Essa semana, o Ministério
da Justiça do Japão anunciou um novo plano de imigração. Segundo o relatório
apresentado, o governo pretende aumentar o número de estrangeiros autorizados a
trabalhar dentro de suas fronteiras, como forma de combater a baixa taxa de
natalidade e o envelhecimento da população.
Por
enquanto, o plano será aplicado a profissionais altamente qualificados e
técnicos. Ele flexibiliza as regras para que as empresas tragam mais
trabalhadores não-nativos para o Japão.
Porém,
na prática, o plano é apenas quantitativo e não qualitativo, como se esperava,
pois ele ainda não contempla uma categoria de pessoas que possam fazer
trabalhos não-especializados. O governo declarou que a questão está “sob
análise”.
Essa
questão está sob análise há bastante tempo! Não é de agora que os yonseis
(assim chamada a 4ª geração de descendentes de japoneses que emigraram para
outros países) vem aguardando a liberação de vistos para trabalho. Parece que
ainda não foi desta vez.
O
Japão tem um longo histórico de resistência à influência ocidental e à abertura
de suas fronteiras à população estrangeira.
Antes do Comodoro Perry
forçar a abertura do Japão e dar início à Era Meiji, o país esteve fechado por
mais de 200 anos, durante o período do Xogunato Tokugawa, entre meados de 1640
e 1854. Neste período, ninguém, estrangeiro ou japonês, podia entrar ou sair do
Japão. O período ficou conhecido como Sakoku, uma
expressão que quer dizer `país acorrentado”.
Para
entender porque o país se fechou desta maneira, é preciso saber como e porque
os portugueses chegaram aqui. Sim, os “nossos” portugueses! Por volta de 1540,
com suas sagas intermináveis a caminho das Índias, eles também “descobriram” o
Japão.
Aportando
para fazer comércio e gerar divisas para a coroa, todas as novidades trazidas
pelos portugueses foram até bem recebidas pelos japonenses e, até hoje, muitas
influências da cultura destes europeus pode ser vista por aqui. Apenas uma
novidade trazida por eles não foi muito bem recebida: o Cristianismo.
A
religião ocidental era uma ameaça à estabilidade social e política do Japão,
recém-unificado por Hideyoshi e seu antecessor, Oda Nobunaga. Embora este
último tivesse alguma simpatia pelo Cristianismo, as diferenças culturais
começaram a despertar a intolerância e, assim, todos os missionários foram
expulsos em 1587, pelo Édito de Hakata.
Uma
cidade portuária, porém, permaneceu com os Jesuítas: Nakasaki. Durante 7 anos
foi a “cidade dos cristãos” e era ali que os japoneses convertidos ao
Cristianismo se refugiavam depois de serem expulsos de suas terras, por causa
da fé que tinham abraçado. Até hoje, Nagasaki é considerada a cidade mais
cristã do Japão.
Apesar
das adversidades, o Cristianismo crescia e, com ele, também a perseguição. Em
1597, Hideyoshi mandou crucificar 26 cristãos, num monte à entrada de Nagasaki,
conforme relatos históricos. A perseguição aos cristãos no Japão daquele tempo,
foi tão brutal quanto é hoje na Síria.
Em
1638, um contingente de 125.000 homens, entre eles holandeses aliados aos
japoneses, foram enviados para reprimir uma “revolta” de 27.000 camponeses, em
sua maioria cristãos, que foram massacrados depois de um cerco prolongado e
torturante no Castelo Hara, em Shimabara.
Depois
disso, os portugueses com seu cristianismo foram banidos do Japão e o país se
fechou como uma ostra para os estrangeiros. Menos para os holandeses que, de
forma “desinteressada” ajudaram a expulsar o “inimigo”. Para que o Japão pudesse
acompanhar a evolução da medicina e da tecnologia do Ocidente, o porto de
Nagasaki continuou minimamente aberto apenas para um tímido comércio com os
holandeses.
Até
que, em 1853, o Comodoro americano Matthew Perry chegou com sua enorme esquadra
em Uraga (baía de Toquio) e acabou com a brincadeira de esconde-esconde dos
japoneses. Com os canhões apontados para o nariz do arquipélago, Perry obrigou
o Japão a comercializar com os EUA. Essa abertura, forçada pelo Ocidente,
oportunizou um grande crescimento ao Japão, mas as tradições e a cultura
sofreram poucas mudanças.
Ao
longo da História, podemos notar que todas as vezes que o Japão abriu suas
fronteiras não foi de livre e espontânea vontade, mas por uma necessidade
vital. Nenhum passo foi dado de maneira precipitada ou impulsiva e cada
movimento japonês, assim, como nas artes marciais, é milimetricamente
arquitetado, projetado no impacto que este movimento causará na sociedade, nos
cidadãos.
Foi
assim com os portugueses. Foi assim com Perry. Está sendo assim agora.
No
plano anunciado pelo Ministério da Justiça, o governo diz que vai analisar a
possibilidade da entrada de estrangeiros sem mão de obra especializada, porém,
“com os olhos voltados firmemente à vontade do povo. É necessário analisar a
questão sob perspectivas amplas e as considerações devem estar de acordo com o
consenso dos nossos cidadãos”, disse o representante do governo.
Mesmo
com tantos problemas demográficos, o Japão resiste à abertura de suas
fronteiras aos estrangeiros e essa resistência está justificada nos riscos que
a miscigenação pode trazer para as tradições.
Por
mais que isso possa parecer, a nós ocidentais, uma discriminação injusta,
precisamos concordar que o protecionismo do povo japonês manteve as tradições
preservadas perenemente, durante tantos e tantos séculos.
Parece
que os estrangeiros, aqueles que esperam uma oportunidade de viver na Terra do
Sol Nascente e, principalmente os yonseis, que sonham em viver na terra de seus
ancestrais, vão ter que torcer para que o Japão sinta-se tão pressionado pelo
esvaziamento demográfico quando se sentiu com os canhões de Perry e, diante da
ameça iminente, aceite abrir suas fronteiras.
Portal IPC Digital.
ALESSANDRA BARBIERI
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