quarta-feira, 25 de abril de 2018

FRONTEIRAS FECHADAS, NÃO RESOLVE PROBLEMAS

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De acordo com o Papa, o verdadeiro encontro com o outro não se resume na acolhida, mas envolve outras três ações: proteger, promover e integrar. “No verdadeiro encontro com os outros, seremos capazes de reconhecer Jesus Cristo que pede para ser acolhido, protegido, promovido e integrado? O encontro com Cristo é a fonte da salvação, uma salvação que deve ser anunciada e trazida a todos”, afirmou o Santo Padre.
O tema dos deslocamentos forçados e suas peculiaridades tem direcionado o olhar de órgãos, organizações e Estados em todo o mundo, tendo em vista que, nas últimas décadas, esta questão se transformou em um fenômeno global e encontra-se cada vez mais presente na vida de todas as pessoas. Nesse contexto, são muitas as dificuldades para que sejam oferecidas condições minimamente dignas ao acolhimento.
É sabido por todos que a situação política e socioeconômica da Venezuela tem motivado diariamente o deslocamento de pessoas que têm buscado abrigo e proteção em países fronteiriços. Todos os dias Venezuelanos procuram refúgio aqui no Brasil com a esperança de ter garantidos e preservados seus direitos mais essenciais, como a vida, cuidados médicos, assistência social, educação, trabalho e a própria liberdade de ir vir. Trata-se, portanto de direitos constitucionais e oriundos de Acordos Internacionais. Na prática, devido a uma série de limites o país tem se deparado com um enorme desafio: ACOLHER. Não se trata de receber ou permitir a entrada de pessoas, trata-se, sobretudo de acolher com qualidade, de modo a permitir que as esperanças de recomeço, tenham fundamento na salvaguarda de direitos básicos, direitos esses já negados em seu país de origem.
Preocupada com a manutenção e garantia de tais direitos a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), tem orientado governos no sentido de compreender as especificidades que envolvem o deslocamento de Venezuelanos, colocando antes de qualquer condição, a necessidade de assistência humanitária e proteção internacional. Devido a todas as circunstâncias de instabilidade em que se encontra a Venezuela, deportar ou forçar o retorno dessas pessoas à situação que as fizeram fugir, seria no mínimo desumano. Inclusive, tal prática encontraria sérios limites na legislação de Direito Internacional dos Refugiados, que por força de seu princípio basilar intitulado de non-refoulemont ou não-devolução, fica proibida a retirada, sem consentimento, da pessoa em situação de refúgio do país onde se encontra, para território hostil, onde sua vida corra perigo.
Diante de tal implicação, a governadora de Roraima ingressou no último dia 13 com uma Ação Civil Originária no Supremo Tribunal Federal (STF) na qual solicita que a União seja obrigada, temporariamente, a fechar a fronteira com a Venezuela. Afirma a Excelentíssima governadora que tal medida seria para “resolver os impactos da migração e proteger o povo de Roraima”. Ora, deixar pessoas em fronteira à mercê de todo tipo de violação pelo fato de se tratar de um não nacional ou por alegar que estes “causam um desequilíbrio social e econômico” no estado de Roraima não teria em sua essência um viés xenofóbico?
De fato, como aponta a Sra. Governadora, não há um tratado ou norma de direito internacional que impeça, explicitamente o fechamento de fronteiras, no caso em tela. Mas diante do sofrimento humano, seria mesmo necessário que fossem editadas normas expressas que legitimasse uma prática tão desencorajadora e excludente? Acolher os refugiados não é apenas um ato diplomático de solidariedade, mas tem a transcendência de um conceito humanitário que vem sendo construído há décadas e consta como garantia deste conceito humanitário em nossa nova lei de migrações aprovada em 2017.
Parece que nos falta a difícil e desafiadora prática da alteridade. Estamos falando de pessoas, homens, mulheres, crianças, idosos, famílias inteiras, inclusive um grande número de indígenas da etnia Warao ou até mesmo famílias já desagregadas por reflexo da intolerância e violência sofridas no seu Estado originário. Logo, sofrer violação não é uma livre escolha, mas é necessário impedir que elas ocorram.
Não podemos esquecer que existe um Sistema Internacional de proteção dos Direitos Humanos, onde nele se projeta o valor da dignidade da pessoa, bem como, sua promoção. O refugiado está imerso numa travessia dolorosa e em situação de total vulnerabilidade, longe de ser visto como uma ameaça à segurança nacional ou empecilho ao crescimento econômico do lugar de destino.  É hora de buscarmos soluções para essa problemática, juntos! É preciso que outros governos se comprometam no processo de descentralização da demanda que chega hoje ao Estado de Roraima e assim possa integrar essas pessoas em situação de refúgio, dando-lhes condições de recomeçar suas vidas, seja pela concessão de visto ou por permanência de residência temporária, de modo que, essa primeira necessidade de acolhimento seja atendida e respeitada.
A sociedade civil com suas organizações, Igrejas, Organismos Internacionais já estão fazendo sua parte e graças ao seu trabalho de acolhida e assistência a maioria dos migrantes estão sendo minimamente acolhidos e atendidos. É bom lembrar ao mesmo tempo que existem mais de 3 milhões de brasileiros no exterior e que foram acolhidos e respeitados em seus direitos. Portanto, se queremos ser bem tratados fora do País temos que tratar bem os que chegam em nosso País.
Assim, resta-nos a compreensão de que o fechamento das fronteiras é uma ideia estapafúrdia, e que, mesmo não sendo ilegal como alega a governadora, viola o direito fundamental à vida, bem jurídico de extrema relevância e que está sob tutela do Estado.
São Paulo, 24 de Abril de 2018
Coordenação Colegiada do SPM – Serviço Pastoral dos Migrantes

www.miguelimigrante.blogspot.com

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