Abrigo em Assis Brasil tem cerca de 40 migrantes — Foto: Quedinei Correia/ Arquivo pessoal
O fluxo de
migrantes nas cidades da fronteira do Acre com o Peru aumentou nos últimos
dias, segundo grupos organizados que acompanham essa situação no estado. Desde
junho deste ano, a portaria 655 mantém as fronteiras terrestres fechadas por
conta da pandemia.
Porém, os
grupos dos migrantes tentam achar rotas alternativas para chegar ao Brasil ou
sair dele, por isso, o Acre se torna uma das principais rotas dessas passagem.
São duas
situações que fazem com que o número de imigrantes cresça na cidade de Assis
Brasil; a primeira, a de migrantes que entraram no Brasil entre 2010 e 2016 em
busca de uma vida melhor e, com a crise da pandemia, tentam sair do país para
seguir viagem até México, Canadá, Estados Unidos e outros países.
A segunda é
que o Peru, mesmo fechando a passagem para a entrada de imigrantes, libera a
saída deles para o lado brasileiro, então, é uma porta de entrada para
venezuelanos. Nos últimos dias, uma nova decisão do governo peruano fez com que
mais venezuelanos cheguem ao estado acreano.
Segundo o
departamento de proteção e defesa dos direitos humanos, o governo do país
vizinho determinou um prazo para que todos os migrantes que não estejam com a
documentação regularizada saiam do Peru.
O secretário
de Assistência Social de Assis Brasil, uma das principais rotas desse grupo,
Quedinei Correia, diz que atualmente há cerca de 40 migrantes na casa de
passagem que fica no município. Segundo ele, esse fluxo oscila bastante
diariamente.
“Em Assis
Brasil, a demanda de migrantes com saída para o Peru que são em sua grande
maioria haitianos e cubanos também, porque eles estão tentando sair do Brasil
para seguir viagem para o México, EUA e Canadá. Então, diariamente você vê
grupos e caravanas saindo, entretanto, têm entrado muitos venezuelanos que estão
vindo pela Colômbia, chegam no Peru e seguem para Assis Brasil”, explica ao se
referir sobre as rotas.
Como suporte
a esses grupos, Correia explica que eles fazem cadastramento e que levam esses
migrantes até Epitaciolândia, que é onde é retirada a carteira de refúgio.
Depois disso, o secretário diz que a prefeitura tenta dar apoio logístico para
que eles consigam seguir para outros estados.
“Os próprios
migrantes contam que o Peru tem dificultado muito a estadia deles lá. Os
venezuelanos que estão saindo do Peru para o Brasil contam que estão sendo
maltratados e que o governo peruano dificulta e encarece a retirada de
documentos. Além disso, emitiu uma nota para que todos eles saíam de lá, então,
esse volume de chegada de venezuelanos por essa rota tem aumentado mais”, diz.
O estado
nesses casos também conta a sociedade civil organizada, como a Pastoral do
Migrante da Cáritas Diocesana. Esse grupo faz o trabalho de acolhimento,
suporte e consegue mantimentos para esses estrangeiros.
Um dos casos mais marcantes da pressão peruana em cima dos migrante é do haitiano Jacquenue Bosquet, de 36 anos, que ficou paraplégico após ser obrigado a se jogar da Ponte da Integração, que liga a cidade de Iñapari, no Peru, a Assis Brasil, no Acre. Ele recebeu alta da Fundação Hospitalar do Acre (Fundhacre) no dia 16 de agosto.
Ele contou às
autoridades acreanas que foi obrigado a se jogar da ponte pela polícia peruana
no dia 24 de julho.
Ponte ficou fechada para passagem de imigrantes de Assis Brasil para o Peru este ano — Foto: Arquivo/Prefeitura
Nova casa de
passagem
Aurinete
Brasil, vice-coordenadora da pastoral, diz que foram iniciados novos projetos
junto com as Cáritas suíças, quando serão desenvolvidas ações para garantir a
proteção e garantia de direitos a esses grupos. Ela diz ainda que o aumento na
fronteira já é significativo.
“Quando esse
migrante chega, precisamos detectar quais são as necessidades emergenciais,
porque muitas vezes o serviço público não tem aquele atendimento imediato na
fronteira. Como por exemplo, na semana passada, tinha um migrante com o pé
quebrado e tinha que ser feito todo um procedimento para ele ser atendido em
Brasileia ou Rio Branco”, relembra.
Esse novo
projeto da grupo possibilita que transportes e outros tipos de suporte possam
ser pagos pelas cáritas. “Por meio desse projeto, nós podemos, no caso de não
ter ambulância, conseguir esse transporte mais rápido por lotação. Claro que
isso não se aplica a casos mais graves.”
Aurinete
destaca ainda que a pastoral faz um trabalho de articulação entre as
secretarias municipais e estadual para que os migrantes possam ter os direitos
básicos garantidos a qualquer cidadão que esteja em território brasileiro.
“Nós também
vamos garantir oficinas para que eles entendam os direitos e deveres do Brasil.
A inserção no mercado de trabalho também é importante e é necessário ter essa
garantia no âmbito estadual e intermunicipal, então esse projeto traz isso, trabalha
esse eixo de proteção”.
