terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Itamaraty encontra emigrantes

A Embaixada e o Consulado do Brasil em Berlim são os primeiros a anunciar uma próxima audiência pública com os emigrantes para se avaliar o funcionamento do CRBE, Conselho de emigrantes (atualmente suspenso), nos seus dois anos de existência. Outras embaixadas e consulados deverão promover igualmente tais audiências públicas ou encontros com os emigrantes com o mesmo objetivo.
Durante a audiência, os emigrantes presentes serão convidados a responder uma série de questões relacionadas com o desativado CRBE. Essa iniciativa é importante porque demonstra publicamente o reconhecimento do fracasso do CRBE, da maneira como funcionou.
Essa constatação confirma nossas críticas publicadas, neses dois anos, aqui e na mídia alternativa, e pode ser um primeiro passo do Itamaraty para reconhecer a falha cometida na I Conferência Brasileiros no Mundo, se houver a real intenção de se encontrar o formato ideal para uma correta política da emigração.
O movimento Estado do Emigrante, sucessor dos Brasileirinhos Apátridas, saiu reforçado com a suspensão do CRBE, por nós criticado por não corresponder aos anseios da população brasileira vivendo no Exterior. E, por isso, esperamos que o MRE e Itamaraty nos dêem condições para participarmos direta e ativamente dessa anunciada busca na elaboração participativa de uma política de emigração.
Porém, ela responde apenas a uma parte de nossas reivindicações, feitas há quase cinco anos, no Rio de Janeiro, por ocasião da I Conferência Brasileiros no Mundo. Um longo trajeto sem rumo e muito tempo perdido em reuniões sem objetivo definido teriam sido evitados, se o Itamaraty tivesse cumprido o requerido, naquela ocasião, pela maioria presente, em favor da criação de uma Comissão de Transição, constituída de uma parte por emigrantes mas igualmente por representantes dos ministérios relacionados com a emigração, autoridades versadas na questão emigrante, parlamentares, o Conselho Nacional de Imigração e entidades ligadas à migração e imigração para se elaborar a esperada política de emigração.
Infelizmente, o Itamaraty, querendo assegurar o recente controle da questão emigração, que lhe fora outorgado pelo governo, e temeroso de perder essa primazia que lhe permtiria desenvolver todos um setor com verbas e novos postos criados, impediu fosse atendido o objetivo do abaixo-assinado maioritário, e assumiu de maneira intempestiva o papel de tutor dos emigrantes.
A atual intenção de promover-se audiências públicas pode ser positiva mas só cumprirá uma parcela mínima do requerido pelos emigrantes na I Conferência Brasileiros no Mundo. Propomos ao atual chefe da Subsecretaria das Comunidades Brasileiras no Exterior que retire do arquivo o abaixo-assinado e veja o vídeo da última sessão dessa primeira Conferência, quando o embaixador Oto Maia comentava, com o apoio entusiasmado do embaixador Moscardo, o pleiteado pelos emigrantes. E a maneira antidemocrática como certos «donos» dos emigrantes impediram a aceitação do princípio da criação da Comissão de Transição.
E o que visava o abaixo-assinado com a criação da Comissão de Transição ? Queria que um grupo capacitado, com a confiança do governo, de maneira laica, estudasse a construção de uma política da emigração, inspirada na experiência de países de emigração, que reconhecesse a independência dos emigrantes, criando-se para isso um órgão institucional emigrante, reivindicação que, nestes anos, tomou o corpo de uma Secretaria de Estado da Emigração ou de ser integrada num Ministério das Migrações, incluindo igualmente a migração e a imigração.
As audiências públicas só serão válidas se completadas com a criação de uma Comissão de Transição, cujos membros já representativos da sociedade civil poderão dar sua contribuição e resultar, desse esforço coletivo, um novo conceito e formato de política da emigração, em substituição à criação minimalista e imperfeita de um conselho de emigrantes sob a tutela do Itamaraty, o atual fracassado CRBE. Refazer o CRBE com base nas respostas a um questionário levará o governo a uma nova frustração e a um novo fiasco em política de emigração.
