De junho do ano passado para cá, quando o Peru decidiu fechar sua fronteira com o Acre para frear a disseminação da covid-19, pequenas embarcações se avolumam em um ponto despovoado do rio Acre, no lado brasileiro, abaixo do porto principal da cidade acreana de Assis Brasil.
A movimentação no local vem aumentando com o passar do tempo, registrando mais intensidade durante a madrugada e nas primeiras horas do amanhecer do dia sem que as autoridades locais se atentem ao que está acontecendo ali, mesmo diante do grande número de embarque e desembarque de estrangeiros.
O ACjornal apurou que trata-se de um porto fluvial improvisado, criado por grupos de brasileiros e peruanos que dão travessia aos traficantes de pessoas, chamados coiotes, que agem na região fronteiriça do Brasil com o Peru e a Bolívia, no interior do estado do Acre.
Já vai fazer oito meses que os coiotes utilizam essa travessia no rio Acre para entrar e sair do Brasil escoltando imigrantes clandestinos quer chegam de várias partes do Mundo, principalmente do Haiti e Venezuela.
Antes, eles utilizavam a ponte da integração, que liga as cidades de Assis Brasil, do lado brasileiro, a Iñapari, do lado peruano, mas como o governo vizinho fechou a fronteira e implantou uma barreira sanitária do seu lado, os traficantes passaram a fazer a travessia do rio por meio de pequenas embarcações, conhecidas na região por canoa.
Os colaboradores do esquema cobram, em média, 50 reais por cada imigrante ilegal que atravessa para o Brasil ou leva para o lado peruano.
São apenas 15 minutos rio acima para as canoas atracarem do outro lado do rio e meia hora depois já estarem de volta, lotadas de estrangeiros clandestinos.
Na cidade brasileira ninguém gosta de falar com estranhos sobre a ação dos contrabandistas. Mas o ACjornal conseguiu arrancar algumas informações de um vizinho do porto clandestino, mediante a garantia de que o nome dele não seria citado na reportagem.
“Com essa crise econômica e o desemprego que vivemos, muita gente de bem se a sujeita a prestar esse tipo de serviço na calada da noite. Eu mesmo sou um que já fiz a travessia de estrangeiros aqui”m confessou o senhor de 48 anos.
O ribeirinho revelou ainda que o contratante geralmente é uma pessoa que conhece a estrada interoceânica e que já vem acompanhando os imigrantes durante a jornada deles até a faixa fronteiriça.
“Normalmente a pessoa contacta o barqueiro durante o dia e combina o horário noturno que ele deve estar com a canoa no porto para fazer a travessia. É normal ocorrer atraso no carro que eles vêm e o grupo acaba chegando no porto já pelo amanhecer, como foi o caso desses que vocês conseguiram fotografar”, relatou o ribeirinho.
A reportagem constatou que a travessia do rio é feita simultaneamente por várias canoas em um frenético vai e vem na escuridão em um período de tempo que não dura mais do que meia hora e o local já fica completamente deserto novamente esperando chegar a próxima madrugada para se repetir, tudo, outra vez.
O grupo fotografado por nossa informante se atrasou na estrada e só conseguiu chegar à margem do rio com o dia já claro. Por isso o desembarque do lado brasileiro aconteceu com o sol de fora proporcionando o registro do flagrante.
Enquanto aguardavam os retardatários, os barqueiros contratados para fazerem a travessia, aproveitavam o tempo para pescarem no rio e disfarçar, do olhar de eventuais curiosos, as verdadeiras intenções pelas quais eles estavam ali desde a madrugada.
O prefeito de Assis Brasil, Jerry Correia, confirmou ao ACjornal a veracidade dos fatos narrados nessa reportagem e disse que já informou a existência da situação aos órgãos de fiscalização fronteiriça, mas, segundo ele, até o presente momento não viu nada acontecer para coibir a ação dos contrabandistas de pessoas e teme que ocorra um acidente com os imigrantes na escuridão do rio.
“A travessia ocorre de madrugada e, agora, com a chegada do período de transbordamento do rio e correntezas fortes, a gente teme um acidente que possa vir a resultar em uma tragédia, nunca visto antes, em nossa cidade”.
De Assis Brasil, os imigrantes ilegais seguem de maneira clandestina pela estrada do Pacífico, até a cidade de Epitaciolândia, também no interior do Acre, a 110 quilômetros do ponto de travessia, onde existe uma delegacia da Policia Federal e eles dão entrada no pedido de visto de permanência provisória no Brasil.
Todo o trajeto é feito sob a escolta de coiotes que cobram até três mil dólares por cada pessoas que eles conseguem entrar ou sair com elas do Brasil através da fronteira acreana com o Peru e a Bolívia.
acjornal.com
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