Outra questão
levantada pela pastoral é o fortalecimento de suporte nas cidades de fronteira
que recebem essa demanda. Para a coordenadora, é necessário também a
implantação de uma nova casa de passagem em Brasileia.
“A casa de
passagem em Brasileia se faz urgente e emergente. Não dá para continuar da
forma como está na fronteira. Porque Assis Brasil, a duras penas, está
conseguindo manter a casa de passagem, mas o espaço não é muito grande, não
comporta muita gente, então precisava que a gente desse um apoio maior para
fluir, para que essas pessoas não fiquem ali represadas em Assis Brasil”,
enfatiza.
Ela diz ainda que a criação do Comitê Estadual de Apoio aos Migrantes, Apátridas e Refugiados (Ceamar-AC) foi um grande passo para novas articulações entre os órgãos.
Venezuelanos estão sendo expulsos do Peru, diz departamento dos Direitos Humanos — Foto: Quedinei Correia/Arquivo pessoal
Comitê
Criado pelo
decreto 7.357 de novembro do ano passado, o Comitê Estadual de Apoio aos
Migrantes, Apátridas e Refugiados (Ceamar-AC) tem visitado as principais
cidades de fronteira para começar a discutir políticas públicas para esses
migrantes.
Maria da Luz,
chefe do departamento de proteção e defesa dos Direitos Humanos, diz que foi
feita uma viagem na fronteira na semana passada e o comitê conversou com os
departamentos de assistência social dos municípios da fronteira e isso acabou
fazendo parte de um relatório.
“Levantamos
algumas questões interessantes e vamos fazer seminários de capacitação para
equipes de todos os municípios. Começamos a planejar isso. Colhemos que tipo de
assistência é dada a esses migrantes e o que o Estado precisa dar suporte,
junto com o governo federal, para que os municípios façam esse trabalho”,
explica.
Assim como
Aurinete, Maria da Luz acredita que o clima de tensão no Peru entre o governo e
os migrantes vai fazer com que essa demanda aumente ainda mais no lado brasileiro.
Por isso, o comitê tem se reunidor e traçado algumas estratégias junto com
órgãos municipais e também grupos como a pastoral do migrante.
“O Peru
fechou a fronteira por mais 180 dias, então temos ainda até o final do ano de
entrada desses migrantes por meio convencionais ou não. Os migrantes que não
têm condição de pagar essa regularização do Peru, que, segundo eles próprios,
sai muito cara, estão sendo expurgados e a gente já sente o resultado disso”,
pontua.
Diariamente,
estão entrando entre oito a 10 migrantes por dia por Assis Brasil. Porém, a
coordenadora do departamento de Direitos Humanos diz que os migrantes já estão
cientes da dificuldade do lado peruano e que isso deve aumentar esse fluxo não
só em Assis Brasil, mas em outras cidades.
Ela destaca que a construção de uma casa de passagem em Brasileia já foi tema de debate, mas que estratégias devem começar a ser definidas de forma mais efetiva após o comitê se reunir com os representantes de assistência social de todas essas cidades para poder traçar estratégias mais eficazes.
Imigrantes Assis Brasil, Acre furante ocupação da ponte este ano — Foto: Raylanderson Frota
Crise
migratória
A situação
dos imigrantes começou a ficar tensa no interior do Acre no dia 14 de
fevereiro, quando eles deixaram os abrigos que ocupavam e se concentraram na
Ponte da Integração. No dia 16, os estrangeiros enfrentaram a polícia peruana e
invadiram a cidade de Iñapari, no lado peruano da fronteira. Depois de
confronto, o grupo foi mandado de volta para Assis Brasil.
Os estrangeiros que estão na cidade tentam sair do Brasil usando o Acre como rota. A ponte já chegou a ser ocupada por pelo menos 300 imigrantes, na maioria haitianos. Mais de 130 caminhões chegaram a ficar retidos tanto do lado brasileiro como no peruano e o prejuízo é calculado em mais de R$ 600 mil.
A crise
imigratória resultou na visita do secretário Nacional de Assistência Social, do
Ministério da Cidadania, Miguel Ângelo Gomes, que esteve no dia 19 de março em
Assis Brasil para ver a situação.
Gomes se
reuniu com o governador da Província de Madre De Dios, Luis Guillermo Hidalgo
Okimura, e o prefeito de Iñapari, Abraão Cardoso. Na conversa, segundo a
Agência do Governo do Acre, as autoridades peruanas informaram que o país
avaliava uma forma de abrir a fronteira para liberar a passagem dos imigrantes.
Foi então que
a União pediu a reintegração de posse contra os imigrantes que estavam
acampados na ponte e a Justiça Federal deferiu o pedido no início de março.
Desde então, o número de imigrantes na cidade do interior do Acre reduziu muito
e a prefeitura desativou os abrigos montados em escolas. Um novo abrigo, com
capacidade para 50 pessoas, foi instalado para receber os imigrantes que chegam
ao município.
G1 AC Tácita Muniz,
www.miguelimigrante.blogspot.com
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