Marinete Nunes Oliveira é a mais recente mestra do Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Fronteiras da Universidade Federal de Roraima com a Dissertação intitulada ‘Confluências entre Saúde e Migrações Venezuelanas em Roraima’, na área de Concentração em sociedade e Fronteiras na Amazônia.
A pesquisa objetivou analisar o direito de acesso da população migrante ao Sistema Único de Saúde (SUS) em Roraima, além da organização e compilação de dados sobre essa realidade. A autora observa que a “pesquisa envolveu dois grandes temas, a migração e as políticas públicas de saúde no contexto migratório, ambas se encontram e definem novos rumos ou um novo caminho para a saúde que passa a ser pensada a partir das migrações”.
A autora informa que a “pesquisa pautou-se em revisão bibliográfica com amplo levantamento de dados em fontes oficiais como o Ministério da Saúde (MS), Secretaria de Saúde do estado de Roraima (SESAU) e a Secretaria municipal de saúde de Boa Vista/RR (SMS), além de relatórios públicos de instituições da sociedade civil e Organizações não Governamentais (ONG’s) que atuam na Operação Acolhida”.
Após dois intensos anos de estudos, a pesquisadora que é formada e atua na área da saúde, concluiu que “o sistema de saúde público brasileiro, atualmente conhecido como SUS, é resultado de muitas lutas e pressões populares ao longo da história, entretanto, a saúde pública no Brasil se encontra numa situação extremamente deficitária e negligenciada aos mais pobres”.
Com análises históricas profundas, a pesquisadora afirma que durante o período militar no Brasil, o acesso à saúde foi sistematicamente negado aos mais pobres e que a criação do SUS representa um passo importante no direito à saúde pública, gratuita e de qualidade garantido a toda a população brasileira como um ato de cidadania e de democracia. “Com o fim da ditadura militar e a promulgação da Constituição Federal de 1988 que criou o SUS, a saúde deixou de ser tratada como exclusividade das classes dominantes e passou minimamente a promover o atendimento à população mais pobre, todavia a melhora na equidade do atendimento e o alcance social e geográfico que o SUS proporciona ainda não se configura em um atendimento de excelência e qualidade para toda a sociedade”.
Com relação à necessidade de ampliação do SUS com o aumento da demanda por parte dos migrantes, a autora informa que “a chegada de migrantes em Roraima já acontece há algum tempo, uma vez que este é um Estado formado por diversas etapas migratórias, contudo, ainda não existe uma legislação específica que determine a oferta da saúde pública voltada para os migrantes apesar deste direito ser garantido constitucionalmente”.
Às voltas com o tema da saúde pública, no campo político, criou-se um discurso que gerou, e continua gerando, xenofobia institucional “inclusive durante as eleições de 2018, muitos candidatos que colocaram como proposta de campanha o fechamento da fronteira para impedir a entrada de venezuelanos foram eleitos”, afirma a pesquisadora que esclarece também que “quando se fala em crise do sistema de saúde, é relativo ao financiamento da saúde, ou seja, ao montante de recursos empenhados e às estratégias de alocação e utilização desses recursos”.
Sobre as despesas e receitas totais, entre os anos de 2016 e 2020, período de aumento das migrações na cidade de Boa Vista, a pesquisadora “esclarece que, somente no município de Boa Vista, se por um lado as despesas aumentaram na ordem de R$ 262.508.951,69, as receitas cresceram na ordem de R$ 412.493.549,59, ou seja, neste contexto pode-se dizer que a chegada dos venezuelanos gerou mais receitas do que despesas para o município de Boa Vista”.
Quando ao Estado de Roraima, a pesquisadora esclarece que o problema não é a falta de recursos e sim a diminuição dos investimentos. Ou seja, “o recurso chega, mas, os municípios, obrigados por lei a investir no mínimo de 15% de seu orçamento total na área da saúde, vem reduzindo paulatinamente este investimento e desviando este recurso para outras finalidades”. E complementa que “esse investimento que era de cerca de 18% em 2016 caiu para 11% em 2020 em praticamente todos os municípios de Roraima”.
A dissertação apresenta os dados orçamentários e uma detalhada planilha de despesas com saúde em cada município de Roraima e “confirma a confluência entre migração e saúde uma vez que as migrações provocam mudanças importantes tanto no que se refere à abertura das estruturas da sociedade para atender e assegurar a saúde dos migrantes como no tangente à ampliação e melhoria dos sistemas de saúde para a população como um todo”. Afirma a pesquisadora que ainda chama atenção para o fato de que “a confluência entre migrações e saúde resulta em um novo caminho que revela a importância dos migrantes para provocar melhorias nos diversos setores da sociedade”.
Nas suas conclusões a mestre em Sociedade e Fronteiras afirma que “a pesquisa contribui para desconstruir a narrativa de que o colapso no sistema de saúde de Roraima é culpa exclusiva da chegada de migrantes venezuelanos. Ao contrário disso, os dados e estudos levantados e analisados, demonstraram que não há um investimento proporcional ao aumento da demanda e que a resposta das autoridades sobre a questão foi a de criar uma narrativa xenófoba que os exime das responsabilidades legais, sobretudo com relação às falhas no aparelhamento e atualização do SUS”.
Por mim orientada, a dissertação foi avaliada e aprovada pelas professoras doutoras Eliane Silvia Costa do Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia e Maria das Graças Santos Dias da Universidade Federal de Roraima que orientaram a nova mestra a seguir aprofundando o tema em futuros estudos. O texto completo está disponível na página do programa: www.ufrr.br/ppgsof para download gratuito.
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