A CBN começa a veicular nesta segunda-feira a série 'Por um teto, por um fio', sobre o problema da moradia no Brasil. São histórias de quem sobrevive com a ameaça constante de parar na rua: do catador de papelão à refugiada do Congo, do migrante nordestino à boliviana desempregada. O 'boom' imobiliário, seguido pela recessão e aumento do desemprego, gerou uma onda de ocupações nos centros urbanos e jogou mais pressão sobre esse problema histórico do Brasil.
Por Guilherme Balza
Favelas, cortiços, palafitas, loteamentos clandestinos, ocupações. Mas também fazendas, latifúndios e condomínios de luxo. A história da ocupação das terras urbanas e rurais no Brasil é a história da ocupação irregular. Essa é a regra. Moradia legalizada é exceção. É o que diz o urbanista Kazuo Nakano, professor da Universidade Federal de São Paulo:
"Boa parte de Alphaville [condomínio de luxo na Grande São Paulo] é terra da União. Os condomínios de alto padrão ao redor do Lago Paranoá, em Brasília, uma boa parte deles estão irregulares. Os condomínios fechados de Goiânia são todos irregulares. Quando fizeram a quantificação das terras nos cartórios de imóveis do estado do Pará viram que a quantidade de terras registradas era duas vezes maior que o estado do Pará. Você tem uma situação de irregularidade da terra que é gigantesca no país. Você tem juízes morando em loteamentos irregulares no estado de São Paulo. Então, a ocupação irregular da terra urbana por parte do movimento de luta por moradia é um pingo."
No período colonial, a terra só poderia ser doada pela Coroa Portuguesa, com critérios rigorosos. Índios e escravos obviamente não tinham direito. Mesmo a maioria dos brancos ficava de fora. Em 1850, veio a lei de terras, que acabou com as doações. A terra teria que ser comprada. De novo, a grande massa, sem dinheiro, estava excluída.
A industrialização e o êxodo rural a partir dos anos 1960 inflaram as cidades. Ao contrário do que aconteceu na Europa, esse processo aconteceu sem investimentos em habitação para atender essa população migrante e sem a noção de bem-estar social.
O sem-terra do campo virou o sem-teto da cidade.
A professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Ermínia Maricato, diz que quem sempre resolveu o problema da moradia nas cidades brasileiras foi o mercado ilegal ou informal. Loteamentos clandestinos nos extremos, vendidos por pequenos especuladores, onde as casas eram erguidas pelos próprios moradores. Além, claro, das favelas em encostas de morro, beiras de córregos e outros lugares rejeitados.
"Se você ganha dois salários mínimos você tem que escolher se você come, mora ou se transporta. Historicamente, parte da nossa população, no processo de urbanização, ela é compulsoriamente remetida à ocupação ilegal. Quando se fala, se enche a boca para falar 'aquilo é uma ocupação irregular' e, de repente, quer dizer que aquilo está ligado ao crime organizado, mostra uma profunda ignorância do que acontece hoje com a ocupação do solo no Brasil inteiro", diz a professora.
Em São Paulo, um terço da população, ou quatro milhões de pessoas, moram em imóveis irregulares, ou seja, sem a escritura. Em grandes cidades do Nordeste e da Amazônia o percentual chega a mais de 70%.
O resultado disso é o que alguns urbanistas, como a ex-relatora da ONU para moradia Raquel Rolnik, chamam de "permanência da transitoriedade" da população pobre. Ou seja, uma massa perambulando no tempo e no espaço atrás de um lugar pra viver. Da favela pra rua, da rua pra ocupação, da ocupação pra favela.
"Quando nós trabalhamos na Ocupação Douglas Rodrigues, na Vila Maria (Zona Norte de São Paulo), que agora inclusive está ameaçada de remoção, tinha gente que já tinha passado por oito remoções. Oito reintegrações na vida. Então é uma vulnerabilidade permanente. É uma absoluta falta de estabilidade. Porque a moradia não é só quatro paredes e um teto. Especialmente para quem tem uma renda muito baixa ela é basicamente um lugar a partir do qual você estabelece uma rede de proteção e sobrevivência", afirmou Rolnik.