Não se pode convocar os emigrantes para lhes oferecer algo já previamente preparado. Ora, foi isso o ocorrido. Quando os emigrantes, já no primeiro encontro pediram autonomia e independência, o Itamaraty surpreso e ultrapassado ofereceu um conselho de emigrantes, meramente consultivo, na verdade inútil na sua essência. Política de emigração não é se reunir anualmente os emigrantes e lhes dar um conselho para discutirem temas de cuja solução não partciparão, funcionando na verdade como marionetes sob a batuta do Itamaraty.
A leitura dos quesitos e perguntas a serem submetidos aos emigrantes nas audiências públicas não tocam na questão principal – qual a competência do conselho de emigrantes ? Simplesmente porque o CRBE, o fracassado ou o que será reformulado, não têm nenhuma competência para agir em qualquer tema emigrante. Podem apenas sugerir. Quem faz tramitar ou não a questão levantada são os diplomatas do Itamaraty. Ora, como já dissemos, o Itamaraty para avaliar as necessidade dos emigrantes não precisa nem de Conferência e nem de Conselho, basta contratar uma empresa de sondagens e pesquisas.
A verdade nua e crua é a inutilidade do CRBE ou seu substituto, uma espécie de farolada, neologismo que poderia resumir a intenção de se dar a impressão aos emigrantes de estarem fazendo alguma coisa, quando, na verdade, continua sendo só o Itamaraty quem tem a palavra final e quem coloniza a emigração.
Enfim, em nenhuma das quatro páginas da convocação para audiência pública se fala em verbas de funcionamento para o CRBE. Ora, os membros eleitos do CRBE que quisessem visitar as comunidades de sua região tinham de arcar com as despesas de viagens, pousadas e refeições. Porém, nas poucas vezes que o Itamaraty participou de encontros com os emigrantes, seus diplomatas tiveram viagem, hotel, refeições e diárias pagas.
Nossa orientação aos emigrantes é a de não se deixarem envolver na discussão das perguntas e quesitos que, na verdade, implicam numa aceitação tácita da atual política de tutela dos emigrantes pelo Itamaraty. Se forem a tais audiências, rejeitem os quesitos e insistam sempre na necessidade dos emigrantes terem sua própria independência, seu órgão institucional emigrante e não estarem submetidos à tutela dos diplomatas e do Itamaraty. Não entrem na discussão dos quesitos.
Essa é uma chance única – o Itamaraty quer obter indiretamente a aprovação dos emigrantes para sua política de tutela da emigração, com as audiências públicas simulacros de democracia, balisadas pelos tutores diplomatas. Ou enfrentamos a tentativa, denunciando a jogada, rejeitando discutir a maneira como não teremos acesso à nossa autonomia e rejeitando a formalização da tutela, ou boicotamos.
Mas há uma maneira de se protestar, seja você emigrante ou parente de emigrante -Envie este comentário ao Itamaraty, peça aos amigos e familiares emigrantes para fazerem o mesmo e enviem todos por email ao seguinte endereço – assistencia.berlim@itamaraty.gov.br .
Sem ilusões, na última audiência pública, os emails enviados pelos emigrantes em favor de uma Secretaria dos Emigrantes foram ignorados como foi ignorado o abaixo-assinado em favor da Comissão de Transição. Mas vamos insistir, não queremos uma política de emigrantes marionetes.
Rui Martins, criador dos Brasileirinhos Apátridas e do movimento Estado dos Emigrantes, ex-membro do Conselho Provisório e do CRBE, é contra a tutela dos emigrantes pelo Itamaraty.
PS. A referência,ao final da convocação da audiência, ao Decreto que instituiu o CRBE não tem razão de ser. Tal decreto previa reuniões anuais pessoais para os membros do CRBE e para a Conferência Brasileiros no Mundo, que não foram cumpridas pelos Itamaraty. Trata-se de um Decreto sem valor? 

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