A Organização Internacional para as Migrações (OIM) acaba de divulgar os
resultados de um novo estudo sobre tráfico e exploração de seres humanos. Esta
terça-feira, Dia Anti-Escravatura, esta importante entidade intergovernamental
revelou que quase três quartos (71%) dos migrantes que arriscam fazer as rotas
do Mediterrâneo Central que ligam o norte de África à Europa foram objecto de
vários tipos de exploração e de tráfico de seres humanos.
Este número resulta de quase nove mil entrevistas anónimas feitas a
migrantes nos últimos dez meses depois de percorrerem as rotas do Mediterrâneo
Central e Oriental. No comunicado que tem online, a
OIMinforma que “este estudo é a primeira tentativa de quantificar a
prevalência destas práticas de exploração de forma a realçar a sua escala e a
sua frequência alarmantes”.UB
Estes migrantes que procuram refúgio na Europa ficam à mercê de
criminosos no longo caminho que têm de percorrer e são muitas vezes mantidos em
cativeiro ou a trabalhar sem serem pagos. Quase metade (49%) dos entrevistados
que fizeram a rota do Mediterrâneo Central disseram ter
sido obrigados a permanecer em determinado local contra a sua vontade e, com
frequência, a trocar a sua liberdade por um resgate. A maioria dos casos
registados aconteceu na Líbia.
O trabalho forçado é muitas vezes a única maneira de garantir um lugar
num barco para atravessar o Mediterrâneo. Um barco que
viajará certamente sobrelotado e que pode nunca chegar à costa.
“Sabe-se ainda muito pouco sobre
a escala deste negócio ou quanto dinheiro está a ser feito com a infelicidade e
o trabalho das pessoas que fogem da guerra e da pobreza”, disse ao diário
britânico The Guardian Simona Moscarelli, especialista em
anti-tráfico que trabalha para a Organização Internacional das Migrações. “O
que este estudo mostra é que as redes de tráfico humano estão a tornar-se cada
vez mais brutais e eficazes a explorar e a tirar lucros da vulnerabilidade dos
migrantes.”
O relatório deste órgão das Nações Unidas identifica ainda outra
realidade preocupante – a do tráfico de sangue e de órgãos. Entre as pessoas
inquiridas, 6% admitiram ter visto ou ouvido relatos de pessoas obrigadas a dar
sangue quando estavam em cativeiro ou a pagar com órgãos parte da sua viagem.
O que os dados agora revelados pela OIM também revelam sem margem para
interpretações ou para surpresas é que, quanto mais tempo um migrante está em
trânsito, mais susceptível fica ao tráfico e à exploração. De facto, 79% dos
que passaram um ano ou mais num país diferente do da sua origem foram sujeitos
a pelo menos um tipo de abuso.
A duração da viagem tem diferenças significativas quando comparadas as
rotas do Mediterrâneo Central com as do Oriental: nas primeiras, 35% dos entrevistados
estiveram mais de seis meses na estrada, ao passo que nas segundas o número
desce para 11%.
As rotas orientais, em que os migrantes viajam por terra via Grécia e
Turquia, são muito menos usadas que as do Mediterrâneo Central, o que pode
ajudar a explicar os dados. Nos percursos terrestes, 14% das pessoas apresentam
sinais de tráfico ou de exploração. Desses, 6% estiveram em cativeiro, 7% dizem
ter trabalhado sem qualquer compensação. Episódios de tráfico de sangue e de
órgãos ocorreram na Turquia, Grécia, Albânia, Macedónia e Sérvia.
“A OIM está extremamente preocupada com a exploração e os abusos que os
migrantes têm vindo a experimentar quando se dirigem para a Europa”, diz o
chefe de missão desta entidade no Reino Unido, Dipti Pardeshi, citado no
comunicado que está online. “É importante para nós olhar para a
Europa e para o resto do mundo para vermos o que mais pode ser feito por
aqueles que percorrem as rotas migratórias e por aqueles que já chegaram à
Europa. Temos de nos lembrar que, independentemente das razões que levam as
pessoas a deslocarem-se, ou do seu background, elas merecem
protecção.”
É precisamente desta necessidade de protecção que se impõe que fala
também o comissário britânico anti-escravatura, Kevin Hyland, sublinhando o
facto de a crise dos refugiados estar a alimentar as redes de tráfico humano,
que se aproveitam permanentemente dos mais frágeis. “É preciso agir
urgentemente para proteger estas pessoas”, diz Hyland. “Acredito que a chave
[para resolver este problema] está no Reino Unido e noutros governos assumirem
como prioridade a salvaguarda contra os riscos da escravatura moderna e
integrarem-na na sua resposta à crise dos imigrantes e refugiados”,
acrescenta, falando ainda na necessidade de apertar o cerco aos traficantes e a
todos os que lucram com este esquema de exploração humana.
P Portugal
www.miguelimigrante.blogspot.com
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