quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Com apoio de ONGs e empresas, refugiados conseguem emprego



O liberiano Frank trabalhava como engenheiro de projetos no porto de Monróvia, capital da Libéria, antes de fugir da longa guerra civil que assolou seu país por mais de uma década. Em 2000, buscando uma vida mais segura, decidiu tomar uma das várias embarcações que saiam do porto em direção ao Brasil – país que já conhecia pelo futebol. Há 12 anos em São Paulo e após um longo processo de adaptação, Frank acaba de ser contratado em período integral como professor de inglês.

Há um ano, a congolesa Carla* foi forçada a abandonar sua família, inclusive dois filhos pequenos, para salvar sua vida. Ela trabalhava como enfermeira na República Democrática do Congo e chegou ao Brasil somente com a roupa do corpo, buscando recomeçar, em São Paulo, uma nova etapa na sua vida. Apesar de ainda ter dificuldades com o idioma português, conseguiu recentemente um trabalho temporário na construção de um painel de mosaicos para uma instituição financeira da cidade.

As oportunidades de trabalho oferecidas a Frank e Carla são fruto de iniciativas de ONGs e empresas brasileiras que, com o apoio do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) e seus parceiros, estão ajudando refugiados a se inserir no mercado de trabalho nacional. Por força da legislação brasileira sobre refúgio, todos os refugiados e solicitantes de refúgio no país têm direito a Carteira de Trabalho, CPF e identidade de estrangeiro – portanto, encontram-se em situação regular e podem ser contratados pelo setor privado como qualquer outro cidadão nacional, com os mesmos direitos e deveres.

No setor privado, uma das iniciativas que tem ajudado essa população a encontrar trabalho é o Programa de Apoio para a Recolocação de Refugiados (PARR), criado em 2011, de forma voluntária, pela EMDOC, empresa de consultora jurídica em imigração e recursos humanos. Trata-se de um banco de dados virtual com currículos de refugiados e solicitantes de refúgio que pode ser acessado por empresas interessadas neste tipo de mão de obra.

Por meio do website www.refugiadosnobrasil.com.br, o PARR permite que empresas previamente cadastradas consultem os currículos disponíveis e iniciem o devido processo de entrevista e contratação. Até o momento, oito empresas já aderiram formalmente ao PARR, que tem mais de cem currículos disponíveis. O contato com o refugiado é mediado pela Caritas Arquidiocesana de São Paulo, ONG parceira do ACNUR no Brasil na maior cidade do país.

O liberiano Frank foi o primeiro a se beneficiar do PARR, sendo contratado pela própria EMDOC. Outros currículos já foram encaminhados para entrevistas em empresas interessadas. Idealizador do projeto e diretor da empresa, o empresário João Marques Fonseca conta que não hesitou em contratar o refugiado para atender à demanda de seus funcionários interessados em aprender inglês. “A contratação do Frank não foi uma mera formalidade. Ele está aqui por seus méritos. O cargo foi aberto para contratar alguém competente e por isso foi feito um processo seletivo”, afirma.

Com um trabalho mais estável, Frank dará aulas diárias para mais de 70 alunos e está bastante contente com a oportunidade. “Gosto de dar aulas de inglês, gosto de falar inglês e estou feliz por ter um trabalho fixo”, disse o refugiado.

Outra iniciativa bem-sucedida em São Paulo foi feita pelo Instituto de Reintegração do Refugiado (ADUS), criado há cerca de um ano e com foco na integração social, econômica e profissional de refugiados vivendo em São Paulo. A ONG já ajudou mais de 30 refugiados a encontrar trabalho. Carla e outros nove refugiados estão entre os beneficiados, neste caso devido a uma parceria da ADUS com a empresa Oficina de Mosaico, que os encaminhou para obras de restauração em um banco e em um teatro no centro de São Paulo.

De acordo com consultas periódicas realizadas pelo ACNUR junto aos refugiados e solicitantes de refúgio vivendo no país, a geração de renda é uma das maiores dificuldades para a integração no país. Por isso, a agência da ONU trabalha para facilitar o acesso da população sob seu mandato ao mercado de trabalho, em colaboração com setor privado, a sociedade civil e o Poder Público.

Neste sentido, o ACNUR está promovendo com o Ministério do Trabalho uma série de oficinas de treinamento para identificar oportunidades e propor iniciativas em prol da inserção de refugiados e solicitantes de refúgio no mercado de trabalho brasileiro. Já foram realizadas oficinas no Rio de Janeiro e em São Paulo, nas quais foram capacitados profissionais que atuam nos postos de atendimento ao trabalhador, com um protocolo específico para o atendimento a refugiados e solicitantes de refúgio. O PARR é outro resultado destas oficinas.

Para o representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez, os refugiados podem contribuir economicamente para o desenvolvimento do país, pois, além de representarem uma mão de obra bilíngue, sempre trazem consigo conhecimento, habilidades e experiências. “Não importa que saiam do seu país somente com a roupa do corpo. A grande parte dos refugiados tem potencial para encontrar um emprego e alcançar a autossuficiência”, afirma o representante do ACNUR.

O Brasil possui cerca de 4.500 refugiados, de 77 nacionalidades diferentes. A maioria desta população (64%) vem da África, seguida pela região das Américas (22%) e da Ásia (10%). Dentre os países de maior representatividade, estão Angola (38%), Colômbia (14%) e República do Congo (10%).

Janaína Galvão

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