Crianças experimentam baião de dois na CEI Dom Gastão
Nos últimos anos, o Brasil tem recebido uma quantidade expressiva de
migrantes e refugiados, dentre eles, muitas crianças – situação que vem
exigindo uma resposta das escolas.
Para além da questão de compreender e debater tais fluxos contemporâneos
de deslocamento, as instituições de ensino lidam com o desafio
de acolher e integrar esses alunos que chegam ao País, valorizando ao
mesmo tempo suas culturas de origem.
Na Baixada do Glicério, na região central da cidade de São Paulo, Paulo
Magalhães, professor de Geografia da EMEF Duque de Caxias, desenvolve
atividades para promover a integração de crianças de cerca de 30
nacionalidades.
Segundo a Polícia
Federal, entre 2013 e 2015, 320 mil pessoas migraram para o Brasil, uma média
anual 2,4 vezes maior do que em anos anteriores, como em 2006, quando o país
recebeu 45.124 imigrantes e refugiados.
Para isso, leva seus alunos semanalmente a diferentes espaços educativos
com o intuito de apresentar-lhes a
cidade e, ao mesmo tempo, promover situações de intercâmbio
cultural e comunicação. Da última vez, foram à exposição do artista
plástico Cícero Dias, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil.
“A ocupação de territórios
educativostem ajudado eles a se integrar melhor. Aulas fora da escola são mais
vivas e eu vejo as crianças falando mais, se expressando melhor nesses momentos
e também socializando com a comunidade”, conta o educador.
Diante do caso de uma aluna oriunda da República Democrática do
Congo que sofria bullying, o professor mostrou imagens atuais
do país a fim de valorizá-lo. “As crianças tinham uma ideia muito negativa da
África e eu comecei a mostrar que não era como eles imaginavam”, conta.
Além de alunos de outros países como sírios, marroquinos, chineses e
colombianos, há estudantes também de outras regiões do Brasil, como do
Nordeste, que igualmente desconhecem o entorno da escola. Por isso, Paulo
também propôs um mapeamento dos
principais pontos do território.
“Nós fizemos um mapa de São Paulo e do bairro do Glicério em sala
de aula, antes de uma aula teórica. Depois, andamos pelas ruas e eu fui
mostrando a Igreja da Sé, o Teatro Municipal, entre outros pontos importantes
da cidade. Depois fomos montar o mapa novamente”.
As atividades têm rendido efeitos positivos. O professor contou que
recentemente um aluno viu um colega sofrendo bullying e imediatamente
interferiu, chamando um adulto. “As crianças estão se sensibilizando com isso e
já não deixam mais acontecer”, conta.
Crianças experimentam baião de dois
na CEI Dom Gastão
Crédito:
Facebook/Reprodução/Creche Dom Gastão
Na EMEI Nelson Mandela, no bairro do
Limão, também em São Paulo, os educadores procuram trabalhar a valorização de
outras culturas com práticas próprias da infância, por exemplo,
brincadeiras e festas.
A diretora Cibele Araújo Racy conta que os alunos são seus maiores
aliados em fazer a adaptação dos alunos migrantes. “Todo começo de ano
chamamos as crianças mais velhas para planejar com os professores as
atividades. Elas contam o que mais gostaram de fazer e os lugares que temos que
ir mais vezes”.
Além disso, faz parte do currículo da escola trabalhar as
questões étnico-raciais em sala de aula. Uma das atividades que fazem
nesta perspectiva é aprender palavras do idioma dos alunos migrantes.
A hora da brincadeira livre também é uma oportunidade de interação,
proporcionando situações de identificação entre os alunos. “Criança brinca
e corre do mesmo jeito em qualquer lugar do mundo”, lembra Cibele.
A escola também promove a formação dos professores e de todos os
profissionais que trabalham na instituição para essas questões. Os familiares,
por sua vez, passam pelo processo e são convidados a participar da “escola dos
pais”, espaço em que familiares e docentes debatem temas de interesse
comum.
Nas festas, que são abertas à comunidade e trazem elementos da cultura africana, indígena,
boliviana, japonesa, dentre outras, os familiares também têm espaço. “Nós os
convidamos não só para vir à festa, mas também para organizá-la, colaborar
com dança e comida. Trazer a família para dentro da escola é essencial porque
ela também precisa de acolhimento”, diz a diretora.
Outra estratégia importante é a convocação, no começo de cada ano, dos
familiares das crianças migrantes ou refugiadas para conversar com a assistente
social da escola. “Ficamos sabendo de mais detalhes sobre suas trajetórias,
assim fica mais fácil trazer essas histórias para os projetos e também para
pensarmos a parte afetiva, porque muitos saíram de seus países por sofrimento
ou falta de perspectiva e temos que levar isso em conta. Temos que dar
autoestima para essa criança prosseguir”, avalia Cibele.
Integrando alunos
migrantes pela alimentação
Outra abordagem, proposta pela CEI Dom Gastão, localizada no Bom
Retiro, em São Paulo, é unir as crianças por meio da alimentação e seus
saberes.
“Outro dia uma boliviana, filha de uma peruana e um chinês, estava
comendo baião de dois, e a mãe conheceu o que é manteiga de garrafa. O nosso
aluno chinês trouxe sushi, e as outras crianças quiseram experimentar. Isso é
Brasil. Isso é comida que integra, que faz amigos ao redor da mesa”,
conta Mônica Dias Lopes, coordenadora pedagógica.
Para Mônica, aproximar a família da escola é a base do trabalho. No “dia
das mães boliviano”, comemorado em 27 de maio, fizeram cartazes de
celebração pela escola com ajuda das famílias. Nas festas, os pais também
participam levando comidas típicas.
“É muito acolhedor para uma família boliviana, por exemplo, chegar
a uma festa da escola e poder pedir uma salteña. Temos que valorizar
essa interculturalidade e trabalhar a garantia
de direitos independentemente da nacionalidade, pois somos todos cidadãos de
direitos”, conclui Mônica.
www.miguelimigrante.blogspot.com
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