quarta-feira, 21 de julho de 2021

Influência dos imigrantes poloneses, ucranianos e italianos permanece viva até hoje em Irati

 

Imigrantes foram responsáveis por traços culturais, pratos da culinária convencional na região (como o pirogue), apego à religiosidade, definições arquitetônicas, danças e muitos outros aspectos do cotidiano da cidade

Irati completou 114 anos de emancipação política, na quinta-feira (15). O município que se formou com a construção da estrada de ferro carrega consigo a identidade das etnias que trouxeram hábitos culturais, culinária, religiosidade e outras influências, responsáveis pelas características do povo iratiense.

Poloneses, ucranianos e italianos foram a maioria dos imigrantes que vieram para os municípios da região Centro Sul. Além de alemães, holandeses e outras etnias com menor presença.

Depois de mais de um século, Irati permanece com as marcas dos povos que deixaram a Europa, abalados pela Segunda Guerra Mundial e com a propaganda de que no Brasil teriam acesso à terras vastas e férteis para cultivar.  Em busca de uma vida melhor, estes imigrantes europeus se instalaram no município e na região.  Com grandes esforços fundaram igrejas, escolas, desenvolveram a agricultura e ainda nos dias atuais, muitos deles conseguem manter vivas as tradições e os princípios de seus antepassados. 

Religião

Ao chegarem ao Brasil, além de construírem suas casas, os imigrantes buscaram fundar capelas, que depois se tornaram paróquias.  Exemplo disso é a igreja São Miguel,  que ficou conhecida como a  “igreja dos poloneses” ou a “igreja dos polacos”, porque foram integrantes desta etnia que doaram o terreno e a edificaram. A igreja foi transformada em paróquia em 1948, é o símbolo da presença do povo polonês em Irati.

“No dia 26 de agosto é comemorado o dia de Nossa Senhora de Monte Claro ou Częstochowa, que é a padroeira da Polônia, neste dia as igrejas polonesas fazem a missa na língua polonesa”, conta Nelsi Antonia Pabis, descendente de poloneses.

Já a paróquia Imaculado Coração de Maria pratica o rito-ucraniano e faz celebrações na língua ucraniana. “Tudo se iniciava pela igreja, que era e continua sendo para nós o centro de tudo.  Geralmente, junto com as igrejas já se construía um clube, para a parte cultural ser praticada”, relatou o padre ucraniano Deonísio Mazur.

O padre explica que há igrejas católicas do rito-ucraniano e igrejas ortodoxas, como a de Gonçalves Júnior. Ambas foram fundadas por descendentes de ucranianos e preservam a língua. A diferença é que as igrejas ortodoxas ucranianas seguem o calendário juliano, por isso comemorações de Páscoa, Natal e Ano Novo são em datas diferentes.

Educação

Além de terem o ideal de possuir terras para plantar, os poloneses e ucranianos que migraram para a região zelavam também pela educação dos filhos, vida social e cultural. Eles foram responsáveis por várias das escolas fundadas no município. 

Nelsi Pabis afirma que uma das primeiras escolas fundadas pelos poloneses em Irati foi na Serra dos Nogueiras. “Depois dessa, teve uma escola no espaço onde é hoje o Clube Polonês. O modelo de escolas polonesas tem um palco, pois era costume de, nos finais de semana, serem feitas apresentações, teatros e danças pelos alunos e comunidade”, afirma.

No Itapará, que concentrou os descendentes de ucranianos, de acordo com a revista “Irati, Teu Nome é Educação” – uma das publicações editadas por José Maria Orreda, por ocasião do Centenário de Irati –  existia em 1915,  a Sociedade General Joséf Haller. “A escola funcionou  junto à igreja e seu grande incentivador foi o Pe. Inácio Karuse, então vigário coadjutor de Prudentópolis”, diz a revista.

De acordo com a mesma publicação, a primeira escola de Irati foi instalada em 1901, num depósito de erva-mate, nas proximidades da Estação Ferroviária. A primeira professora foi Rosalina Cordeiro do Araújo.

A Escola Estadual Nossa Senhora das Graças foi fundada em 1930, sendo que as irmãs vieram para Irati com o objetivo de cuidar da educação dos filhos dos imigrantes. Atualmente, não há práticas da língua polonesa na instituição, mas as marcas se mantêm nas estátuas, pinturas, e o próprio estilo do prédio remete à arquitetura polonesa.

Tradições

O forte apego à religiosidade faz com que se mantenham entre os ucranianos e poloneses tradições como a bênção dos alimentos a serem consumidos em datas religiosas especiais, como o Domingo de Páscoa.  A maioria das paróquias e capelas de origem eslava do município e da região faz essa benção.

Para simbolizar a ressureição de Cristo, ovos pintados à mão, as Pêssankas ou Pysankas são confeccionadas tanto por descendentes de ucranianos, como por descendentes de poloneses.  As mensagens que estes objetos artesanais frágeis e belos procuram transmitir são de paz, saúde e prosperidade. 

Cores fortes, vibrantes e alegres também permeiam os trajes folclóricos típicos tanto dos ucranianos, como dos poloneses. Cada um com características distintas, mas ambos com bordados feitos à mão. 