Na segunda reportagem da série "Por um teto, por um fio", vamos falar de um fenômeno muito comum entre os anos 1970 e início dos 1990, responsável por formar bairros inteiros nas grandes cidades: as ocupações espontâneas, que agora voltaram com força após o boom imobiliário seguido pela recessão econômica.
Favelas, cortiços, palafitas, loteamentos clandestinos, ocupações. Mas também fazendas, latifúndios e condomínios de luxo. A história da ocupação das terras urbanas e rurais no Brasil é a história da ocupação irregular. Essa é a regra. Moradia legalizada é exceção. É o que diz o urbanista Kazuo Nakano, professor da Universidade Federal de São Paulo:
"Boa parte de Alphaville [condomínio de luxo na Grande São Paulo] é terra da União. Os condomínios de alto padrão ao redor do Lago Paranoá, em Brasília, uma boa parte deles estão irregulares. Os condomínios fechados de Goiânia são todos irregulares. Quando fizeram a quantificação das terras nos cartórios de imóveis do estado do Pará viram que a quantidade de terras registradas era duas vezes maior que o estado do Pará. Você tem uma situação de irregularidade da terra que é gigantesca no país. Você tem juízes morando em loteamentos irregulares no estado de São Paulo. Então, a ocupação irregular da terra urbana por parte do movimento de luta por moradia é um pingo."
No período colonial, a terra só poderia ser doada pela Coroa Portuguesa, com critérios rigorosos. Índios e escravos obviamente não tinham direito. Mesmo a maioria dos brancos ficava de fora. Em 1850, veio a lei de terras, que acabou com as doações. A terra teria que ser comprada. De novo, a grande massa, sem dinheiro, estava excluída.
A industrialização e o êxodo rural a partir dos anos 1960 inflaram as cidades. Ao contrário do que aconteceu na Europa, esse processo aconteceu sem investimentos em habitação para atender essa população migrante e sem a noção de bem-estar social.
O sem-terra do campo virou o sem-teto da cidade.
A professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Ermínia Maricato, diz que quem sempre resolveu o problema da moradia nas cidades brasileiras foi o mercado ilegal ou informal. Loteamentos clandestinos nos extremos, vendidos por pequenos especuladores, onde as casas eram erguidas pelos próprios moradores. Além, claro, das favelas em encostas de morro, beiras de córregos e outros lugares rejeitados.
"Se você ganha dois salários mínimos você tem que escolher se você come, mora ou se transporta. Historicamente, parte da nossa população, no processo de urbanização, ela é compulsoriamente remetida à ocupação ilegal. Quando se fala, se enche a boca para falar 'aquilo é uma ocupação irregular' e, de repente, quer dizer que aquilo está ligado ao crime organizado, mostra uma profunda ignorância do que acontece hoje com a ocupação do solo no Brasil inteiro", diz a professora.
Em São Paulo, um terço da população, ou quatro milhões de pessoas, moram em imóveis irregulares, ou seja, sem a escritura. Em grandes cidades do Nordeste e da Amazônia o percentual chega a mais de 70%.
O resultado disso é o que alguns urbanistas, como a ex-relatora da ONU para moradia Raquel Rolnik, chamam de "permanência da transitoriedade" da população pobre. Ou seja, uma massa perambulando no tempo e no espaço atrás de um lugar pra viver. Da favela pra rua, da rua pra ocupação, da ocupação pra favela.
"Quando nós trabalhamos na Ocupação Douglas Rodrigues, na Vila Maria (Zona Norte de São Paulo), que agora inclusive está ameaçada de remoção, tinha gente que já tinha passado por oito remoções. Oito reintegrações na vida. Então é uma vulnerabilidade permanente. É uma absoluta falta de estabilidade. Porque a moradia não é só quatro paredes e um teto. Especialmente para quem tem uma renda muito baixa ela é basicamente um lugar a partir do qual você estabelece uma rede de proteção e sobrevivência", afirmou Rolnik.
Na segunda reportagem da série "Por um teto, por um fio", vamos falar de um fenômeno muito comum entre os anos 1970 e início dos 1990, responsável por formar bairros inteiros nas grandes cidades: as ocupações espontâneas, que agora voltaram com força após o boom imobiliário seguido pela recessão econômica.
Natália Mota
Radio CBN
www.miguelimigrante.blogspot.com
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