Rosa M. Martins
Refugiados afegãos recebem ajuda no Aeroporto de Guarulhos (fotos: Rosa M. Martins)
“Meu marido foi decapitado pelo Talibã há cinco anos, por
isso resolvi deixar o pais com meu filho de 9 anos”, relata uma refugiada
afegã, odontóloga, entre as centenas pessoas que estão fugindo do país em
direção ao Brasil. Desde janeiro deste ano, o Brasil tem presenciado a chegada
em massa de afegãos que estão deixando o país após tomada do poder pelo Talibã.
Impedidos de viajar para qualquer país do mundo, graças ao visto humanitário
oferecido pelo governo brasileiro o Brasil está sendo para eles a porta aberta
da esperança de paz e de distância do grupo extremista. Porém, não basta abrir
as portas. É preciso oferecer, as mínimas condições para recomeçarem as suas vidas.
O campo de refugiados improvisado dentro do aeroporto de
Guarulhos, desde de 19 de agosto deste ano tem provocado a sociedade civil a se
mobilizar para além das suas forças para sanar as necessidades básicas destas
pessoas. Chama a atenção o número de jovens (na sua maioria moças), todos
voluntários que se deslocam, em revezamento, para cuidar destes refugiados,
desde limpeza, coleta do lixo à distribuição e organização das doações. Entre
estes grupos está a juventude scalabriniana de Santo André, SP que tem
divulgado a realidade nas redes sociais e sensibilizado a Igreja e a sociedade
sobre a situação. A ativista Swany Zenobini, criadora do coletivo “Frente
Afegã”, formado por pessoas voluntárias de boa vontade, como jornalistas,
pastores, empresários, terceiro setor, para acompanhar este campo de refúgio,
explica que “o trabalho feito por nós é de assistência às necessidades básicas
destes refugiados e refugiadas, como alimentação, uma manta, um colchão,
banho...”. De acordo com a jovem voluntária Catherini Suzane, muitos refugiados
já foram alocados em casas de acolhida na capital paulista e no interior, mas a
cada desembarque, 20, 30 afegãos entram no Campo. “Na verdade, estamos
enxugando gelo”, afirma.
Familia de sociológo, improvisou sua casa no aeroporto de Guarulhos (foto: Rosa M. Martins)
O perfil dos refugiados
Os refugiados que ocupam o campo do aeroporto são mulheres,
grávidas, crianças desde o colo à adolescência. A faixa etária vai de dois
meses de vida aos 45 anos. 0,5% destes são idosas. A maioria destes afegãos e
afegãs são homens e mulheres que tinham uma vida estruturada e bom emprego no
país, entre eles sociólogos, médicos, jornalistas, dentre outros. Mohammad é um
jovem afegão que atuava como ativista de Direitos Humanos. Ele conta que o
Afeganistão está literalmente em fuga por causa do grupo extremista. “Todos os
afegãos estão vulneráveis, por isto estamos fugindo de lá. Todos os que estão
aqui neste Campo (do aeroporto), fugimos para proteger nossas vidas”.
Dia do banho
Desde a semana passada, o coletivo Frente Afegã tem
organizado o dia do banho, que é a segunda-feira. Neste dia, famílias,
empresas, pessoas de boa vontade, se organizam para levar os refugiados e
refugiadas em suas casas ou empresas, para tomarem banho. Até então há mais de
15 dias não tiveram essa possibilidade.
O Talibã e a tomada do poder
Há um ano os EUA, por
causa dos atentados de 11 de setembro de 2001, retiraram suas tropas do
Afeganistão, após 20 anos de ocupação. O presidente afegão Ashraf Ghani deixou
o país, e os talibãs assumiram o controle do palácio presidencial, com um
sistema de governo fundamentalista, o que resultou na fuga em massa dos
afegãos.
Quando uma jornalista se comove
O jornalista ou a jornalista são profissionais que pelas
regras acadêmicas devem ser imparciais e nem falar de si próprio em uma
matéria. Mas eu fugirei às normas para partilhar uma experiência vivida com uma
família no Campo, a qual tenho vontade de adotar. O sr. Hassem (nome fictício),
é sociólogo e lecionava em uma universidade no Afeganistão. Eu havia saído de
casa com minha amiga Roseli em direção ao campo de refugiados de Guarulhos. Meu
coração estava a mil por hora de emoção por poder fazer um pouco de bem a esses
meus irmãos, dar-lhes um abraço, apertar-lhes a mão, fazer uma foto.
Caminhávamos pelo campo e distribuíamos as coisas que
havíamos levado, como fraldas descartáveis e alimento não perecível. Entre um
abraço e outro, uma história e outra, um sorriso e outro, cheguei na casa
improvisada do sr. Hassem que estava com sua “casa” em ordem, sentado em roda
com sua família, sobre lindos tapetes afegãos, tudo limpinho, sapatos à
entrada. Eu disse: Hi, how are you? Ao que imediatamente sr. Hassem respondeu
com um largo sorriso apontando para o lugar onde deveria me sentar, na roda. “Sit down please! This is our house!
(Entre e sente-se por favor. Essa é a nossa casa”).
Refugiados no Aeroporto de Guarulhos
Segurei as lágrimas, porque fui acolhida antes de acolher,
tirei os sapatos para me sentar naquele espaço sagrado, sagrado porque eu vi
Deus ali (lágrimas). Sua esposa, me ofereceu um chá. Ferveu a água, com um
sorriso largo, enquanto conversava com seu esposo. Tomei um chá afegão ‘da
hora’. E ficamos amigos. Retornei lá neste final de semana e lhes presentei com
chás brasileiros de camomila e de hortelã.
Para ajudar, escreva para euacolhorefugiados@gmail.com
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