Culinária

As culinárias, eslava e italiana, exercem influência significativa na região. Não há quem não conheça o pirogue, o charuto, o vinho, a cerveja caseira e tantos outros alimentos e bebidas que se tornaram naturais no dia a dia, mas tiveram origem com os poloneses, ucranianos e italianos.

Dos italianos a presença forte na culinária está no macarrão, pão, polenta e vinho. “Agora não estamos fabricando muito vinho, mas sempre fazemos um pouco de vinho e de suco, vendemos para as pessoas próximas”, relata Carmem Zanlorensi, descendente de italianos, moradora do Pinho de Baixo.

Maria Gabrieli Zanlorensi é neta de Carmem e conta que a receita do vinho é de seu bisavô, que passou para seu nono, já falecido, Antoninho Zanlorensi. “Eles faziam o vinho de forma bem artesanal para consumo, até que algumas pessoas tomaram e começaram a pedir para comprar, e assim, meu nono foi vendendo aos poucos, para quem procurava”.

A família relata que a receita e tradição de produzir o vinho foi passada de geração em geração, assim como, as receitas dos alimentos, como o macarrão que veio dos antepassados e que se tornou fonte de renda para Carmem e Maria Gabrieli. A avó e a neta  criaram a Pasta Dei Nonni, uma pequena empresa familiar que produz massas caseiras.

“Trabalhamos com os sabores da gastronomia italiana artesanal, colonial e caseira. Produzimos massas frescas, sob encomenda, de vários sabores. Como o macarrão tradicional e também os de sabores de beterraba, cenoura, brócolis/espinafre e manjericão, além da exótica massa de vinho tinto artesanal colonial. Todas as massas são muito nutritivas, feitas com ovos caipiras e a farinha Irati. Trabalhamos com a entrega de kit’s, incluindo, além das massas, o delicioso suco natural de uva, pães e broas caseiras, tudo produzido aqui no Pinho de Baixo, inclusive as uvas do parreiral”, conta Maria Gabrieli.

Na culinária eslava, alguns pratos típicos são:  pirogue -  pastel cozido de requeijão; charuto – arroz temperado, cozido envolto em  folhas de couve ou repolho;   Kutiá - feito de grãos de trigo cozido adoçados com mel, uvas passar, nozes ou castanhas e sementes de papoula;  Borchtch - sopa de beterraba e repolho, servida com pão de centeio; dentre outros.

Língua

Durante alguns períodos da história do País, as línguas estrangeiras eram proibidas no Brasil.  Com a redemocratização, elas puderam voltar a ser praticadas e são incentivadas em ambientes universitários.

Na Universidade Estadual do Centro- Oeste, Unicentro, onde há o Núcleo de Estudos Eslavos (NEES), o objetivo é conhecer e mapear a cultura eslava (poloneses e ucranianos) na região de Irati. A Unicentro desenvolve vários projetos com o intuito de dar mais visibilidade à língua e cultura, como intercâmbios de professores e alunos com universidades polonesas. “Alguns professores estão fazendo estudos sobre a língua polonesa falada em nossa região, que teve muitas mudanças por conta dos termos encontrados aqui no Brasil que não existiam na Polônia”, conta Nelsi Pabis.

A língua ucraniana tem sido preservada durante as celebrações religiosas, como explica o padre Deonisio Mazur.  “A missa rezada nos sábados é feita em português; nos domingos às 8h a missa é cantada em língua ucraniana. Em Itapará, Gonçalves Junior, Linha B, Água Mineral, Cerro da Ponte Alta e Pinhal Preto as missas são celebradas somente na língua ucraniana. São comunidades que os moradores conseguem manter mais viva a língua”, relata o padre.

Ele conta que na paróquia Imaculado Coração de Maria são feitas aulas da língua ucraniana para incentivar os mais jovens a aprender, apesar de as aulas estarem suspensa atualmente devido à pandemia. “Se a língua morre a cultura vai morrendo também, fazemos as aulas para os mais jovens aprenderem falar em ucraniano. Geralmente, escolhem um dia na semana à noite, conforme o tempo disponível dos alunos”, explica.

Grupos Culturais

A Braspol - Representação Central da Comunidade Brasileiro-Polonesa do Brasil- é uma instituição que desenvolve ações para resgatar e preservar a cultura polonesa. Foi criada em 1990 e tem um núcleo em Irati.

O Pinho de Baixo promove tradicional a Festa da Polenta. Por conta da pandemia não pôde ser feita em 2020 e 2021.  Em tempos normais o grupo “Chiaro di Luna” organiza as apresentações italianas para a festa e também se apresenta na região.

Em Irati, há também o grupo folclórico Ivan Kupalo, criado em 1976 e reestruturado em 1986 que apresenta danças e é uma importante fonte de preservação da cultura ucraniana.

Arquitetura

Algumas casas antigas preservam características dos imigrantes, como os lambrequins que são decorações em madeira que enfeitam os telhados, também os formatos das residências e das igrejas remetem a arquitetura europeia.

Texto: Cibele Bilovus

Fotos: Arquivo/Hoje Centro Sul; Arquivo/Assessoria PMI; Divulgação/Pasta Dei Nonni 

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