A esperança que moveu milhares de haitianos para terras brasileiras
desde 2010 é a mesma que agora direciona muitos deles a destinos longe do país. Não
que falte fibra e persistência à nova geração de imigrantes do Vale. Mas
demissões e escassez de emprego tornaram a permanência na região mais uma
provação para a fé haitiana. Há um ano Morney Nedear, 23 anos, trocou o Haiti
por Navegantes em busca de uma vida melhor. Mas o sonho dourado tem
esbarrado na dificuldade nos tempos de retração. Nem mesmo a experiência da
formação em Direito obtida em uma universidade do Haiti tem facilitado a
conquista de um emprego. A ajuda de amigos que têm em comum não só a
nacionalidade, mas também a fé e a coletividade, é fundamental para continuar a
luta sob o sol do Litoral.
— Muita gente foi embora, mas não quero sair do Brasil. Deus vai
trazer algo bom – profetiza.
Os riscos a serem enfrentados na condição de estrangeiro fazem muitos
haitianos já decididos não falarem sobre os planos de saída do Brasil.
O fato é que o desemprego tem trazido dias sombrios até mesmo para quem
enfrentou o terremoto e as mazelas do Haiti. Raoul Clerveau, 46, ainda
não pensa em sair da casa em que mora, no bairro Itoupava Central, mas sabe
que para isso precisa voltar a ter uma renda mensal para custear a vida em
Blumenau e ajudar a família na terra natal. Precisa fazer com que a
vida seja mais como os dois anos e meio que viveu por aqui e
menos como o último mês, quando perdeu o emprego em uma empresa têxtil.
Histórias de dificuldade como essas se tornaram comuns no círculo de
amigos de Jeanpaulo Poloville Desrosiers, 28. Gazman, como é conhecido entre os
amigos e que significa homem de negócios, aportou em Blumenau em março
de 2013 e foi um dos personagens da reportagem especial Brezilyen,
publicada pelo Santa em junho do ano passado sobre a imigração haitiana no
Vale.
Desde o fim de 2015, Desrosiers afiou o português, coloriu os
cabelos e ajudou conterrâneos. Também viu amigos serem demitidos de
indústrias de setores como têxtil e cristaleiro e partirem para destinos como
Chile, Guiana Francesa e Estados Unidos. Nos dois primeiros, os atrativos
seriam a facilidade de encontrar trabalho e entrar no país e a valorização
do salário em relação ao dólar. Já nos EUA, a migração exige uma jornada
arriscada e cansativa de vários dias por países da América do Sul e Central.
Desrosiers não pretende alçar voo. Quer continuar no Brasil,
preservar a estabilidade que conquistou e ajudar a manter os amigos na região.
— Crise há em
outros lugares e com certeza vai passar. Deus não está dormindo.
JORNAL DE SANTA CATARINA - BLUMENAU
www.miguelimigrante.blogspot.com
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