sábado, 30 de novembro de 2013

Recrutamento, trabalho infantil e solidão: a crise das crianças sírias refugiadas

Pesquisa feita pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) sobre a situação de crianças sírias refugiadas no Líbano e na Jordânia revela uma situação generalizada de estresse psicológico, com muitas vivendo sozinhas ou separadas dos seus pais, sem receber uma educação devida e envolvidas com trabalho ilegal.
Os dados constam do relatórioThe Future of Syria - Refugee Children in Crisis (ou O Futuro da Síria – Crianças Refugiadas em Crise), divulgado hoje pelo ACNUR. Trata-se do primeiro relatório aprofundado feito pela Agência da ONU para Refugiados sobre crianças sírias refugiadas desde o início do conflito naquele país, em março de 2011.
O relatório demonstra que muitas crianças refugiadas sírias estão crescendo em famílias desestruturadas e que, em muitos casos, são os principais provedores de seus lares. Mais de 70 mil famílias sírias refugiadas vivem sem os pais e mais de 3.700 crianças refugiadas estão vivendo ou desacompanhadas ou separadas de ambos pais e mães.
“Se não agirmos rapidamente, uma geração de inocentes se tornará a última vítima de uma guerra terrível”, disse o Alto Comissário da ONU para Refugiados, António Guterres.
Ao comentar o relatório, a Enviada Especial do ACNUR, Angelina Jolie, disse que “o mundo precisa agir para salvar uma geração de crianças sírias traumatizadas e isoladas pela catástrofe representada por esta guerra”.
O conflito, que já dura 32 meses, está deixando cicatrizes psicológicas e emocionais. No Líbano, 741 crianças sírias refugiadas deram entrada em hospitais para tratamento de ferimentos. Na Jordânia, mais de mil crianças vivendo no campo de refugiados de Za’atri foram atendidas no ano passado por causa de ferimentos relacionados ao conflito.
Ódio e outras reações emotivas também são comuns entre as crianças: durante discussões em grupo com meninos refugiados, muitos deles expressaram seu desejo de retornar à Síria para lutar. Os pesquisadores envolvidos no relatório também ouviram relatos de crianças sendo treinadas para o combate em preparação a um eventual retorno para a Síria.
Em muitos casos, famílias refugiadas com poucos recursos financeiros enviam suas crianças ao trabalho para garantir um meio de sustento. Tanto na Jordânia como no Líbano, os pesquisadores encontraram crianças de 07 anos de idade trabalhando várias horas por dia, com ganhos insignificantes, muitas vezes em condições de exploração. No campo de refugiados de Za’atri, na Jordânia, mais de 680 pequenos estabelecimentos comerciais empregam crianças. Uma avaliação feita em 11 das 12 regiões administrativas da Jordânia descobriu que aproximadamente 50% das residências de refugiados pesquisadas dependem parcialmente ou inteiramente da renda gerada por suas crianças.
A pesquisa feita pelo ACNUR detalha uma dolorosa vida de isolamento, exclusão e insegurança para muitas das crianças refugiadas. Entre as crianças entrevistadas, 29% disseram que saem de casa uma vez por semana ou menos. O que elas chamam de casa é, geralmente, um apartamento abarrotado de moradores, um abrigo improvisado ou uma tenda.

O estudo inclui vários depoimentos de crianças. Para Nadia, uma refugiada recém-chegada na Jordânia, “nossas vidas estão destruídas, pois não estamos sendo educadas e, sem educação, não teremos nada. Estamos indo ao encontro da destruição”.
O relatório mostra que há mais crianças sírias refugiadas fora do que dentro da escola. Mais de metade das crianças vivendo na Jordânia não estão indo à escola. No Líbano, estima-se que mais de 200 mil crianças em idade escolar permanecerão fora da escola ate o final deste ano.
Outro sintoma preocupante da crise é o grande numero de crianças nascidas no exilio, sem certidões de nascimento – um documento essencial na luta contra apatridia. Dados do ACNUR sobre certidão de nascimento no Líbano indicam que 77% das 781 crianças refugiadas pesquisadas não tinham o documento. Entre janeiro e meados de outubro deste ano, apenas 68 certidões de nascimento foram expedidas no campo de Za’atri.
O relatório informa, em detalhes, os esforços feitos pela ONU, ONGs, governos e até mesmo pelos refugiados para resolver o sofrimento das crianças refugiadas. Assistência financeira para famílias refugiadas tem sido oferecida pelo ACNUR para ajudar os núcleos familiares mais vulneráveis. O relatório enumera atividades criativas do ACNUR, UNICEF, Save the Children e outras ONGs para dar às crianças a chance de retomar seus estudos. A generosidade e a compaixão das comunidades de acolhida são temas ressaltados pelo relatório.
Existe cerca de 1,1 milhão de crianças sírias refugiadas, a maioria vivendo em países vizinhos. Enfatizando que “esta marca vergonhosa do conflito deve gerar mais que noticias”, Guterres e Angelina Jolie pedem apoio aos países vizinhos da Síria para que possam manter suas fronteiras abertas, oferecer serviços e ajudar as comunidades que acolhem refugiados fora dos campos. 
O Alto Comissário e a Enviada Especial do ACNUR também pedem que os países além das fronteiras da Síria ofereçam reassentamento e mecanismos de admissão humanitária para as pessoas que continuam se sentido inseguras no exilio e para as famílias com crianças seriamente feridas.
Após quase mil dias de conflito, o relatório do ACNUR é lançado para enfatizar o drama das crianças sírias refugiadas. De forma inovadora, o relatório é apresentado por meio de um microsite multimídia (www.unhcr.org/futureofsyria) contendo fotografias e vídeos, além de declarações e estatísticas facilmente compartilháveis por meio do Twitter e outras redes sociais.
Alguns dos vídeos foram feitos com câmeras GoPro que seguiram crianças no campo de Za’atari. O microsite convida os visitantes a compartilhar as histórias das crianças, doar e escrever mensagens de solidariedade que serão compartilhadas com as crianças refugiadas.
Por: ACNUR


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