Embora o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, tenha dito que os 245 haitianos que estão desde janeiro na cidade peruana de Iñapari, na fronteira com o Brasil, já podem ingressar no país, o grupo segue impedido de entrar.
"A decisão foi comunicada à Polícia Federal nessa quarta-feira e já está valendo. Agora estamos organizando para que a entrada se dê gradativamente", afirmou Abrão à BBC Brasil.
Mas na sexta-feira o grupo disse à reportagem que ainda não havia recebido autorização para cruzar a fronteira.
"Os policiais dizem que não podemos passar, porque não receberam qualquer informação", diz o haitiano Facius Etienne.
Conforme mostrou reportagem da BBC Brasil na semana passada, o grupo estava a caminho do Brasil quando, em 12 de janeiro, o governo editou uma resolução do Conselho Nacional de Imigração determinando a concessão de cem vistos por mês e passou a barrar a entrada de haitianos sem vistos. Desde então, aguardam em Iñapari, onde dormem em praças e dependem de doações para se alimentar.
A reportagem tentou novo contato com o Ministério da Justiça para questionar por que a medida ainda não foi aplicada, mas não obteve resposta.
Regularização
Segundo Abrão, tão logo entrem no Brasil, os haitianos serão enviados a Rio Branco, onde receberão uma carteira de trabalho temporária e terão sua regularização migratória acelerada, até a expedição do visto permanente. Ele diz que o traslado até a cidade ficará a cargo do governo do Acre, que disponibilizará ônibus para transportar 60 pessoas de cada vez.
Abrão afirmou que o governo federal também acelerará a regularização dos 363 haitianos que chegaram em Tabatinga, no Amazonas, pouco após a mudança nos procedimentos migratórios para o grupo. Pela resolução nº 97/2012 do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), de 12 de janeiro, definiu-se que a embaixada do Brasil no Haiti passaria a conceder cem vistos de trabalho ao mês para haitianos que quisessem morar no país. Paralelamente, haitianos sem vistos passaram a ser barrados nas fronteiras.
Embora tenham conseguido entrar, os haitianos em Tabatinga esperam pelo visto para buscar trabalho em outras regiões do país.
Abrão não quis, porém, dar um prazo para que a situação de todos os haitianos em Iñapari e Tabatinga seja regularizada, dizendo que isso dependerá da capacidade administrativa dos órgãos competentes.
Sem brechas
De acordo com o secretário nacional de Justiça, a decisão de acolher os haitianos na fronteira "é uma demonstração inequívoca da disposição do Brasil em dar conta da integralidade da situação, sem deixar brechas que excluam qualquer contingente". Ele nega que o governo tenha falhado por não ter contemplado, na resolução do CNIg, os haitianos que estavam em trânsito quando a medida foi publicada.
"Não temos autonomia para regulamentar situações de estrangeiros presentes em outros países, mas depois disso nos confrontamos com a realidade da permanência na região da fronteira e do posicionamento dessa população em lá permanecer com ânimos de ingressar no Brasil", diz.
O impasse em torno dos haitianos em Iñapari ocorre no momento em que o Brasil endurece a entrada de estrangeiros no país. Segundo reportagem da Folha de S. Paulo publicada nesta semana com base em dados da PF, o número de estrangeiros barrados ao tentar entrar no Brasil cresceu mais de 1.000% entre 2008 e 2011.
Abrão não quis comentar os dados, afirmando que são competência da PF, mas disse que o aumento se justifica diante do crescimento do fluxo de estrangeiros ao Brasil.
"Não existe disposição do governo em estabelecer restrição de estrangeiros no Brasil, e o melhor exemplo disso é caso dos haitianos."
Segundo o secretário, trata-se de "uma situação extraordinária, que não estava nos parâmetros regulares migratórios, e que obrigou o país a tomar medidas especiais" para regularizar a situação dos migrantes.
Ele diz ainda que o projeto do governo para o novo Estatuto do Estrangeiro, em tramitação no Congresso, inclusive facilitará a migração em alguns casos.
De acordo com o Ministério da Justiça, há cerca de 4 mil imigrantes haitianos no Brasil. A grande maioria chegou depois que, em 2010, um terremoto devastou o país caribenho.
Ao mudar os procedimentos migratórios para o grupo, o governo disse levar em conta razões humanitárias, em virtude "do agravamento das condições de vida da população haitiana em decorrência do terremoto". No entanto, a ação foi criticada por ativistas de direitos humanos, que a classificaram como uma tentativa do governo de restringir a entrada de haitianos.
BBC BRASIL
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