segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Estudo mostra que 86% dos imigrantes tiveram os direitos violados no Amazonas

No Amazonas, 86,7% dos imigrantes, sendo a maioria haitianos, afirmam ter sofrido algum tipo de violação dos direitos humanos,  segundo a pesquisa ‘Migrantes, apátridas e refugiados: subsídios para o aperfeiçoamento de acesso a serviços, direitos e políticas públicas no Brasil’, do Ministério da Justiça, divulgada na semana passada. 
Parte do projeto  ‘Pensando o Direito’, os dados são resultado de pesquisas realizadas em Manaus, Tabatinga e Benjamin Constant, com participação de 22 instituições responsáveis pelo combate ao tráfico de pessoas e nas políticas de imigração no Estado. 
Conforme o estudo,  75% dos imigrantes afirmam ter sofrido violação dos direitos trabalhista e 25% por discriminação. Outros tipos de violações citadas são 18,15% por trabalho escravo; 13,34% por dificuldades com o acesso a saúde básica e 7,26% com o trabalho servil.
A vendedora de água Beatrice Philomene, 35, que veio do Haiti em 2012, afirmou que ao longo dos três anos que mora na capital do Amazonas, sofreu preconceito apenas uma vez.
“Logo quando cheguei, eu e meu esposo estávamos precisando muito de trabalho e uma mulher pediu para eu lavar roupa e cuidar da casa dela, trabalhei pouco tempo lá, não mais que dois meses porque me sentia discriminada. Não podia passar na sala quando tivesse gente de fora, as filhas dela me olhavam assim meio de lado, foi uma situação muito ruim”, disse. 
Ela conta que era comum o oferecimento de menos de um salário mínimo para trabalhar. “A gente recebeu a informação, nos falaram lá na igreja quanto era o salário mínimo aqui no Brasil e por isso eu não caí nessa, tinha que mandar dinheiro para minha mãe, não podia ganhar tão pouco”, afirmou ela ao lembrar que algumas vagas ofertadas em 2012 pagavam salários de cerca de R$ 500.
Ao contrário da vendedora, o funcionário da fábrica de sorvetes localizada na igreja de São Geraldo, Jean Wilkenson Justin, 29, afirma que nunca sofreu com o preconceito. “Por aí o máximo que falam é: ‘Oi negão, tudo bem negão’, mas eu não me importo porque sou mesmo negão”, disse. 
Segundo ele, em todas as oportunidades que teve no Brasil, a carteira de trabalho foi assinada o que, para Justin, garantiu a ele uma proteção maior.  
Documentação
A pesquisa também divulga que 94,11% dos imigrantes possuem documentação brasileira. A maioria, cerca de 40% teve dificuldade de um a seis meses para conseguir se regularizar e obter documentos nacionais.
Quanto a moradia, 76,9% informaram ter tido dificuldades em conseguir um lugar para morar. Cerca de 80% confirma ter contado com ajuda de instituições públicas para conseguir uma moradia. Todos os alojamentos são alugados, sendo que 70% possuem um lugar próprio. 
No acesso aos serviços públicos de saúde, 69,5% dos imigrantes informaram ter conseguido obter o atendimento. Não há dados disponíveis quanto ao acesso a educação. 
Num geral, os obstáculos e dificuldades enfrentadas pelos imigrantes identificados na pesquisa em Manaus figuram falta de creches; dificuldade de acesso à primeira moradia diante da ausência de vagas em abrigos públicos e curta estadia permitida; valor elevado de aluguéis e inadequação das moradias; obstáculos de acesso ao trabalho por falta de vagas de emprego e baixos salários; falta de acesso à informação; discriminação por parte de órgãos públicos e da sociedade; e violação de direitos trabalhistas.
O estudo concluiu que a grande porta de entrada para a imigração no Estado do Amazonas é a cidade de Tabatinga, que fica localizada na tríplice fronteira (Brasil, Peru e Colômbia). Essa localidade, distante de Manaus (mais de 1000 km em linha reta), possui algumas peculiaridades, como o fato de o controle fronteiriço ser bastante livre. 
Segundo os dados obtidos com a pesquisa, mais de 5 mil haitianos adentraram ao País por aquela fronteira, demonstrando a importância estratégica de um melhor atendimento.  
MJ diz que 50% ganham menos que um salário mínimo
Quanto ao trabalho,  50% dos imigrantes ganham menos de um salário mínimo. Segundo o estudo, 64,4%  possuem algum ente familiar com renda mensal. Cerca de 50% recebem menos de um salário mínimo, 27,75% ganham até dois salários mínimos e 22,25% possuem renda de até um salário mínimo. 
Quando questionados quais as maiores dificuldades e obstáculos encontrados no Brasil, 22,85% dos imigrantes relatam o problema em conseguir um trabalho. A segunda maior dificuldade, 20%, são financeiras e a terceira, 17,15% com o idioma.  Entre os imigrantes 75% reclamam do acesso a trabalho e emprego, com 88,5% dos casos afirmando terem obtido auxílio de instituições públicas de trabalho e emprego.
 
O padre Gelmino Costa, membro da Pastoral do Imigrante em Manaus, que funciona na Paróquia de São Geraldo, zona centro-sul, informa que hoje as dificuldades são grandes para os imigrantes conseguirem emprego e que, a média salarial na capital é de menos de um salário mínimo. “Essa é uma dificuldade real. Em Manaus sempre foi essa média salarial, principalmente porque esses haitianos possuem profissões para essas funções”, disse. 
Gelmino explicou que, atualmente, os haitianos estão com mais dificuldades em conseguir um emprego. O padre disse que antes empresários vinham do Sul em busca dos haitianos e hoje a procura não existe mais. 
“No início, em 2012 e 2013, investidores vinham do sul buscar os haitianos para trabalho braçal. Agora, com os haitianos indo direto para lá, eles não vem mais aqui, pois não precisam ter de pagar passagem para levarem os haitianos”, relatou. 
Hoje, a Pastoral abriga 30 a 40 haitianos desempregados. A instituição auxilia os imigrantes dando moradia, água e alimento, mas é pouco segundo padre Gelmino. “A gente tenta buscar trabalho para eles, damos abrigo e comida, mas não é muita coisa”, explicou. 

 D24AM

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