O espanhol Eduardo Arroyo, que morreu em 2018, mudou-se para Paris em busca de novas experiências estéticas(foto: Gerard Julien/AFP/7/03/17 )
Museu da História da Imigração, na capital francesa, destaca
24 criadores que se mudaram para a cidade depois do fim da Segunda Guerra
Mundial
Depois da Segunda Guerra Mundial, Paris manteve seu papel de
refúgio para artistas estrangeiros. Exposição recém-inaugurada na capital
francesa evidencia as dificuldades daquele período.
“Conhecemos muito bem os artistas que já estavam em Paris
antes da guerra, até a década de 1940”, explica Jean-Paul Ameline, curador da
mostra “Paris et nulle part ailleurs”.
Pablo Picasso, Wassily Kandinsky e Marc Chagall são alguns
dos nomes de destaque em meio ao vendaval de ondas artísticas que chegavam, ou
começavam, na capital francesa.
O argentino Antonio Seguí, que morreu este ano, em Buenos Aires, pediu para ser enterrado na capital francesa(foto: Geoffroy Van Der Hasselt/AFP/5/6/19 )
Imigração
Depois da guerra, artistas continuaram desembarcando
incessantemente em Paris. “Acreditamos que foram cerca de 10 mil”, informa
Ameline. A mostra organizada pelo Museu da História da Imigração em Paris
ficará em cartaz até 22 de janeiro.
Ameline e equipe escolheram 24 artistas representantes do
pós-guerra, que chegaram à capital francesa entre 1945 e 1972.
Entre eles há muitos latino-americanos. É o caso do
argentino Antonio Seguí (1934-2022), pintor, escultor e entalhador, assim como
de sua compatriota, a escultora Alicia Penalba (1913-1982).
Destacam-se, igualmente, o pintor cubano Wifredo Lam
(1902-1982), acolhido com braços abertos por Picasso e seguidores do cubismo.
Assim como o chileno Roberto Matta (1911-2002), que passou do surrealismo a
pinturas mais comprometidas com a política.
É uma presença gigantesca de criadores, “mas bastante
desconhecida”, observa o curador Jean-Paul Ameline.
A França estava em ruínas após a guerra, e o conflito
esvaziou as escolas artísticas. Em meio a esse cenário atomizado, os Estados
Unidos e o expressionismo abstrato pareciam dominar.
Embora alguns artistas tenham decidido explorar essa
tendência artística, eles continuavam desembarcando na França, atraídos pela
liberdade que Paris oferecia.
Os mais sortudos conseguiam vender nos Estados Unidos, como
Picasso ou Salvador Dalí já faziam, sem abrir mão da vida boêmia parisiense.
O haitiano Télémaque, de 84 anos, deixou os EUA na década de 1960 para enfrentar o racismo em Paris(foto: Jacques Demarton/AFP/23/2/15 )
Racismo
Porém, nem sempre as coisas corriam bem. O haitiano
Télémaque, que abraçou na década de 1960 a pop art, tipicamente americana,
instalou-se em Paris porque não se sentia confortável em Nova York.
Ao descobrir o racismo em Paris, o preconceito se refletiu
em seus quadros. A tela “A bas les nègres”, de 1967, foi pintada depois de
Télémaque ler um grafite no metrô.
“Escolhemos esses artistas pela maneira como viveram o fato
de serem migrantes”, conta Ameline.
Eduardo Arroyo (1937-2018), filho de um falangista espanhol,
decidiu emigrar para Paris não como perseguido político, mas em busca de novas
experiências.
A húngara Judit Reigl (1923-2020) chegou a Paris em 1950,
após fugir de seu país, que enfrentava a ditadura comunista.
“Eles tiveram permissão para trabalhar e suas vidas foram
facilitadas. Foram testemunhas do renascimento cultural da França”, detalha Jean-Paul
Ameline, que foi curador-chefe do Centro de Arte Contemporânea Georges
Pompidou. “Mas isso não significa que conseguiam vender imediatamente.”
Pintura 'Pour les refugies espagnols' do cubano Wilfredo Lam, influenciado por Picasso, aborda o exílio político(foto: Emmanuel Dunand/AFP12/11/10 )
Apagão
A vida parisiense, com seus encontros e dificuldades, marcou
a trajetória dos artistas migrantes, até esse foco cultural ser apagado
progressivamente na década de 1970. O relativo apagão artístico de Paris
coincide com o fim dos chamados Trinta Gloriosos, referente às três décadas
depois de 1945.
Naquele período, a França registrou extraordinária
recuperação econômica, da mesma maneira que toda a Europa Ocidental, em grande parte
graças à ajuda americana.
Alguns artistas, como Eduardo Arroyo, decidiram voltar para
casa. No caso dele, a Espanha voltou a ser uma democracia.
Um ciclo foi encerrado, embora com exceções. O argentino
Antonio Seguí, que pintou no quadro “Cuando te vuelvo a ver” (1985) um homem
com a cabeça em Buenos Aires e os pés no vazio, morreu aos 88 anos, em
fevereiro de 2022, na sua terra natal.
Seguí pediu para ser enterrado em Arcueil, nos arredores de
Paris, onde manteve sua oficina durante a juventude.
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