Não há ainda números definitivos, mas tudo indica que entre 2005 e 2008 o número de portugueses que decidiu ir viver para o estrangeiro foi superior ao de estrangeiros que quiseram imigrar para Portugal. "Um défice migratório" que deve fazer pensar as autoridades.
A conclusão é do sociólogo do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE, Rui Pena Pires, que coordenou o primeiro "Atlas das Migrações Internacionais Portuguesas", que hoje, quinta-feira, é apresentado na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa. E onde se lê que "Portugal não poderia hoje viver sem o contributo da imigração e dos imigrantes", um facto "irreversível e um dado de futuro do Portugal do século XXI".
De acordo com Rui Pena Pires, comparando os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) com os dados disponíveis da entrada de portugueses noutros países entre 2005 e 2008, tudo indica que "foram mais as saídas do que as entradas", embora ainda não as consiga quantificar.
A imigração africana "praticamente parou" na década de 90, muitos dos imigrantes do Leste europeu regressaram aos seus países e o único país de onde continuaram a chegar imigrantes foi o Brasil. Em compensação, o número de portugueses que emigrou para Espanha triplicou (mais de 15 mil por ano nos últimos cinco anos), mais de 12 mil por ano decidiram rumar ao Reino Unido e cerca de 10 mil partem todos os anos para Angola.
Um movimento que Rui Pena Pires considera natural - dadas as taxas de crescimento e de criação de emprego que aqueles países registavam, antes da crise - mas que não teve correspondência com a entrada de imigrantes em Portugal, o que poderá ditar um saldo migratório negativo e comprometer o crescimento do país.
"Este défice tem consequências no plano demográfico, normalmente associado à sustentabilidade dos sistemas de protecção social. Mas não só nesse plano: eu não conheço nenhuma economia que cresça com a população a diminuir", disse, ontem, ao JN, o investigador, lembrando que, ao contrário do que se passa no Reino Unido, "Portugal não está a conseguir atrair pessoas qualificadas do resto do mundo que compensem estas saídas".
O problema não está no número de portugueses que emigram - segundo o investigador, Portugal está dentro da média da União Europeia, mesmo no que se refere aos 13% de portugueses com qualificações que decidem emigrar (cerca de 90 mil em 2000) - mas no facto de o país não estar a conseguir atrair imigrantes que compensem essas saídas.
E, insiste, "há coisas simples que o Estado pode fazer para tornar Portugal um país muito mais atractivo", como simplificar o processo de legalização e ter políticas mais agressivas de captação de imigrantes qualificados. "Há países na UE onde o facto de um estrangeiro concluir lá um grau de ensino superior lhe dá quase que automaticamente acesso a um título de residência de longa duração", diz, apontando também as dificuldades de reconhecimento dos graus académicos.
De acordo com o atlas, há 2,3 milhões de portugueses espalhados pelo mundo, contra menos de meio milhão de estrangeiros a viver em Portugal.
A emigração portuguesa ao longos dos últimos 100 anos processou-se por fases. No século XX, até à II Guerra Mundial, houve um período de emigração muito grande para o Brasil. Depois para os Estados Unidos, Canadá e Venezuela. Durante a década de 60, foi a fase da grande emigração europeia: França, Alemanha e Luxemburgo. Com o 25 de Abril, a emigração praticamente parou e registou-se o regresso de meio milhão de portugueses que viviam nas ex-colónias.
A retoma deu-se com a entrada na União Europeia, primeiro para a Suíça, depois por todos os países da UE. Mais recentemente, a escolha recai em Angola.
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