteira com o Paraguai,
por exemplo, constatou-se atividade migratória envolvendo 29 microrregiões,
como as de Foz do Iguaçu, no Paraná, Chapecó, em Santa Catarina, e Dourados e
Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.
No campo da migração externa, Braga constatou
ainda, no período estudado, aumento do número de brasileiros que deixaram o
país para procurar alternativas de trabalho principalmente nos Estados Unidos,
no Japão e em alguns países da Europa Ocidental. “Essa nova dinâmica migratória
levou o saldo migratório internacional brasileiro a ter sinal negativo pela
primeira vez na história do país.”
Sobreposições
Segundo Braga, a bibliografia indica que os migrantes
internacionais também se movem no interior do Brasil. Em sua pesquisa, ele
revelou um padrão de deslocamento interno que envolve microrregiões com elevada
concentração de migrantes paraguaios.
Esse padrão, segundo o geógrafo, difere da migração total
que ocorre no Brasil, sinalizando que a população que circula entre os países
de nossa fronteira também cria redes de trocas internas, no interior da
fronteira ou na articulação com outros centros de influência regional e
nacional.
Braga identificou um subsistema migratório
interno articulado com a migração internacional, mostrando que os dois
fenômenos não são separados
Braga identificou então um subsistema migratório interno
articulado com a migração internacional, mostrando que os dois fenômenos não
são separados, ao menos no caso dos movimentos na fronteira brasileira.
Intitulado ‘Conexões territoriais e redes migratórias: uma
análise dos novos padrões de migração interna e internacional no Brasil’, o
trabalho de Fernando Braga – orientado por Dimitri Fazito, da Faculdade de
Ciências Econômicas da UFMG) – venceu o Prêmio Capes de Teses de 2012 na área de planejamento urbano e
regional/demografia.
Roberto B. de Carvalho
CH On-line/ PR
Roberto B. de Carvalho
CH On-line/ PR
Nenhum comentário:
Postar um comentário